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sábado, 27 de junho de 2020

PARA ATENDER NOSSAS NECESSIDADES NO SÉCULO XXI: A FORÇA AÉREA BRASILEIRA E O GRIPEN

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O Gripen está chegando! Para muitos entusiastas e fãs da aviação, é uma excelente notícia, após vivermos tempos difíceis por causa da Pandemia do Novo Coronavírus e seus efeitos para nossa sociedade. A primeira célula da Força Aérea Brasileira (FAB), o FAB 4100, chega ainda esse ano, mas sua entrada em serviço deverá ser apenas no ano que vem. Sua entrada em serviço transformará a FAB numa força aérea realmente capaz de cumprir com sua missão de proteger e defender o nosso espaço aéreo. Nesse artigo, vamos ver um pouco da História do Gripen e sua aquisição pelo Brasil.

DO “GRIPEN DEMO” AO “GRIPEN NG”

O F-39E/F Gripen é um significativo avanço do já conhecido caça JAS 39 Gripen, fabricado pela Saab da Suécia desde meados dos anos 90, operado inicialmente pela Força Aérea Sueca (nas versões JAS 39 A/B/C/D e futuramente a E/F) e posteriormente exportado para vários países, como a África do Sul, Hungria, República Tcheca e Tailândia (na versão JAS 39 C/D). O Reino Unido, através da sua Escola de Pilotos de Teste (ETPS, em inglês) operam o JAS 39D.

Em 2007, um avião de dois lugares, designado pela SAAB de “Gripen Demo”, foi construído englobando várias atualizações e melhorias para o Gripen. Essa nova aeronave, que seria inicialmente um demonstrador de tecnologia da empresa, estava alimentada pela mais poderosa turbina General Electric F414G, um desenvolvimento do motor do Boeing F/A-18E/F Super Hornet. O peso máximo de decolagem (PMD) do Gripen Demo foi aumentado de 14.000 para 16.000 kg, a capacidade interna de combustível foi aumentada em 40% ao reposicionar o trem de pouso, o que também permitiu a adição de mais dois pontos duros na parte inferior da fuselagem. Seu raio de combate era de 1.300 quilômetros (810 mi) quando carregava seis AAMs e tanques ejetáveis O radar PS-05/A foi substituído pelo novo radar ativo de varredura eletrônica (AESA) Raven ES-05, que é baseado na família de radar Vixen AESA da Selex ES (desde 2017 Leonardo SpA). O voo inaugural do Gripen Demo foi realizado no dia 27 de maio de 2008. Em 21 de janeiro de 2009, o Gripen Demo voou a Mach 1.2 sem uso do pós-combustor para testar sua capacidade de Supercruise (voo supersônico sem o uso de pós-combustor). O Gripen Demo serviu de base para o Gripen E/F, também chamado de Gripen NG.

O Gripen Demo (NG) em voo. Observe a capacidade bélica da aeronave, carregando duas bombas guiadas de manejo nos pilones centrais e mais mísseis AAM e tanques externos nas asas. (Foto: Poder Aéreo)

A SAAB estudou uma variante do Gripen capaz de operar a partir de porta-aviões nos anos 90. Em 2009, lançou o projeto "Sea Gripen" em resposta ao pedido da Índia de informações sobre uma aeronave capaz de operar em porta-aviões. O Brasil também demonstrou interesse nesse tipo de aeronave. Após uma reunião com funcionários do Ministério da Defesa inglês (MoD) em maio de 2011, a SAAB concordou em estabelecer um centro de desenvolvimento no Reino Unido para ampliar o conceito do Sea Gripen. Em 2013, executivos da SAAB afirmaram que o desenvolvimento de uma versão opcionalmente tripulada do Gripen E, capaz de operar operações não tripuladas, estava sendo explorado pela empresa; um maior desenvolvimento das versões opcionalmente tripuladas e transportadoras exigiria o compromisso de um cliente. Em setembro de 2015, foi anunciado pela SAAB que uma versão de guerra eletrônica (EW) do Gripen F de dois lugares estava em desenvolvimento.

Maquete do Sea Gripen apresentada durante a LAAD em 2015. (Foto: Poder Naval)
Em 2010, a Suécia concedeu à SAAB um contrato de quatro anos para melhorar o radar e outros equipamentos do Gripen, integrar novas armas e reduzir seus custos operacionais. Em junho de 2010, a Saab declarou que a Suécia planejava encomendar o Gripen NG, designado JAS 39E/F, e entraria em serviço em 2017 ou antes, dependendo das ordens de exportação. Em 25 de agosto de 2012, após a intenção da Suíça de comprar 22 das variantes E/F, a Suécia anunciou que planejava comprar 40-60 Gripen E/F. O governo sueco decidiu comprar 60 Gripen E em 17 de janeiro de 2013, abandonando a compra da versão F.

Em julho de 2013, a montagem começou na primeira aeronave de pré-produção. Originalmente, 60 JAS 39C da Força Aérea Sueca deveriam ser convertidos para o modelo E até 2023, mas isso foi modificado para a construção de aeronaves novas, com apenas poucas partes reutilizáveis das antigas. A primeira aeronave de produção será entregue em 2018. Em março de 2014, a Saab revelou o projeto detalhado e indicou que planejava receber a certificação de tipo militar no início de 2018. O primeiro Gripen E foi lançado em 18 de maio de 2016. A Saab adiou o primeiro voo de 2016 para 2017 para se concentrar na certificação do software, mas os testes de táxi de alta velocidade começaram em dezembro de 2016. Em 15 de junho de 2017, a SAAB completou o primeiro voo do Gripen E.

O PROGRAMA FX-2 E A COMPRA DO GRIPEN PELA FAB

Em outubro de 2008, o Brasil selecionou os três finalistas ("short list") para o seu programa de caça F-X2: o Dassault Rafale B/C, o Boeing F/A-18E/F Super Hornet e o JAS 39E/F Gripen NG (Next Generation – Próxima Geração). Inicialmente, a Força Aérea Brasileira planejava adquirir pelo menos 36 e possivelmente até 120 células posteriormente, para substituir suas aeronaves Northrop F‐5EM/FM e Dassault Mirage 2000B/C. Em fevereiro de 2009, a Saab apresentou uma licitação para 36 Gripen NGs. Em janeiro de 2010, relatos afirmaram que o relatório final de avaliação da Força Aérea Brasileira colocava o Gripen à frente de outros concorrentes; o fator decisivo foi o custo unitário e os custos operacionais menores. Em meio a atrasos devido a restrições financeiras, houve relatos em 2010 da seleção do Rafale e em 2011 da seleção do F/A-18 (segundo rumores, por razões políticas, e não técnicas). No dia 18 de dezembro de 2013, a então presidente Dilma Rousseff anunciou a seleção do Gripen NG.

Os principais fatores de decisão pela aeronave, que ainda estava sendo desenvolvida, foram as oportunidades domésticas de fabricação, participação no desenvolvimento do Gripen, ampla possibilidade de Transferência de Tecnologia (ToT, em inglês) para o Brasil e potenciais exportações para África, Ásia e América Latina; Argentina e Equador demonstraram interesse adquirir Gripens do ou através do Brasil, e o México. é considerado uma meta de exportação. Mesmo sendo um produto da indústria sueca, o Gripen não está imune à pressão externa: o Reino Unido pode usar sua porcentagem de 30% de componentes no Gripen para vetar uma venda para a Argentina devido à disputa nas Ilhas Falklands; assim, a Argentina desistiu do Gripen e hoje está considerando adquirir aeronaves russas, chinesas ou coreanas, como o KAI T-50 Golden Eagle. Até o início das entregas do Gripen E, o Brasil pretendia alugar várias aeronaves Gripen C, principalmente para apoiar os grandes eventos aqui sediados, como a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. Posteriormente essa ideia acabou sendo abandonada.

No dia 24 de outubro de 2014, o Brasil e a Suécia assinaram um contrato de SEK 39,3 bilhões (US$ 5,44 bilhões, ou R$ 13 bilhões na cotação da época) para a compra de 28 aeronaves Gripen E e 8 Gripen F a serem entregues na época entre 2019 a 2024 e mantidas até 2050; o governo sueco fornecerá um empréstimo subsidiado de 25 anos e taxa de juros de 2,19% para a compra. Pelo menos 15 aeronaves serão montadas no Brasil, e as empresas brasileiras devem estar envolvidas na produção completa; a aeronave Gripen F, de dois assentos, deve ser entregue mais tarde (ela será exclusiva da FAB, não sendo produzida para os suecos). Um aumento de preço de quase US$ 1 bilhão desde a seleção deve-se a desenvolvimentos solicitados pelo Brasil, como o “Wide Area Display” (WAD), uma tela panorâmica de 19 por 8 polegadas com a tecnologia “touchscreen”, exclusivo para a FAB até o momento (os suecos hoje cogitam instalar o WAD em suas células). O pacote de compensação é estabelecido em US$ 9 bilhões, ou 1,7 vezes o valor do pedido. Dois pilotos brasileiros foram treinados na Suécia entre novembro de 2014 e abril de 2015. A Força Aérea Brasileira tem uma exigência para 108 Gripens, a serem entregues em três lotes. A Marinha do Brasil demonstrou interesse no Sea Gripen (uma versão navalizada do Gripen) para substituir seus caças aeronavais Douglas A-4KU Skyhawk (AF-1 Falcão), mas com a baixa do NAe São Paulo (A-12), essa ideia foi abandonada. Em 2015, o Brasil e a Suécia finalizaram o acordo para o desenvolvimento do Gripen F, que foi designado F-39 pelo Brasil. De acordo com executivos da SAAB, o primeiro F-39E será entregue no final de 2020 e o primeiro F-39F em meados de 2023 ou 2024.


Painel de instrumentos do Gripen E (F-39E) da FAB, com a presença do WAD. (Fonte: Pinterest)

AFINAL, POR QUE O GRIPEN PARA A FAB?

Como observamos, o Gripen da FAB é uma aeronave nova, com grande potencial de desenvolvimento e atualizações. O projeto do Gripen, apesar de ser dos anos 80, foi pensado visando o futuro, pois já estava no horizonte os cortes dos orçamentos militares pós-Guerra Fria e as limitações operacionais como consequência desses cortes. Algumas características da simplicidade operacional do Gripen e sua praticidade foram bastante apreciadas pelos militares da Força Aérea Brasileira, como por exemplo a capacidade de decolar em pistas curtas e a fácil manutenção.

Durante a Guerra Fria, as Forças Armadas da Suécia estavam prontas para se defender contra uma possível invasão. Isto exigiu que os aviões de combate se espalhassem para manter uma capacidade de defesa aérea. Assim, um dos principais objetivos durante o desenvolvimento do Gripen foi a capacidade do avião de decolar de pistas de pouso cobertas de neve em apenas oitocentos metros. Além disso, o tempo no qual uma equipe pode rearmar, reabastecer e realizar inspeções básicas e serviços gerais para o avião retornar ao voo é de dez minutos.

Durante o processo de desenvolvimento, outro objetivo foi fazer com que a aeronave tivesse uma manutenção simples e com poucos custos. As aeronaves estão equipadas com um sistema de monitoramento de uso e danos, que monitora o desempenho de vários sistemas e fornece informações aos técnicos para auxiliar na manutenção. O fabricante opera um programa de melhoria contínua do avião, utilizando as informações deste e de outros sistemas. De acordo com a SAAB, o Gripen fornece custos de operação 50% menores do que o seu principal concorrente (o F-16).

Um estudo de 2012 da “Jane's Aerospace and Defense Consulting” comparou os custos operacionais de uma série de aviões de combate, mostrando que o Gripen tem o custo mais baixo de operação por hora de voo, melhor eficiência em relação ao consumo de combustível, preparações e reparos antes do voo e manutenção programada para o aeroporto, com os custos de equipe. O Gripen tem um custo por hora de voo estimado de 4.700 dólares, enquanto seu concorrente direto, o Lockheed Martin F-16, tem um custo cerca de 49% maior, de 7 mil dólares.

Além da economia e da praticidade, o Gripen também é uma excelente aeronave de caça, no tocante à sua manobrabilidade e sobrevivência em combate aéreo. Seu peso máximo de decolagem (PMD) é cerca de 30% menor do que o do F-16 (um projeto dos anos 70, que está no limite do seu desenvolvimento, assim como o F/A-18), devido principalmente ao amplo uso de material composto. Por isso a versão NG da aeronave, com uma turbina bastante potente (o GE F414G) é capaz de Supercruise, enquanto o F-16, que é equipado com um motor da mesma categoria do Gripen, o F110-GE-129, não é capaz de Supercruise.

Seu pacote de armamento também é muito diversificado: opera o canhão Mauser BK-27 de 27 mm (apenas a versão E) e uma gama de mísseis ar-ar, ar-terra e ar-mar. Pode ser integrado com qualquer equipamento ocidental e padrão OTAN, pois opera o mesmo barramento e está certificado adequadamente para o uso desses armamentos. A FAB vai utilizar no F-39E/F o A-Darter como míssil ar-ar de curto alcance (WVR) e o poderoso Meteor como míssil ar-ar de longo alcance (BVR). O Gripen também vai poder operar o poderoso míssil ar-mar Exocet AM-39 também sua futura versão nacionalizada, e além disso deve operar os mesmos sistemas de armas que a FAB já opera, como a bomba Lizard e seu sistema de navegação e orientação Litening, por exemplo, mas com capacidade de operar outros sistemas futuro, pois a aeronave está ainda em franco desenvolvimento, com grande capacidade de atualização.

O Gripen é uma aeronave monomotor, pois opera apenas uma turbina GE F414G, baseada na turbina do Super Hornet, como já foi colocado, O F414G é uma turbina altamente confiável, com uma grande capacidade de absorção de danos e de fácil manutenção. O Gripen pode trocar uma turbina em terra em poucas horas e por uma equipe simples, sendo isso também um dos fatores positivos da aeronave. A confiabilidade do Gripen é bastante alta, sendo em alguns casos até maior do que aeronaves bimotoras como o Eurofighter Typhoon e o Dassault Rafale (pois geralmente quando uma aeronave dessas perde um motor ela pode ficar bastante instável e muitas vezes difícil de pilotar, com o piloto optando por ejetar). O registro de acidentes e incidentes do Gripen, desde sua entrada em serviço nos anos 90, prova bem isso, pois o modelo sofreu apenas 11 acidentes, com dez perdas da aeronave, e apenas uma morte.

Muito se fala a respeito de nossos vizinhos na América do Sul, especialmente os “temidos” Sukhoi Su-30 MKV da Venezuela, os Mig-29 do Peru e os F-16 chilenos. No caso particular dos Su-30, que a Força Aérea Venezuelana (AMV) opera em razoável quantidade, podemos até admitir sua letalidade, mas devemos questionar que a mesma possa estar sofrendo restrições operacionais, pela crise que o país está passando, e a falta de um parque industrial que apoie essa aeronave, fator que afeta também os peruanos e chilenos. Para nossa realidade e contexto na América do Sul (e também na América Latina), a entrada em serviço do F-39 dará um salto operacional à FAB, tornando-a a mais letal do continente, devido principalmente ao suporte de nossa indústria e a aeronave vir adicionada do vasto pacote de armas que já foi citado.

Foi noticiado que ainda nesse ano a Saab enviará a primeira célula do F-39E produzida para a FAB ao Brasil, para testes de integração do sistema pela Embraer, coprodutora do Gripen. O cronograma financeiro-orçamentário estabelecido até o momento prevê a entrega de 4 aeronaves em 2021, 7 em 2022, 6 em 2023, 8 em 2024, 9 em 2025 e duas em 2026. Eventuais atrasos de pagamento ou problemas técnicos podem levar a uma replanejamento, porém, desde a assinatura do contrato o prazo inicial para o recebimento das aeronaves pela FAB era em 2021.

Em resumo, economia operacional, resistência, desempenho e custo-benefício foram os fatores da compra do F-39E/F pela FAB. Aguardamos ansiosamente sua entrada em serviço em 2021, no 1º GDA (Grupo de Defesa Aérea) e no 1º/16º GAv (Grupo de Aviação), que será reativado, ambas unidades situadas na atual Ala 2, em Anápolis-GO. Será o nosso caça para a primeira metade do século XXI e para nossas necessidades, a realidade em que vivemos e a capacidade que o vetor demonstra, está de bom tamanho para o Brasil.


FOTO DE CAPA: Foto do primeiro voo do Gripen E da Força Aérea Brasileira, o FAB 4100. (Fonte: Saab)

Com informações retiradas da Wikipedia.


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Por Luiz Reis, Professor de História da Rede Oficial de Ensino do Estado do Ceará e da Prefeitura de Fortaleza, Historiador Militar, entusiasta da Aviação Civil e Militar, fotógrafo amador. Brasiliense com alma paulista, reside atualmente em Fortaleza-CE. Luiz colaborou com o Canal Arte da Guerra e o Blog Velho General e atua esporadicamente nos blogs da Trilogia Forças de Defesa, também fazendo parte da equipe de articulistas do GBN Defense e do Canal Militarizando no Youtube. Presta consultoria sobre História da Aviação, Aviação Militar e Comercial. Contato: [email protected]


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