quinta-feira, 1 de julho de 2010

Grã-Bretanha inclui Brasil em novas prioridades da política externa


O ministro das Relações Exteriores da Grã-Bretanha, William Hague, anunciou nesta quinta-feira as novas prioridades da política externa britânica e listou o Brasil como um dos países emergentes com os quais o novo governo pretende reforçar seus laços.

Segundo Hague, a Grã-Bretanha precisa abandonar sua política externa tradicional para reconhecer novas oportunidades e tirar vantagens de suas ligações com diferentes partes do mundo.

O ministro, que tomou posse há menos de dois meses, com a chegada ao poder da coalizão liderada pelo primeiro-ministro David Cameron, do Partido Conservador, afirmou ainda que seu país precisa aumentar “sua influência e seu alcance global”.

“Posto de maneira simples, o mundo mudou, e se não mudarmos com ele, o papel da Grã-Bretanha vai declinar com tudo o que isso significa para nossa influência sobre os temas mundiais, nossa segurança nacional e nossa economia”, afirmou.

Apesar da posição tradicionalmente cética dos conservadores britânicos em relação à integração europeia, Hague disse também que a Grã-Bretanha buscará aumentar a sua influência sobre a União Europeia, questão supostamente negligenciada nos 13 anos de governo do Partido Trabalhista, segundo ele.

O ministro afirmou ainda que a mudança de curso não significa o abandono da chamada “relação especial” da Grã-Bretanha com os Estados Unidos, países ligados, segundo ele, por história, valores e interesses comuns, além de “suas economias fortemente interligadas e hábitos fortes de trabalhar juntos em todos os níveis”.

Razões econômicas

Hague citou que razões econômicas seriam um dos pontos que pressionam por uma mudança no foco da política externa do país.

“O poder econômico e as oportunidades econômicas estão se movendo para países do Leste e do Sul; para as potências emergentes Brasil, Índia, China e Ásia, e para economias crescentemente significativas como a Turquia e a Indonésia”, disse.

Em uma entrevista à BBC antes de seu discurso na sede do Ministério das Relações Exteriores, em Londres, Hague já havia dito que “a verdadeira ação econômica no mundo está acontecendo no Brasil, na Índia, na China e nos Estados do Golfo (Pérsico), e esses são os lugares com os quais precisamos nos conectar de maneira mais forte do que jamais tentamos”.

Em seu discurso, o ministro citou as previsões de que até 2050 as economias emergentes serão 50% maiores do que as do G7 (grupo tradicional dos sete países mais industrializados do mundo, incluindo a Grã-Bretanha), e observou que hoje seu país exporta mais para a Irlanda do que para Índia, China e Rússia juntos.

Hague observou ainda que a Grã-Bretanha apoia o anseio de alguns países emergentes, entre eles o Brasil, de se beneficiarem de uma eventual expansão do Conselho de Segurança da ONU, afirmando que o “círculo de tomada de decisões internacionais está se tornando mais amplo e mais multilateral”.

Segundo ele, porém, isso representa um novo desafio à diplomacia britânica, “com um número maior de países que precisamos entender e procurar influenciar por meio de nossos embaixadores e de nossa rede de embaixadas”.

“A visão das potências emergentes é crítica para nossa habilidade para lidar com a reforma econômica global, proliferação nuclear, mudanças climáticas e segurança energética, mas elas não concordam sempre com nossa posição em relação a esses problemas quando eles aparecem na ONU e em outros lugares, tornando ainda mais necessário que nossa diplomacia seja energética e robusta”, disse.

Pouco efeito prático

Especialistas consultados pela BBC Brasil consideram que as mudanças na política externa anunciadas pelo novo governo britânico poderão ter pouco efeito prático.

Chris Brown, professor da London School of Economics e especialista em política externa britânica, classificou como “banais” as alterações propostas.

"As boas relações com a Índia e o Paquistão têm sido parte da política de todos os governos britânicos por décadas, a relação com os Estados Unidos continua enfatizada, a política sobre o Irã mantém a posição dos trabalhistas (e continua a ir contra a posição brasileira), etc.”, disse ele em uma entrevista por e-mail.

Para Victor Bulmer-Thomas, ex-diretor do Instituto Real para Assuntos Internacionais e especialista em América Latina, a Grã-Bretanha pode não ter muito a oferecer aos países emergentes como moeda de troca para uma relação mais próxima.

Segundo ele, o país não teria, por exemplo, como oferecer concessões comerciais como abertura de mercados para produtos desses países, já que qualquer negociação desse tipo teria de ser feita em bloco, com a União Europeia.

O mesmo aconteceria no setor de segurança, no qual há limitações impostas pela Otan (aliança militar ocidental, do qual a Grã-Bretanha faz parte).

Para Bulmer-Thomas, mesmo para um fortalecimento das relações no campo político há entraves, como por exemplo o apoio dos países latino-americanos à reivindicação argentina de soberania sobre as ilhas Malvinas (chamadas Falklands pelos britânicos).

“O Brasil não vai passar a apoiar a soberania britânica sobre as Falklands simplesmente por conta dessa aproximação”, afirma.

Ainda assim, Bulmer-Thomas considera que “é bom ouvir novas ideias” sobre política externa, e vê o anúncio desta quinta-feira como “um reconhecimento do aumento da importância desses países (emergentes) e de que a Grã-Bretanha pode tirar vantagem de seu crescimento econômico”.

Fonte: BBC Brasil
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