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domingo, 14 de junho de 2020

Como funcionam os processos de compras de equipamentos militares?

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Um comentário muito comum quando há um processo de compra de equipamentos militares é "por que escolheram o sistema x, se o sistema y é melhor em abc?"

Essa pergunta realmente não é fácil de responder. Neste artigo, vamos explicar, de maneira simplificada, alguns aspectos de ordem técnica dos processos de compras de equipamentos militares. Alertamos que cada etapa envolve a geração de várias centenas de documentos técnicos e pode levar meses ou anos.




Vamos deixar de fora aspectos eminentemente políticos, pois muitas vezes são até contrários aos quesitos militares. Tais aspectos, muitas vezes, acabam forçando as FFAA (Forças Armadas) a comprarem equipamentos que não são o que prefeririam.

Os termos são os utilizados principalmente nos EUA, mas os detalhes gerais são mais ou menos os mesmos em outros países. Digamos, por exemplo, que a USAF precisa resolver uma determinada necessidade, e um estudo inicial conclua que não há no seu inventário que atenda a esta necessidade.


MSA (ANÁLISE DE SOLUÇÕES MATERIAIS)

O primeiro ciclo é a MSA (análise de soluções materiais), em que as 'alternativas' - sistemas já em uso, preferencialmente no próprio país ou 'de prateleira' (já disponíveis no mercado, ou seja, plenamente desenvolvidos). Uma das principais fases da MSA é a AOA (análise de alternativas)

Caso o processo de MSA encontre uma solução 'boa o bastante', ou seja, cujo custo-benefício seja considerado adequado, o novo sistema é adquirido e o processo é concluído.

Exemplo prático: quando a USAF estava desenvolvendo uma variante armada do 'drone' (ARP / aeronave remotamente pilotada / VANT / UAV / RPA) General Atomics RQ-1 Predator, concluiu que não dispunha de PGM (munições guiadas de precisão, 'armas inteligentes') pequenas e leves o bastante para a missão.

Uma AOA encontrou a solução no míssil Lockheed Martin AGM-114 Hellfire, que já estava em serviço no US Army (Exército dos EUA) e no USMC (Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA).

Mísseis Helfire (verdes) sob as asas de um drone MQ-1 Predator

Caso o ciclo MSA não encontre soluções satisfatórias, inicia-se a etapa MDD (decisão de desenvolvimento de material), em que se decide pela aquisição ou desenvolvimento de um sistema inexistente nas FFAA (Forças Armadas). Caso a MDD realmente confirme a necessidade de desenvolvimento de material, parte-se para o próximo ciclo.


TMRR (processo de redução de riscos tecnológicos)

O próximo ciclo é um conjunto de estudos técnicos detalhados, o TMRR (maturação e redução de riscos tecnológicos). Um de seus estágios principais é o RFI (estudo de requisição de informações), em que se pede informações a instituições e indústrias de Defesa. Tais informações geralmente incluem o 'estado da arte' atual e estudos avançados das tecnologias disponíveis ou em desenvolvimento, e geralmente serve como ponto de partida para o próximo estágio, o RFP (pedido de propostas).

O RFP é o que a mídia não especializada geralmente se chama de 'competição'. No RFP, pedidos formais, que incluem os KPP (parâmetros essenciais de performance), critérios específicos de performance - requisitos de alcance, velocidade, carga de armas, etc - são definidos com valores objective (desejável) e treshold (mínimo aceitável).

Cópias do RFP são enviadas para indústrias da Defesa, as empresas interessadas devem emitir propostas preliminares, com cálculos técnicos e contábeis muito detalhados, dentro do prazo detalhado.

No caso de alguns países, como os EUA, empresas estrangeiras precisam formalizar parcerias com empresas nacionais. Objetivos de ToT (transferência de tecnologia), quando existentes, também são especificadas nessa etapa.

Após uma análise das propostas, é feita uma shortlist, uma lista com as propostas consideradas mais adequadas, e os proponentes da shortlist devem então fazer propostas mais detalhadas, que podem incluir a construção de protótipos, e que geralmente incluem demonstrações do uso dos sistemas, com flyoffs, voos dos sistemas para comprovar que atendem às especificações do RFP.

Dependendo da competição, os concorrentes podem ou não ser autorizados a modificar suas propostas, mas geralmente chega o momento da BAFO (proposta melhor e final), que não pode ser modificada.

Finalmente, as BAFO dos concorrentes são analisadas, e aquela que atende melhor aos KPP é escolhida.

Lembramos que, com grande frequência, critérios 'não técnicos' são considerados, como apoiar um concorrente cuja situação financeira esteja difícil, ou incluir outros fabricantes para atender a critérios políticos, mas tais critérios não serão analisados neste artigo.

Um exemplo recente foi o Programa T-X, em que várias empresas ofereceram treinadores para a USAF, com o objetivo de substituir o Northrop T-38 Talon, 'parente' do nosso querido Northrop F-5. O vencedor foi o projeto da Saab com a Boeing, que sequer existia quando o RFP foi feito. Foi batizado T-7 Red Hawk, uma homenagem aos Tuskegee Airmen, o famoso 'Esquadrão Caudas Vermelhas' da Segunda Guerra Mundial

O Saab Boeing T-7 Red Hawk (esquerda) substituirá o Northrop T-38 Talon (direita) na USAF


EMD (DESENVOLVIMENTO DE ENGENHARIA E MANUFATURA)

Que o vencedor do ciclo TMRR é escolhido, o próximo ciclo é o EMD (desenvolvimento de engenharia e manufatura), em que o sistema da BAFO passa por análises bem mais detalhadas, que podem incluir até mesmo usos limitados em combate.

Via de regra, o EMD acaba por revelar problemas não detectados durante os testes iniciais, o que leva a alterações no design. Este processo pode se repetir várias vezes, até que se chegue a um design considerado satisfatório.

Esse design passa por um processo detalhado de revisão, a CDR (revisão crítica do design), em que o design é 'congelado', ou seja, não deve passar por alterações significativas.

O Boeing KC-46 passou pela CDR em 2013: USAF conclui revisão de projeto do KC-46 Tanker

Há situações em que é necessário mudar o design após a CDR, mas isso geralmente causa atrasos significativos no processo.

Uma vez que o ciclo EMD é concluído, parte-se para o próximo ciclo.


PD (PRODUÇÃO & DESENVOLVIMENTO)

O objetivo principal do ciclo EMD é preparar o sistema para a fase PD (produção e desenvolvimento), em que o sistema entra na fase LRIP (produção inicial em baixa escala). Neste ciclo, os sistemas já são entregues para uso pela USAF.

Durante a LRIP, a produção da aeronave ocorre num ritmo relativamente baixo, e os testes operacionais se tornam ainda mais detalhados. Testes em combate são geralmente realizados nesta etapa.

Os testes realizados nesta fase tornam-se ainda mais aprofundados quando a aeronave atinge a etapa IOC (condição operacional inicial), em que há aeronaves suficientes para testes operacionais em pequena escala.

Caso os testes ocorram bem na etapa LRIP / IOC, toma-se a decisão de elevar o sistema a FRP (produção em larga escala), em que  taxa de produção segue o ritmo definitivo estipulado nos ciclos anteriores.

O nosso Embraer KC-390 Millennium encontra-se nesta fase do ciclo.

Embraer KC-390 Millennium


FOC (CAPACIDADE OPERACIONAL PLENA)

O Lockheed Martin F-22 Raptor atingiu a FOC em dezembro de 2007












Uma aeronave atinge FOC (capacidade operacional plena) quando a FRP consegue produzir aeronaves suficientes para equipar um determinado número de esquadrões.

A partir deste momento, o sistema é declarado operacional, e segue as atividades normais da USAF.



CONCLUSÃO

Essas etapas podem demorar bastante tempo - por exemplo, o Su-57 teve a MDD em 1979, ainda na época da URSS, mas eventos 'cataclísmicos' como a própria dissolução da URSS atrasaram bastante o processo.

O Su-57 ainda não atingiu a etapa LRIP. Pelo planejamento russo, a LRIP deveria começar ainda em 2020, mas com a pandemia de coronavírus é provável que haja novos atrasos.

Apontamos esse fato não como demérito à Rússia, mas para ilustrar que não é um processo tão simples como ir numa loja e comprar um smartphone - é um processo bastante demorado, caro, complexo e que envolve vários aspectos de ordem técnica e não-técnica, o que pode fazer com que demorem vários anos.

Houve diversos projetos cancelados em cada uma das etapas indicadas acima, um lembrete de que nada é garantido, mesmo quando o sistema já atingiu etapas como FRP e FOC - o próprio F-22 teve sua produção cortada de 750 para 187.


Por Renato Marçal


REFERÊNCIAS:

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sexta-feira, 5 de junho de 2020

CVMARJ - 18 anos preservando a memória militar brasileira: Entrevista exclusiva

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No próximo dia 6 de junho, o Clube de Veículos Militares Antigos do Rio de Janeiro (CVMARJ) completa 18 anos de muitas histórias e desafios na sua missão de propagar e preservar uma importante faceta da história militar brasileira. 

O clube surgiu em 6 de junho de 2002, com sua ATA de Fundação sendo assinada no capot de um Jeep de 1942, a data Magna do CVMARJ coincide com a comemoração do "Dia D", dia da invasão da Normandia pelas Tropas Aliadas na II GM. Desde então, o dia 6 de junho marca o inicio de uma trajetória de muito trabalho e desafios para preservar a história da motomecanização das nossas Forças Armadas. Tendo como objetivo resgatar o valor histórico dos veículos militares antigos, focando na rigorosa manutenção da originalidade dos veículos, tendo se tornando uma referência nacional quando se trata de restauração e preservação de veículos militares antigos.

Os desafios são enormes, e principalmente pelo fato de só há pouco tempo as autoridades passaram a dar alguma atenção a esta importante faceta de nossa história militar, embora ainda estejamos muito distantes do ideal, os esforços e a união de civis e militares que fazem parte de clubes como o CVMARJ, tem tomado para si a responsabilidade de manter viva nossa história, não apenas com o acervo de seus sócios, os quais possuem verdadeiras relíquias, e que na sua grande maioria ainda em condições de cruzar nossas estradas e trazer a áurea dos tempos que estes veículos equiparam diversas unidades de nossas Forças Armadas, em especial as viaturas baixadas do Exército Brasileiro tem grande destaque nas coleções, como o consagrado JEEP em suas diversas variantes, mas também resgatando peças históricas no acervo de nossas Forças Armadas e auxiliando na recuperação das mesmas, realizando um minucioso trabalho de pesquisa e restauração de diversos veículos e acessórios do acervo histórico militar brasileiro. 
Nicolaci com nosso entrevistado, Sergio Capella - Presidente do CVMARJ
Ás vésperas de atingir a maior idade, procuramos nosso amigo Sérgio Capella, um ativo defensor da preservação histórica de nossa motomecanização, o qual é membro do CVMARJ desde de 2005, é integrante da diretoria, ocupando a presidência do clube, e é uma das figuras mais emblemáticas quando o assunto são veículos militares antigos, e vamos apresentar a você um pouco melhor a história e a missão desse que é um dos mais famosos e prestigiados clubes de veículos militares antigos do Brasil, o qual teve como um dos fundadores e primeiro presidente, o músico João Alberto Barone, que além de músico já conduziu importantes trabalhos de pesquisa histórica, resultando em livros e documentários sobre a atuação brasileira na IIGM.


Nicolaci (GBN Defense): Como surgiu a ideia de criar o CVMARJ? Qual foi a principal inspiração que levou ao ponta pé inicial?

Capella: Surgiu de iniciativa de um grupo de amigos, os quais possuíam viaturas militares antigas, aqui na cidade do Rio de Janeiro. A força motriz foi a preservação histórica e reunir os apaixonados por estes veículos, possibilitando uma troca de experiências. Os fundadores do CVMARJ usaram a MVPA – Military Vehicles Preservation Association, entidade americana de preservação de viaturas militares antigas, como referência e ponto de partida.

Nicolaci (GBN Defense): Quem foram os fundadores do Clube, e como se conheceram?

Capella: Foram seis amigos que lançaram a pedra angular do CVMARJ, o João Barone, José Delatorre,  Roberto Maués, Rubens Riet, Clélio Galvão e o Humberto Cordeiro, eles fundaram o CVMARJ e constituíram a primeira diretoria, não esquecendo o Geraldo da oficina Mônaco, que ficava em Botafogo, e outros entusiastas. 

Eles se conheceram nas ruas e bares da cidade do Rio de Janeiro, pois quando identificavam alguém, com outra viatura, logo surgia uma conversa e iniciavam uma amizade, pois coadunavam dos mesmos gostos. E a partir daí, resolveram marcar encontros todas as quartas feiras, na orla de Ipanema e Leblon, assim como na Lagoa Rodrigo de Freitas.

Nicolaci (GBN Defense): Qual foi inicialmente o principal foco de vocês ao criar o Clube que agora completa 18 anos?

Capella: O principal foco, inicialmente foi criar uma amizade maior entre os entusiastas da preservação das viaturas militares, estimulando a troca de informações e conhecimentos, promovendo passeios e encontros sociais. 

Nicolaci: Uma instituição como o CVMARJ demanda uma série de requisitos, quais foram os principais desafios e obstáculos enfrentados para criação do Clube?

Capella: Com o crescimento das atividades e aparecimento de outros proprietários de viaturas e entusiastas da causa, formalizar oficialmente o Clube, assinando a ATA de Fundação, o que aconteceu no dia 6 de junho de 2002 sobre o capot de um Jeep de 1942, e isso demandou a criação de uma entidade civil sem fins lucrativos, e lógico, tudo que envolve a criação de algo no Brasil, como um clube, traz consigo burocracia e uma série de normas e exigências, mas nós conseguimos superar todos e estamos completando 18 anos de existência, com muita atividade e fôlego para muito trabalho e novos desafios.

Nicolaci: Quando se fala em preservação da história no Brasil, tudo é muito complicado, quando se trata de história militar então..., sabemos que boa parte de nossa população e mesmo de nosso governo, desconhecem a nossa história e sua importância. Diante disso, como o CVMARJ tem avançado e conquistado tantos adeptos e admiradores no meio civil e militar?

Capella: Com o passar dos anos, o Clube começou a participar de eventos e solenidades cívicas e militares, ganhando confiança e respeito por onde se apresentava. Vivemos em um pais que não preserva sua história, nem seus verdadeiros heróis, então temos que fazer um trabalho de formiguinha, levando a nossa bandeira. 

Com o passar do tempo ganhamos espaço quando mostramos a importância da Motomecanização do Exército Brasileiro (EB), assim como a Participação do Brasil na II Guerra Mundial. Ao longo dos anos vimos que as Forças Armadas, iniciaram atividades de resgate dessa história, com nossa participação  nessa terrível guerra, ligando as Unidades Febianas, mostrando suas participações nos conflitos. A Marinha do Brasil e a Força Aérea Brasileira, também fizeram isso, sendo assim, hoje temos estreita relação com essas Forças e com Associações de Veteranos. 

Somos idealizadores do projeto do Museu Vivo de Viaturas Militares Antigas, levado para a ABPVM – Associação Brasileira de Preservadores de Veículos Antigos, da qual somos um dos fundadores, e que assinou com o Exército esse protocolo, que tinha como finalidade, estreitar relações entre as duas entidades, e trabalhar para identificar, recuperar, apresentar viaturas históricas do Exército Brasileiro, fazer apresentações conjuntas das nossas viaturas com as do Exército, trocar conhecimentos técnicos e informações, entre outros. Esse projeto encontra-se aguardando atualização, pois é de importância estratégica para a preservação dessas viaturas do EB. 

Hoje várias Unidades tem viaturas nos seus acervos históricos, que contam com apoio do CVMARJ. Fazemos atividades, cívicas, militares, sociais e humanitárias, conquistando com isso admiração e respeito, pela nossa postura e conduta, assim como divulgação nas mídias sociais. Hoje temos 80 Sócios ativos no Clube, tanto no Brasil, como no Exterior. Participamos de encenações como a da Rendição de Fornovo, trajando uniformes da II Guerra Mundial, assim como Viaturas da época.

Nicolaci: Quais os principais desafios para se obter, restaurar e manter um acervo de veículos tão diversificado, e que além de tudo desfilam por vários cantos do Rio de Janeiro e muitas vezes fora até do Brasil, como foi o caso da Coluna da Vitória na Itália há alguns anos?

Capella: Temos um universo de viaturas no Clube de mais de 180 veículos, espalhados por todo o Brasil, temos vários grupos de debates e troca de informações, com auxilio da internet, manuais antigos e o trabalho do Diretor Técnico e fundador do Clube, José Delatorre, o qual a maioria das nossas viaturas, já passaram por suas mãos. A Coluna da Vitória de 2015, infelizmente, só teve viaturas europeias, pois as 30 viaturas que preparamos para levar de navio para Itália, não puderam embarcar, por problemas alfandegários, quando já se encontravam no porto de Santos/SP.


Nicolaci: Como é a relação do Clube com as instituições militares? Há apoio e cooperação por parte de nossas Forças Armadas? E como é a atuação do Clube na preservação de peças históricas dos acervos em posse das Unidades?

Capella: Nossa relação é muito boa, já ajudamos a restaurar o JIPANF, do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), uma Dodge Comando do MUSAL, viaturas de Unidades do Exército, como do Regimento Sampaio, do ResI, do 11º GAC, do 21º GAC, do CPOR/RJ, do Esqd Tenente Amaro, 15º R C Mec, assim como informações, manuais e peças para outras Unidades, com objetivo de recuperar, identificar ou melhorar suas apresentações, pois estando inertes, paradas, representam a história da Força. Temos ótima relação com os Grandes Comandos, assim como com a DPHCEX e DECEX.


Nicolaci: Com relação ao Projeto Museu Vivo? Qual seu objetivo e como está sendo o processo de criação deste interessante e ousado projeto?

Assinatura do Projeto Museu Vivo com Exército Brasileiro em 2007
Capella: O projeto do MUSEU VIVO, aguarda sua reativação, com melhorias de fluxos e processos, que visam aumentar a sua eficiência. Como já disse é um projeto de interesse estratégico para a preservação de viaturas históricas do Exército, evitando que tenhamos perda de exemplares, já utilizados pela Força, e que não encontramos mais no Brasil, havendo alguns em mãos de particulares...

Nicolaci: Com relação a identificação de viaturas e peças históricas raras do acervo nacional, como tem sido o desafio de conscientizar autoridades e mesmo cidadãos de sua importância?

Capella: Em 2020, comemoramos os 75 anos da Vitória dos Aliados na II Guerra Mundial, infelizmente essa pandemia, somada por interesses políticos, vem prejudicando as grandes comemorações que estavam previstas em todo o mundo. Como disse esse tema vem ganhando ao longo dos últimos anos, uma grande importância, com maior reverência aos poucos combatentes que participaram do conflito, Unidades utilizando uniformes da II GM, toques para Ex Combatentes, solenidades em Associações de Veteranos, exposições fora de Unidades Militares e etc. 

Sempre que identificamos uma viatura histórica em unidades militares que demandem uma atenção especial e mesmo um trabalho de restauração, entramos em contato com os comandos e informamos sobre a importância dessa viatura para preservação de nossa história e nos disponibilizamos em ajudar na recuperação da mesma. 

Nicolaci: Capella, gostaria que nos contasse um pouco sobre o CVMARJ:

Capella: Sempre lembramos dos fundadores do Clube, que com certeza, nunca imaginariam que o CVMARJ chegasse no atual patamar em que se encontra. Nosso primeiro, e eterno Presidente de Honra, João Barone, é uma referência nacional e mundial sobre os temas que norteiam o modus operandi do Clube, sempre divulgando nosso Clube, sendo um amigo que mesmo afastado por motivos profissionais, sempre nos apoia com sua larga experiência e conhecimentos. 

Outros fundadores continuam conosco, e são tratados com a merecida reverência e respeito. Hoje temos uma marca forte, conhecida no Brasil e no exterior, em breve teremos eleição da nova diretoria e conselho, e com certeza buscaremos melhorias de benefícios para nossos associados, assim como maior divulgação na mídia em geral. Temos atividade mensais, com diversas opções para sócios e familiares, buscando sempre unir os membros do Clube, em eventos diversos. 
Somos uma entidade civil, sem fins lucrativos, que hoje tem uma gestão moderna e objetiva, dentro da finalidade que hoje vivenciamos, com uma evolução constante, junto à sociedade, e as Forças Armadas, tendo muito orgulho de pertencer à um Grupo, que hoje é uma referência nacional.

Nicolaci: Dentre tantos momentos vividos nestes 18 anos de história, qual você consideraria os mais importantes e emblemáticos?

Capella: Vou informar alguns:
  • Assinatura do Projeto do Museu Vivo.
  • Criação da ABPVM.
  • Realização do Encontro Nacional de Veículos Militares Antigos no Forte de Copacabana.
  • Ações Humanitárias, nas tragédias em Itaipava, e no Morro do Bumba, em Niterói.
  • Coluna da Vitória no Brasil  e no Rio de Janeiro.
  • Participação das Comemorações dos 70 anos da Vitória da FEB, na Itália.


Nicolaci:  Hoje como é a composição do CVMARJ? Quantos sócios e viaturas compõe essa grande família?

Capella: Hoje temos a seguinte composição: Presidente, Vice Presidente, Diretor Secretário, Diretor Financeiro, Diretor de Relações Públicas, Diretor Técnico e o Conselho Fiscal com 5 membros.

Temos 80 Sócios, sendo que todos com anuidade de 2019, em dia e mais de 25% com a anuidade de 2020 quitada. Como disse temos mais de 180 veículos militares antigos em diversos estágios de funcionamento, distribuídas em várias cidades do Brasil.


Nicolaci: Sabemos que por todo Brasil temos vários clubes de preservação de veículos militares antigos, qual a principal característica que diferencia o CVMARJ dos demais? E como é a relação entre os diversos clubes? Pois sabemos que há uma associação que congrega esses clubes.

Capella: Além da ABPVM, que congrega 14 Clubes em vária regiões do Brasil, ainda temos Clubes independentes e outros em processo de oficialização, já que praticam os nosso conceitos, mas não estão devidamente organizado. Mantemos contato por telefone, aplicativos, redes sociais e e-mails, assim trocamos informações e conhecimentos, que nos ajudam a evoluir sempre. 

Importante ressaltar  que somos um Clube de Veículos Militares Antigos, não um Clube de carros antigos, nem um Jeep Clube, preservamos a originalidade das nossas viaturas, assim como zelamos pela postura dos nossos Associados em todos os momentos, pois nossas viaturas representam o Exército Brasileiro, não participamos de eventos políticos ou religiosos, pois somos o único Clube do Brasil, que tem autorização para utilizar as identificações antigas das viaturas do Exército Brasileiro, utilizadas até os anos 70.

Nicolaci: Diante dos desafios com a pandemia do COVID-19, quarentena e diversas medidas que tem sido executadas pelos governos estaduais e Federal, como o CVMARJ e seus associados tem enfrentado esse momento? Há alguma ação sendo realizada pelo clube?

Capella: A pandemia, realmente está sendo terrível, sob todos os aspectos, e com certeza está nos causando várias dificuldades, mas com certeza, em breve voltaremos as atividades normais, com certeza o mundo será outro, coisas boas e ruins irão ocorrer, temos que esperar e colocar tudo nas mãos de Deus. Temos trabalhado via e-mails, telefone, aplicativos e redes sociais, mantendo a chapa quente, como diz o João Barone.  Recomendamos aos nossos associados, que mantenham suas viaturas prontas, pois em breve teremos muitas atividades, ainda em 2020

Nicolaci: A Pandemia levou ao cancelamento de todos eventos previstos neste primeiro semestre, como estão os planos do CVMARJ para as atividades públicas após a pandemia?

Capella: Temos previsão do Encontro Nacional em Campinas, Coluna da Vitória em São Paulo, e no Rio de Janeiro, Desfile de 7 de Setembro, Acampamento de Veteranos, Viagens à AMAN, Esqd Tenente Amaro, Exposição em Friburgo, churrasco de confraternização, eleições da nova diretoria e conselho, entre outros eventos.

Nicolaci
: Capella, são 18 anos de atividade, como resumiria o saldo da missão do CVMARJ até aqui, e quais as perspectivas futuras?

Capella: Muito positivo, os fundadores do Clube e Sócios mais antigos, nunca poderiam imaginar que hoje, 18 anos depois daquela assinatura no capot de um Jeep da II Guerra Mundial, na Lagoa Rodrigo de Freitas, iria se tornar uma referência no seu segmento, com toda a humildade que podemos ter, criamos o que chamamos de “FAMÍLIA CVMARJ”, e temos um brado que diz: “VAMOS EM FRENTE”.

Nicolaci: Para fechar, gostaria de agradecer mais uma vez pelo apoio que sempre temos dos nossos amigos do CVMARJ em nossa missão, e quero em nome de todo público que acompanha o GBN Defense, parabenizar os membros do CVMARJ, e dizer que é uma imensa honra ser amigo destes verdadeiros guardiões da história da motomecanização de nossas Forças Armadas, e nada mais justo que abrir aqui espaço para que você deixe uma palavra ao nossos leitores. 

Capella: Eu que agradeço em nome do CVMARJ, principalmente pelo carinho que recebemos de parceiros estratégicos como seu site, nos permitindo contar quem somos e o que fazemos para a sociedade em geral.



Fotos: Acervo CVMARJ /Acervo Rafael Sayão / Acervo Nicolaci

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segunda-feira, 1 de junho de 2020

1º de Junho - Dia do Guerreiro de Selva, uma homenagem ao Cel. "Teixeirão" e a todos nossos guerreiros.

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Hoje o Exército Brasileiro comemora o "Dia do Guerreiro de Selva", data fixada em 1º de junho como uma justa homenagem ao nascimento do Coronel de Artilharia Jorge Teixeira de Oliveira, mais conhecido como “Teixeirão” (1921-1987). Este bravo Guerreiro, nascido no sul do Brasil, era apaixonado pela Amazônia, e escreveu com grande louvor uma importante página da nossa história militar brasileira, tendo sido o primeiro comandante do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), o qual esteve sob suas ordens entre 1964 a 1971. 

Coronel de Artilharia Jorge Teixeira de Oliveira

O Cel. Teixeira à época ainda major, atuou ativamente nos estágios de preparação do novo centro de instruções do Exército Brasileiro, participando do planejamento e implantação da Unidade. A implantação do CIGS foi um grande desafio em todos os sentidos, e exigiu de todos envolvidos naquela faina muita determinação, sendo um dos principais elementos que os movia nesta dura tarefa, era o amor pela Amazônia, levando os pioneiros do CIGS, como o coronel Teixeirão, a trabalhar dia e noite para tornar real toda a estrutura física e organizacional do CIGS, construindo o pilar de valores e sacrifícios que estão arraigados aquela organização militar, a qual possui toda uma mística que envolve o Guerreiro de Selva.

O Coronel Teixeira faleceu em janeiro de 1987, mas deixou um grande legado pela Amazônia, tendo sido ainda idealizador do Colégio Militar de Manaus nos idos anos 70, e mesmo após passar a reserva continuou defendendo nossa Amazônia. Em 1974, foi nomeado, pelo Presidente da República Ernesto Geisel, Prefeito da cidade de Manaus, cargo que ocupou até 1979. Após deixar o cargo de prefeito de Manaus, foi nomeado Governador do Território Federal de Rondônia e se tornou o primeiro Governador do Estado de Rondônia até 1985. Escrevendo em sua passagem política um grande legado desenvolvimentista para cidade de Manaus e o Estado de Rondônia. 

“Selva!”

O famoso brado de “Selva” tem sua criação atribuída ao Cel Teixeira. Conta-se que, na época de sua criação, mais especificamente em seus primeiros dias, o CIGS não dispunha de ficha de serviço de viatura, o que levava a sentinela a perguntar o destino das viaturas que saiam do quartel. Quase sempre recebia uma resposta apressada e precisa: “Selva!”. Era esse o destino. A resposta curta, tão repetida, fez-se saudação espontânea e vibrante, alastrou-se, expandiu o seu significado, ecoou por toda a Amazônia contagiando a todos com o mesmo ideal.

Hoje aos 96 anos do nascimento do Coronel “Teixeirão”, rendemos uma justa homenagem a esse Pioneiro Guerreiro  de Selva e a todos bravos Guerreiros de Selva que, assim como o pioneiro do curso, dedicam suas vidas com amor a defender a Amazônia brasileira.


Nós do GBN Defense e todos nós brasileiros, sabemos que nas matas ou no coração da selva, sempre estará um Guerreiro de Selva zelando pelo que é nosso. 

Podem pensar o que quiser, mas sabemos quem são nossos heróis, podem desejar tomar nossa Amazônia, mas jamais serão capazes de atentar contra nossa soberania, pois lá no meio da selva, onde muitos choram e o medo toma forma, temos a coragem, e a determinação do Guerreiro de Selva Brasileiro.

SELVA!!!! BRASIL!!!! 


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quarta-feira, 20 de maio de 2020

Cano de alma lisa ou raiada_ Qual é a melhor opção_

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Nos dias de hoje, boa parte dos canos de artilharia são de alma raiada, enquanto que praticamente todos os canos que equipam a arma principal dos Carros de Combate, que neste artigo chamaremos 'tanques' por ser o termo mais conhecido, nos calibres 120mm e 125mm (respectivamente o padrão OTAN e russo) são lisos. A única exceção é o L11 britânico de 120 mm, que tem alma raiada.

Qual é a razão de tal diferença?

Primeiramente, deve-se entender a função do raiamento.

O raiamento força o projétil a girar em torno de seu próprio eixo, tipo de movimento conhecido como spin. O spin aumenta consideravelmente a precisão dos projéteis, o que explica sua presença quase que universal na artilharia e em armas leves (à exceção das espingardas, mas falaremos disso mais tarde).

Entretanto, o raiamento tem duas limitações importantes:

  • ·    A primeira é que aumenta a pressão do disparo. Ou seja, para a mesma MV (velocidade de boca), um cano de alma raiada precisa de maior pressão. Alternativamente, para a mesma pressão, um cano de alma lisa resulta em maior MV.

 

  • ·   A segunda limitação é o tamanho do projétil a ser estabilizado, mais especificamente a razão comprimento: diâmetro (L/d).

 

Projéteis com L/d maior que, aproximadamente, 6, não podem ser estabilizados por raiamento do cano. Voltaremos a estas limitações mais tarde.


Missões e munições

Um canhão de tanque, ou um obuseiro, tem como função atingir o inimigo com grandes projéteis. Mas a aplicação principal de cada um é diferente, o que leva a que diferentes qualidades sejam levadas em consideração.

No caso da artilharia, a ideia é saturar uma área com vários projéteis, geralmente HE (altamente explosivos), causando uma tempestade de fragmentos que vão causar muitas baixas nos soldados inimigos, e também dificultar muito a movimentação de veículos. Entretanto, a artilharia não é precisa o suficiente para ser utilizada contra tanques individuais, especialmente se o tanque estiver perto o bastante para retornar fogo.

Os tanques, inicialmente, eram pouco mais que fogo de apoio móvel de infantaria, e os projéteis HE eram bastante eficientes. Mas com a blitzkrieg alemã, os tanques também passaram a ser armas antitanque. Inicialmente, os tanques utilizavam os mesmos projéteis HE contra outros tanques, com bons resultados. Inclusive, o calibre dos canhões era o mesmo dos obuseiros leves, geralmente entre 20 e 37mm.

Panzer II Ausf C, a variante mais numerosa a serviço da Wehrmacht quando da invasão da Polônia. Seu canhão principal era um 2 cm KwK 30 L/55, e a arma coaxial era uma MG34, ambos com alma raiada

 

Evolução dos projéteis antitanque

Com a evolução das blindagens dos tanques, os canhões e os projéteis também tiveram que evoluir. Novos tipos de projéteis antitanque surgiram.

O HESH (explosivo de cabeça esmagável) foram um dos primeiros tipos especificamente desenhados como antitanque, com os HE relegados a usos gerais, embora ainda tivessem capacidade secundária como antitanque.

Por sua natureza, projéteis HESH são mais eficientes dentro de uma determinada velocidade, que é relativamente baixa. O uso de raiamento é essencial para garantir a precisão, e como projéteis HE e HESH funcionam muito bem com raiamento, os canhões dos tanques mudaram muito pouco, exceto pelo aumento de calibres; o Panzer IV Ausf. F2, por exemplo, usava um canhão de 75mm de cano longo, para enfrentar o temível T-34 russo.

Vista lateral de um Panzer IV Ausf. F2. Observe-se o longo cano do poderoso canhão 7.5 cm KwK 40 L/48 de alma raiada, capaz de abater os T-34 a distâncias relativamente seguras 


Com o tempo, projéteis HEAT (explosivo antitanque) ganharam espaço para combater outros tanques. Embora ogivas HEAT não funcionem bem com raiamento, a invenção do 'slip ring', que reduzia o spin induzido pelo raiamento, permitiu que os tanques seguissem usando canhões de alma raiada. Como as blindagens não paravam de evoluir, só os projéteis HEAT e o aumento de calibres era insuficiente.


Munições AP

Já a partir da Segunda Guerra Mundial, projéteis AP (perfurantes de blindagem) começaram a ganhar importância como projéteis antitanque. Inicialmente, os projéteis AP eram muito parecidos com os projéteis HE, mas com a carga explosiva e o detonador substituídos por aço extremamente duro.

Com o tempo, projéteis AP especializados foram desenvolvidos, com massa ('peso') menor que os HE, permitindo que a MV também fosse maior. Ao mesmo tempo, o material do núcleo perfurante foi substituído por substâncias como WC (carbeto de tungstênio), que são muito mais eficientes contra blindagens, mas também mais caros e difíceis de manusear. Tais projéteis eram do tipo APCR (AP de núcleo endurecido), também conhecido como APCBC (AP com cobertura balística) ou HVAP (AP de alta velocidade). A nomenclatura muda conforme o país e o tempo, mas as particularidades são basicamente as mesmas: um projétil com núcleo de WC mas com ocupando todo o calibre.

Enquanto o HEAT mantém sua eficiência independentemente da distância (pois sua energia provém dos explosivos), os projéteis AP perdiam eficiência com a distância, então era comum que os tanques carregassem os dois tipos de projéteis, em adição aos HE que ainda eram muito importantes no apoio à infantaria.

T-34-85, um dos melhores tanques da Segunda Guerra Mundial. Seu poderoso canhão de 85mm de alma raiada era bastante eficiente contra os tanques alemães, mesmo a distâncias consideráveis, e era bastante adequado para disparar projéteis AP


Em determinado momento, surgiu a ideia de fazer os projéteis AP totalmente em WC, obtendo assim a maior eficiência possível. Mas como o WC é extremamente duro, a vida útil dos canos era consumida em um número muito baixo de disparos.


Como resolver o problema?

'Sabots'

Ainda na época da Idade Média e séculos seguintes, era comum a utilização de sabots (sapatas) para selar o cano ao se disparar projéteis de subcalibre, ou seja, que por si só não preenchiam totalmente a alma do cano.

Os sabots geralmente eram de madeira, e como o uso de rochas como projéteis era muito comum, esta solução era muito comum, e funcionavam muito bem nos canos de alma lisa dos canhões e obuseiros primitivos.

O uso de sabots também era comum nos projéteis múltiplos, em que no mesmo disparo eram lançados vários projéteis de subcalibre, com o objetivo de atingir o máximo de inimigos com um único disparo.

As espingardas estão entre as armas mais antigas, e funcionam de forma parecida com os canhões antigos, daí a alma lisa.

Entretanto, com o surgimento dos projéteis HE com desenho ogival, os canos de alma raiada passaram a ser cada vez mais importantes, e os sabots foram abandonados em favor dos novos projetos.

Algum dos projetistas de munições acabou por se inspirar na história, e a versão moderna dos sabots acabou sendo usada nas munições APDS (AP com sabots descartáveis). Ao mesmo tempo, o calibre dos canhões aumentou ainda mais, chegando aos 90mm no final da Segunda Guerra Mundial e aos 105mm pouco tempo depois. Entretanto, como as blindagens dos tanques não parava de subir, uma nova família de projéteis era necessária.

T-55, que juntamente com seu ‘irmão’ T-54 foi o tanque mais produzido da História (provavelmente acima de 100 mil unidades!!). Seu poderoso canhão D-10T de alma raiada não só é bastante eficiente com munições AP como também pode disparar ATGM (mísseis guiados anti tanque) como o AT-10 Stabber. O cilindro na traseira do T-55 não é para armazenar combustível, mas para gerar fumaça. A doutrina soviética enfatiza bastante o uso de fumaça para cobrir o avanço dos seus blindados 


Alma lisa retorna triunfante

Ao longo das décadas de 1960 e 1970, os projetistas de tanques da URSS perceberam que seus canhões eram incapazes de penetrar as blindagens dos modernos tanques da OTAN, e ao pesquisar formas de resolver o problema, se depararam com os projéteis pfeil (literalmente 'flecha') alemães que seriam usados nos obuseiros V3, que não chegaram a ser operacionais por chegarem tarde demais na Segunda Guerra Mundial.

Com a evolução das 'flechas' e das blindagens, chegou-se rapidamente ao ponto em que as 'flechas' utilizadas nas munições passassem do ponto em que a L/d = 6, com as 'flechas' modernas tendo L/d = 20, o que significa que não podem ser estabilizados por spin.

A solução foi estabilizar os projéteis por aletas, e quanto os pesquisadores soviéticos conseguiram combinar as 'flechas' de WC com aletas e sabots, surgiram os famosos e mortíferos projéteis APFSDS (AP, estabilizados por aletas, sabots descartáveis).

Concepção artística da 'flecha' se separando dos 'sabots', evento que acontece pouco depois da saída do cano

Logo se percebeu que os canos de alma lisa eram melhores para os projéteis estabilizados por aletas. Assim, gradativamente, os tanques abandonaram os canos de alma raiada em favor dos canos de alma lisa.

A desvantagem é que o uso de aletas em projéteis explosivos diminui sua carga (dado o mesmo peso). Por isso que a artilharia geralmente ainda usa canos de alma raiada - projéteis explosivos são os principais na artilharia.

Já em 1966, o T-64 soviético adotou o poderoso canhão 2A46, de 125mm e alma lisa, que foi o primeiro capaz de utilizar munições APFSDS. Embora as 13 mil unidades do T-64 tenham ficado longe das quantidades de T-54/T-55 por ser muito caro e avançado, seu derivado simplificado, o T-72, foi produzido na impressionante quantidade de 26 mil unidades.

T-64, cujo canhão 2A46 de alma lisa foi o primeiro a disparar munições APFSDS

Os ocidentais seguiram a tendência apenas em 1979, tanto com o M68A1E2 (uma evolução do britânico L7 de 105mm e que acabou usado nos tanques que já adotavam o L7 ou o M68 e nas versões iniciais do Abrams) como com o Rheinmetall L/44, adotado nos Leopard 2 e M1 Abrams de lotes posteriores. Ao longo do tempo, outros blindados ocidentais adotaram o calibre 120mm, que hoje é o padrão OTAN. Os EUA usam DU (urânio exaurido) como material das ‘flechas’, enquanto os demais países seguem com WC). Falaremos disso mais tarde.

O único canhão moderno de 120mm de alma raiada é o L11 britânico (usado no Chieftain e no Challenger 1) e seu derivado L30 (usado no Challenger 2). A doutrina britânica da época do desenvolvimento do canhão (1966, mais ou menos contemporâneo ao T-64) dava grande valor à munição HESH (tanto para uso geral como antitanque). Originalmente, o L11 disparava munições L-15 APDS e L31A7 HESH para uso misto (antitanque e geral). Após o desenvolvimento das munições APFSDS L23 (WC, entrou em serviço em 1985) e as mais moderna L26 (feita de DU) e L27 (também feita de DU, mas só pode ser usada a partir do canhão L30), as munições HESH perderam a função antitanque.


O polêmico DU

Praticamente todos os elementos químicos que ocorrem naturalmente são compostos por uma mistura de isótopos. Retomando um pouco das aulas do Ensino Médio, isótopos são átomos do mesmo elemento que apresentam diferentes números de nêutrons no núcleo. Via de regra, isótopos possuem propriedades químicas e físicas bastante semelhantes e, com a exceção de poucos usos na indústria nuclear, não é necessário separar os isótopos para usar os materiais.

Mas é justamente na indústria nuclear que as propriedades dos isótopos fazem toda a diferença. Um exemplo é o urânio. De modo geral, o urânio presente na natureza é composto de aproximadamente 99,27% urânio-238 (U238), 0,72% urânio-235 (U235) e traços dos demais isótopos. O U235 tem excelentes propriedades para geração de energia nuclear, mas o U238 não.

A separação do U235 é feita através de um processo conhecido como enriquecimento, em que uma fração é EU (urânio enriquecido; o grau de enriquecimento depende do uso, mas esse tópico está fora do escopo do presente artigo) e a outra fração é DU (urânio exaurido), em que a quantidade de U235 é inferior a 0,3%.

O DU tem excelentes propriedades mecânicas tanto para uso em blindagens (algumas versões do Abrams usam DU na blindagem) quanto em munições AP - oferece um aumento de até 30% na performance dos penetradores.

Além do uso em munições APFSDS do M1 Abrams, munições APCR, APDS e APFSDS com penetradores de DU são usadas em várias armas americanas, como o canhão 25mm Bushmaster dos M2 Bradley e o canhão 30mm Avenger dos A-10.

O Reino Unido, aliado tradicional dos EUA, usa o DU nas munições APFSDS L26 e L27 usadas pelos seus MBT, especialmente o Challenger 2.

Entretanto, o DU também é altamente tóxico, tanto por ser um metal pesado como por ser radioativo. Embora a radioatividade do DU seja menor que do urânio natural e muito menor que do EU, ela não é zero, e aumenta ainda mais os perigos advindos do envenenamento por DU. Essa toxicidade tem levado os EUA e o Reino Unido a buscarem alternativas ao DU, principalmente na forma de WC, mas ainda não substituíram a perigosa substância.



Por: Renato Marçal


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