sexta-feira, 1 de abril de 2011

Mudanças GeoPolíticas no Oriente Médio e o Ocidente

O governo dos EUA historicamente tem promovido uma imagem de comprometimento com a liberdade e os preceitos democráticos ao redor do globo. Mas nas últimas décadas, para ser mais preciso após o ataque contra o WTC em 11 de setembro de 2001 assistimos a abertura de uma verdadeira cruzada rumo ao Oriente Médio, arrastando para essa nova guerra seus aliados.

Relativo a esta afirmação temos várias questões a serem analisadas e pontos de vista a serem interpretados para compor uma posição fidedigna a real situação e interesses envolvidos naquela região tão instável e importante de nosso planeta.

Após os ataques terroristas de 11 de setembro, o então presidente George W. Bush assumiu posição de “cruzado” ao declarar a dita “guerra ao terror”, onde iniciou uma campanha sem precedentes na história, desrespeitando resoluções das Nações Unidas em prol dos interesses americanos de combater o terrorismo transnacional e a rede Al Qaeda de Osama Bin Laden, milionário saudita que nos anos 80 foi apoiado pelo governo americano para promover um movimento de insurgência e oposição á ocupação Soviética no Afeganistão que agora se tornaria o inimigo número 1 do Ocidente. Aonde vimos não só uma série de desrespeitos as normas e leis internacionais, mas a violação dos direitos humanos e principalmente a sua tão defendida liberdade individual.

No ano de 2005 Bush enviou a sua então representante Condoleza Rice ao Cairo como forma de reafirma o apoio da Casa Branca as reformas democráticas que cresciam na região, declarando assim uma nova postura política em relação ao Oriente Médio, onde a exaltação da estabilidade mesmo que fosse mantida sob governos totalitários e repressores das liberdades individuais que imperavam até então na região estava sendo revisada em prol do apoio aos movimentos pró-democráticos, mostrando a influência exercida pelos novos conceitos geoestratégicos e políticos. Cito como exemplo um livro que Bush constantemente citava ou recomendava como leitura: “The Case for Democracy. The Power of freedom to overcome tyranny & terror” de Natan Sharansky.

A primeira analise podemos ter a impressão que na visão Americana, a sobrevivência dos preceitos de liberdade e do “American way of life” estavam ligados diretamente e dependente do sucesso da democracia e “liberdade” em outros países, sob uma teoria que a democracia tem como característica em seu regime político a orientação pacífica na resolução de conflitos e interesses tanto no âmbito interno quanto exterior nos Estados que adotam o regime democrático, teoricamente com isso tornando menores os focos de tensão que culminam em guerras e conflitos armados entre estados soberanos ou mesmo conflitos internos como guerras civis e movimentos separatistas.

Já na Europa temos a vertente dos conceitos de Brzezinski, que considera a postura America de se por como a polícia do mundo e os paladinos defensores da liberdade e democracia muito perigosa, principalmente pela sua movimentação extremamente hostil e até certo ponto xenófoba, onde o árabe era comumente rotulado como radical terrorista até que se prove o contrário, somando a tudo isso à ilegitimidade de campanhas como a promovida no Iraque, onde se descumpriu as resoluções na ONU.

Brzezinski defendia uma postura alternativa com foco na promoção das políticas pró-direitos humanos.

Hoje alguns anos após a mudança americana em relação ao apoio as reformas democráticas no Oriente Médio, presenciamos uma verdadeira onda que varre os governos daquela região, ressaltando que a principal mola propulsora deste movimento que atinge não só o Oriente Médio, mas também o norte da África, que conveniente costumo me referir como um anexo á região devido aos fortes laços culturais e religiosos que estão profundamente arraigados a esta região da África, tornando assim em minha concepção uma extensão do Oriente Médio, seja pela aproximação de valores sociais ou a proximidade estratégica, possui como pano de fundo não uma ideologia política ou religiosa como muitos tem tentado justificar os fatos. Este locomotor dos fatos e o principal ator são os movimentos de classe, principalmente apoiados e promovidos pela população que compõe a base da sociedade destes Estados, onde há pouco mais de duas décadas assiste a degradação das suas condições de sobrevivência em relação às grandes riquezas que seus Estados adquiriram neste período com a exploração do petróleo.

Como publicado aqui no GeoPolítica Brasil recentemente em uma analise que fiz a respeito dos fatos e traçando uma linha entre estes movimentos e a guerra civil ela qual passa a Líbia, temos como motivadores desta “Revolução Árabe”, a situação econômica e social no Oriente Médio, temos o raios-X de governos que tem sido marcados pela corrupção e ingerência aos interesses e anseios de suas nações, o que por si só já alimenta o descontentamento interno e dá origem a oposicionistas e movimentos de classe. Mas temos mais ingredientes neste caldeirão fervilhante que se tornou o Oriente Médio. A crise econômica, o alto índice de desemprego, os baixos salários, a corrupção e a falta de liberdade política, o desgaste dos regimes totalitários e as condições difíceis de sobrevivência nestes países. Outro ponto que podemos ressaltar é que as nações produtoras de petróleo têm obtido um grande lucro com a exploração deste importante recurso, mas o mesmo não é sentido por sua população que carece e muito de medidas do Estado para suprir suas necessidades básicas. Notem o fato de que mesmo sendo países ricos, há um imenso abismo social. Uma curiosidade, na indústria petrolífera instalada em tais nações mais de 90% da mão de obra empregada são de estrangeiros.

Algo que podemos notar em relação à postura dos EUA no inicio da década passada em sua cruzada pela liberdade e democracia rumo ao Oriente Médio e os dias atuais, é que diferente do ocorrido no Iraque e Afeganistão, onde o movimento democrático foi inserido pela força da ocupação estrangeira, hoje na Tunísia, Egito e demais países que passam por esse processo de mudanças, esta iniciativa foi interna, partiu de dentro e não imposto por um ator externo. O que nos mostra a confirmação de que um regime não pode ser imposto à força por atores externos ao estado. Com isso temos um bom “laboratório” para analisarmos as questões políticas nesta região do planeta. Onde temos uma clara definição sobre a postura de intervenção nos assuntos internos dos países não só daquela região, mas como um todo, classificando esta medida como um grande erro.

O processo regimentar deve ser definido pelo povo e não imposto a força a um povo por governos alheios ao seu meio. Cabendo aos demais estados e governos a se portarem com expectadores, se limitando ao apoio aos processos apenas, mesmo não sabendo qual será o seu resultado final.

Cria-se, no entanto grandes questões difíceis de solucionar: Como fazer que os acessos a liberdades e os direitos democráticos tenham sucesso? Ou como garantir a estabilidade da região sem uma intervenção externa na política destes estados?

Como em todo processo, as mudanças não podem definir claramente um futuro de imediato, há vários caminhos que podem ser percorridos e escolhidos, levando assim ao que podemos convencionar como “sucesso” algo que não podemos ter pré-definido.
Toda mudança enfrenta várias influências e esta suscetível ao sucesso ou fracasso, isso vai depender do ponto de vista adotado e ao resultado final do processo como citei, mas no caso do Oriente Médio, temos ali vários ingredientes que tornam o estudo ainda mais complexo. Só para termos uma pequena noção, lidamos na região com a influência religiosa, embora em boa parte destes estados esta seja limitada, temos a participação das divisões sociais de acordo com sua linha religiosa, assim temos movimentos que competem entre si dentro da própria população, elencamos aqui os Xiitas x Sunitas, há os interesses externos e os interesses da elite dessas nações e principalmente o ator econômico comum em todas as relações geopolíticas e estratégicas mundiais.

O ideal para a região seria uma transição rápida e ordeira como temos acompanhado, por exemplo, no Egito. Há um governo transitório e a organização em breve de eleições populares para eleger um novo governo de acordo com os preceitos da democracia. Mas mesmo havendo uma transição política rápida, ainda teremos outro problema que manterá a tensão dentro dos estados e poderá resultar em futura instabilidade interna e desordem, a economia.

A crise econômica regional que se abateu e influenciou nas mudanças que assistimos, não dá sinais de que vá mudar á curto ou médio prazo, não oferecendo uma resposta imediata aos anseios da população que enfrenta o desemprego e dificuldades de cunho social. Sendo a tendência atual o agravamento desta crise econômica, principalmente pelo próprio movimento popular, devi do a sua mobilização pelas mudanças gerou um enorme prejuízo á sua economia, atingindo desde o comércio local ao turismo.

Com relação mais uma vez aos EUA e seus aliados europeus, o significado do “sucesso” para estes será manter uma zona de influência e um relativo controle sobre a política no Oriente Médio, em especial nos Estados produtores de petróleo, mantendo aliados estratégicos como o Bahrein, Arábia Saudita, Iêmen dentre alguns que cito.

Para o Ocidente a provável perda de parceiros estratégicos, como no caso de Hosni Mubarak no Egito, põe em dúvida a estabilidade relativa que se possuía na região, pois se perde um importante aliado nas fronteiras de Israel, principalmente devido à histórica contenda entre árabes e israelenses. Não sabemos ainda como será a transição no Egito e quem assumirá as rédeas do país, tornando nebuloso e imprevisível o futuro da região.


Por Angelo D. Nicolaci - Editor do GeoPolítica Brasil e estudante de Relações Internacionais pela Universidade Cândido Mendes

GeoPolítica Brasil
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