sexta-feira, 1 de julho de 2016

Reino Unido e França lembram 100 anos de batalha que matou 1 milhão e traumatizou a Europa

Em 1916, em região de Somme no norte da França, franceses e britânicos enfrentaram alemães em combates que se tornaram símbolo das atrocidades e violência da Primeira Guerra.


"Cavamos por alguns metros
E lá os deixamos para descansar
Mas o sangue à noite ainda é vermelho
Sim, mesmo à noite
E a face de um homem morto é branca"

O poema de Leslie Coulson, de 1916, é apenas mais um registro dos horrores da Batalha do Somme, uma das mais sangrentas da Primeira Guerra Mundial e, de acordo com historidores, uma das maiores chacinas da história da humanidade.
Esta sexta-feira marca o início de um combate em que, durante cinco meses, forças britânicas e francesas enfrentaram tropas alemãs ao longo do rio Somme, na França, em uma frente de apenas 24 km, mas em uma horrenda guerra de atrito que resultou em mais de 1 milhão de mortes.
Apenas no primeiro dia de enfrentamentos, pelo menos 30 mil soldados teriam morrido. A Batalha do Somme se tornou um dos símbolos do trauma provocado pela Primeira Guerra no imaginário europeu e seu impacto teve influência em aspectos não muito óbvios - o escritor J.R.R. Tolkien, por exemplo, lutou nas trincheiras do Somme e muitos acadêmicos dizem que a experiência inspirou a trilogia O Senhor dos Anéis.
E há especialistas que veem a carnificina como desnecessária - cujo resultado final, na prática, foi um avanço de apenas 9 km por território controlado pelo inimigo.
A batalha

A Ofensiva do Somme teve como objetivo reforçar as tropas francesas que lutavam na região de Verdun e enfraquecer as tropas alemãs. Ao contrário dos dois países, porém, o Reino Unido na época da Primeira Guerra não tinha um Exército forte e enviou para o front um imenso número de voluntários, que, em um primeiro momento, não conseguiam penetrar as linhas alemãs.

Apenas no primeiro dia de combates, pelo menos 19 mil soldados britânicos morreram, um número altíssimo de baixas que não convenceu o comandante Douglas Haig a diminuir a intensidade do ataque. Mas aos poucos a superioridade numérica dos aliados começou a falar mais alto - os britânicos, por exemplo trouxeram pelotões de então colônias como Austrália e África do Sul.
Em agosto, os alemães já contabilizavam mais de 250 mil mortos e feridos e ainda tinham de lidar com outros problemas. O maior poder naval britânico e francês resultou em bloqueios no Mar do Norte e no Adriático, causando severa escassez de alimentos na Alemanha.
O quadro apocalíptico fez com que o comandante das forças alemães, Erich von Falkenhayn, renunciasse. Em setembro, mesmo a resistência frenética alemã e os rigores do inverno não pareciam capazes de frear o avanço aliado. Mas foi apenas em novembro que a a última escaramuça da Batalha do Somme teve lugar, nas proximidades do rio Ancre.
Nos 141 dias de batalha, as forças aliadas ganharam apenas 9 km de território inimigo. Mas mesmo esse pequeno avanço teve sua importância: historiadores dizem que levou à maturação da tropas britânicas e à vantagem psicológica obtida sobre os alemães quando o inimigo recuou.
Tecnologia no front

A Batalha do Somme marcou a entrada no teatro militar de importantes inovações tecnológicas. Em 15 de setembro, na Batalha de Flers Courcelette (que fez parte de Somme), os britânicos usaram uma arma secreta: o tanque de guerra. 48 tanques Mark I participaram dos combates, embora apenas 21 tivessem conseguido chegar à linha de frente - 17 quebraram no caminho.

Aviões jã faziam parte do teatro de operações da Primeira Guerra desde o início, em 1914, especialmente para operações de reconhecimento. No Somme, o poder aéreo foi muito mais importante neste sentido, embora pilotos já estivessem equipados com armamento para ataques e pequenos bombardeios.
Batalhões de camaradas

O recrutamento de voluntários para o Exército britânico teve sucesso devido à estratégia de usar o espírito cívico e comunitário como principal isca: milhares de "batalhões de camaradas", recrutados localmente em vez de nacionalmente, sob o raciocínio de que homens se sentiriam mais estimulados a servir com pessoas conhecidas.

Infelizmente, isso também tornou o trauma da guerra mais intenso - com a gradual dizimação de pelotões e mais pelotões. Cidades inteiras choraram a perda de vidas. Um exemplo: o 11º Regimento de East Lancashire enviou para a frente do Somme 784 "camaradas" em 1º de julho - apenas no primeiro dia, quase 600 estavam mortos ou feridos, e rumores de que apenas sete tinham sobrevivido causaram violentos protestos nas ruas da cidade de Accrington, de onde vinham os voluntários.
Guerra nas telas

Pela primeira vez na história, uma guerra foi filmada. E 20 milhões de pessoas no Reino Unido - quase metade da população em 1916 - correu para os cinemas para assistir ao documentário A Batalha do Somme, que usou cenas reais do front.

O filme teve imenso impacto e até hoje é um dos mais vistos na história do cinema britânico - teve mais espectadores que o episódio original de Star Wars.
Pessoas conhecidas no front

Tolkien não foi a única pessoa conhecida que participou dos combates no Somme. O compositor Ralph Vaughan Williams já tinha composto The Lark Ascending (uma das peças de música erudita preferidas do público britânico até hoje) quande se alistou como soldado do corpo médico britânico e foi enviado ao front.

Do lado alemão, havia Otto Frank, nascido em Frankfurt, cuja filha Anne ficou famosa ao escrever um diário sobre os anos em que sua família, judia, viveu escondida da perseguição nazista na Holanda. Ele viria a ser o único da família a sobreviver ao Holocausto.
Também estava nas trincheiras um jovem austríaco, de 25 anos, que havia se voluntariado para a guerra. Seu nome? Adolf Hitler.
Fonte: BBC
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