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quarta-feira, 20 de maio de 2020

Cano de alma lisa ou raiada_ Qual é a melhor opção_

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Nos dias de hoje, boa parte dos canos de artilharia são de alma raiada, enquanto que praticamente todos os canos que equipam a arma principal dos Carros de Combate, que neste artigo chamaremos 'tanques' por ser o termo mais conhecido, nos calibres 120mm e 125mm (respectivamente o padrão OTAN e russo) são lisos. A única exceção é o L11 britânico de 120 mm, que tem alma raiada.

Qual é a razão de tal diferença?

Primeiramente, deve-se entender a função do raiamento.

O raiamento força o projétil a girar em torno de seu próprio eixo, tipo de movimento conhecido como spin. O spin aumenta consideravelmente a precisão dos projéteis, o que explica sua presença quase que universal na artilharia e em armas leves (à exceção das espingardas, mas falaremos disso mais tarde).

Entretanto, o raiamento tem duas limitações importantes:

  • ·    A primeira é que aumenta a pressão do disparo. Ou seja, para a mesma MV (velocidade de boca), um cano de alma raiada precisa de maior pressão. Alternativamente, para a mesma pressão, um cano de alma lisa resulta em maior MV.

 

  • ·   A segunda limitação é o tamanho do projétil a ser estabilizado, mais especificamente a razão comprimento: diâmetro (L/d).

 

Projéteis com L/d maior que, aproximadamente, 6, não podem ser estabilizados por raiamento do cano. Voltaremos a estas limitações mais tarde.


Missões e munições

Um canhão de tanque, ou um obuseiro, tem como função atingir o inimigo com grandes projéteis. Mas a aplicação principal de cada um é diferente, o que leva a que diferentes qualidades sejam levadas em consideração.

No caso da artilharia, a ideia é saturar uma área com vários projéteis, geralmente HE (altamente explosivos), causando uma tempestade de fragmentos que vão causar muitas baixas nos soldados inimigos, e também dificultar muito a movimentação de veículos. Entretanto, a artilharia não é precisa o suficiente para ser utilizada contra tanques individuais, especialmente se o tanque estiver perto o bastante para retornar fogo.

Os tanques, inicialmente, eram pouco mais que fogo de apoio móvel de infantaria, e os projéteis HE eram bastante eficientes. Mas com a blitzkrieg alemã, os tanques também passaram a ser armas antitanque. Inicialmente, os tanques utilizavam os mesmos projéteis HE contra outros tanques, com bons resultados. Inclusive, o calibre dos canhões era o mesmo dos obuseiros leves, geralmente entre 20 e 37mm.

Panzer II Ausf C, a variante mais numerosa a serviço da Wehrmacht quando da invasão da Polônia. Seu canhão principal era um 2 cm KwK 30 L/55, e a arma coaxial era uma MG34, ambos com alma raiada

 

Evolução dos projéteis antitanque

Com a evolução das blindagens dos tanques, os canhões e os projéteis também tiveram que evoluir. Novos tipos de projéteis antitanque surgiram.

O HESH (explosivo de cabeça esmagável) foram um dos primeiros tipos especificamente desenhados como antitanque, com os HE relegados a usos gerais, embora ainda tivessem capacidade secundária como antitanque.

Por sua natureza, projéteis HESH são mais eficientes dentro de uma determinada velocidade, que é relativamente baixa. O uso de raiamento é essencial para garantir a precisão, e como projéteis HE e HESH funcionam muito bem com raiamento, os canhões dos tanques mudaram muito pouco, exceto pelo aumento de calibres; o Panzer IV Ausf. F2, por exemplo, usava um canhão de 75mm de cano longo, para enfrentar o temível T-34 russo.

Vista lateral de um Panzer IV Ausf. F2. Observe-se o longo cano do poderoso canhão 7.5 cm KwK 40 L/48 de alma raiada, capaz de abater os T-34 a distâncias relativamente seguras 


Com o tempo, projéteis HEAT (explosivo antitanque) ganharam espaço para combater outros tanques. Embora ogivas HEAT não funcionem bem com raiamento, a invenção do 'slip ring', que reduzia o spin induzido pelo raiamento, permitiu que os tanques seguissem usando canhões de alma raiada. Como as blindagens não paravam de evoluir, só os projéteis HEAT e o aumento de calibres era insuficiente.


Munições AP

Já a partir da Segunda Guerra Mundial, projéteis AP (perfurantes de blindagem) começaram a ganhar importância como projéteis antitanque. Inicialmente, os projéteis AP eram muito parecidos com os projéteis HE, mas com a carga explosiva e o detonador substituídos por aço extremamente duro.

Com o tempo, projéteis AP especializados foram desenvolvidos, com massa ('peso') menor que os HE, permitindo que a MV também fosse maior. Ao mesmo tempo, o material do núcleo perfurante foi substituído por substâncias como WC (carbeto de tungstênio), que são muito mais eficientes contra blindagens, mas também mais caros e difíceis de manusear. Tais projéteis eram do tipo APCR (AP de núcleo endurecido), também conhecido como APCBC (AP com cobertura balística) ou HVAP (AP de alta velocidade). A nomenclatura muda conforme o país e o tempo, mas as particularidades são basicamente as mesmas: um projétil com núcleo de WC mas com ocupando todo o calibre.

Enquanto o HEAT mantém sua eficiência independentemente da distância (pois sua energia provém dos explosivos), os projéteis AP perdiam eficiência com a distância, então era comum que os tanques carregassem os dois tipos de projéteis, em adição aos HE que ainda eram muito importantes no apoio à infantaria.

T-34-85, um dos melhores tanques da Segunda Guerra Mundial. Seu poderoso canhão de 85mm de alma raiada era bastante eficiente contra os tanques alemães, mesmo a distâncias consideráveis, e era bastante adequado para disparar projéteis AP


Em determinado momento, surgiu a ideia de fazer os projéteis AP totalmente em WC, obtendo assim a maior eficiência possível. Mas como o WC é extremamente duro, a vida útil dos canos era consumida em um número muito baixo de disparos.


Como resolver o problema?

'Sabots'

Ainda na época da Idade Média e séculos seguintes, era comum a utilização de sabots (sapatas) para selar o cano ao se disparar projéteis de subcalibre, ou seja, que por si só não preenchiam totalmente a alma do cano.

Os sabots geralmente eram de madeira, e como o uso de rochas como projéteis era muito comum, esta solução era muito comum, e funcionavam muito bem nos canos de alma lisa dos canhões e obuseiros primitivos.

O uso de sabots também era comum nos projéteis múltiplos, em que no mesmo disparo eram lançados vários projéteis de subcalibre, com o objetivo de atingir o máximo de inimigos com um único disparo.

As espingardas estão entre as armas mais antigas, e funcionam de forma parecida com os canhões antigos, daí a alma lisa.

Entretanto, com o surgimento dos projéteis HE com desenho ogival, os canos de alma raiada passaram a ser cada vez mais importantes, e os sabots foram abandonados em favor dos novos projetos.

Algum dos projetistas de munições acabou por se inspirar na história, e a versão moderna dos sabots acabou sendo usada nas munições APDS (AP com sabots descartáveis). Ao mesmo tempo, o calibre dos canhões aumentou ainda mais, chegando aos 90mm no final da Segunda Guerra Mundial e aos 105mm pouco tempo depois. Entretanto, como as blindagens dos tanques não parava de subir, uma nova família de projéteis era necessária.

T-55, que juntamente com seu ‘irmão’ T-54 foi o tanque mais produzido da História (provavelmente acima de 100 mil unidades!!). Seu poderoso canhão D-10T de alma raiada não só é bastante eficiente com munições AP como também pode disparar ATGM (mísseis guiados anti tanque) como o AT-10 Stabber. O cilindro na traseira do T-55 não é para armazenar combustível, mas para gerar fumaça. A doutrina soviética enfatiza bastante o uso de fumaça para cobrir o avanço dos seus blindados 


Alma lisa retorna triunfante

Ao longo das décadas de 1960 e 1970, os projetistas de tanques da URSS perceberam que seus canhões eram incapazes de penetrar as blindagens dos modernos tanques da OTAN, e ao pesquisar formas de resolver o problema, se depararam com os projéteis pfeil (literalmente 'flecha') alemães que seriam usados nos obuseiros V3, que não chegaram a ser operacionais por chegarem tarde demais na Segunda Guerra Mundial.

Com a evolução das 'flechas' e das blindagens, chegou-se rapidamente ao ponto em que as 'flechas' utilizadas nas munições passassem do ponto em que a L/d = 6, com as 'flechas' modernas tendo L/d = 20, o que significa que não podem ser estabilizados por spin.

A solução foi estabilizar os projéteis por aletas, e quanto os pesquisadores soviéticos conseguiram combinar as 'flechas' de WC com aletas e sabots, surgiram os famosos e mortíferos projéteis APFSDS (AP, estabilizados por aletas, sabots descartáveis).

Concepção artística da 'flecha' se separando dos 'sabots', evento que acontece pouco depois da saída do cano

Logo se percebeu que os canos de alma lisa eram melhores para os projéteis estabilizados por aletas. Assim, gradativamente, os tanques abandonaram os canos de alma raiada em favor dos canos de alma lisa.

A desvantagem é que o uso de aletas em projéteis explosivos diminui sua carga (dado o mesmo peso). Por isso que a artilharia geralmente ainda usa canos de alma raiada - projéteis explosivos são os principais na artilharia.

Já em 1966, o T-64 soviético adotou o poderoso canhão 2A46, de 125mm e alma lisa, que foi o primeiro capaz de utilizar munições APFSDS. Embora as 13 mil unidades do T-64 tenham ficado longe das quantidades de T-54/T-55 por ser muito caro e avançado, seu derivado simplificado, o T-72, foi produzido na impressionante quantidade de 26 mil unidades.

T-64, cujo canhão 2A46 de alma lisa foi o primeiro a disparar munições APFSDS

Os ocidentais seguiram a tendência apenas em 1979, tanto com o M68A1E2 (uma evolução do britânico L7 de 105mm e que acabou usado nos tanques que já adotavam o L7 ou o M68 e nas versões iniciais do Abrams) como com o Rheinmetall L/44, adotado nos Leopard 2 e M1 Abrams de lotes posteriores. Ao longo do tempo, outros blindados ocidentais adotaram o calibre 120mm, que hoje é o padrão OTAN. Os EUA usam DU (urânio exaurido) como material das ‘flechas’, enquanto os demais países seguem com WC). Falaremos disso mais tarde.

O único canhão moderno de 120mm de alma raiada é o L11 britânico (usado no Chieftain e no Challenger 1) e seu derivado L30 (usado no Challenger 2). A doutrina britânica da época do desenvolvimento do canhão (1966, mais ou menos contemporâneo ao T-64) dava grande valor à munição HESH (tanto para uso geral como antitanque). Originalmente, o L11 disparava munições L-15 APDS e L31A7 HESH para uso misto (antitanque e geral). Após o desenvolvimento das munições APFSDS L23 (WC, entrou em serviço em 1985) e as mais moderna L26 (feita de DU) e L27 (também feita de DU, mas só pode ser usada a partir do canhão L30), as munições HESH perderam a função antitanque.


O polêmico DU

Praticamente todos os elementos químicos que ocorrem naturalmente são compostos por uma mistura de isótopos. Retomando um pouco das aulas do Ensino Médio, isótopos são átomos do mesmo elemento que apresentam diferentes números de nêutrons no núcleo. Via de regra, isótopos possuem propriedades químicas e físicas bastante semelhantes e, com a exceção de poucos usos na indústria nuclear, não é necessário separar os isótopos para usar os materiais.

Mas é justamente na indústria nuclear que as propriedades dos isótopos fazem toda a diferença. Um exemplo é o urânio. De modo geral, o urânio presente na natureza é composto de aproximadamente 99,27% urânio-238 (U238), 0,72% urânio-235 (U235) e traços dos demais isótopos. O U235 tem excelentes propriedades para geração de energia nuclear, mas o U238 não.

A separação do U235 é feita através de um processo conhecido como enriquecimento, em que uma fração é EU (urânio enriquecido; o grau de enriquecimento depende do uso, mas esse tópico está fora do escopo do presente artigo) e a outra fração é DU (urânio exaurido), em que a quantidade de U235 é inferior a 0,3%.

O DU tem excelentes propriedades mecânicas tanto para uso em blindagens (algumas versões do Abrams usam DU na blindagem) quanto em munições AP - oferece um aumento de até 30% na performance dos penetradores.

Além do uso em munições APFSDS do M1 Abrams, munições APCR, APDS e APFSDS com penetradores de DU são usadas em várias armas americanas, como o canhão 25mm Bushmaster dos M2 Bradley e o canhão 30mm Avenger dos A-10.

O Reino Unido, aliado tradicional dos EUA, usa o DU nas munições APFSDS L26 e L27 usadas pelos seus MBT, especialmente o Challenger 2.

Entretanto, o DU também é altamente tóxico, tanto por ser um metal pesado como por ser radioativo. Embora a radioatividade do DU seja menor que do urânio natural e muito menor que do EU, ela não é zero, e aumenta ainda mais os perigos advindos do envenenamento por DU. Essa toxicidade tem levado os EUA e o Reino Unido a buscarem alternativas ao DU, principalmente na forma de WC, mas ainda não substituíram a perigosa substância.



Por: Renato Marçal


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sexta-feira, 27 de março de 2020

Vitória ou derrota? A Doutrina Powell em ação

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O que é a vitória numa guerra? O simples fato de haver dúvidas, em vários casos, sobre quem venceu determinada guerra, já é um indicativo de que não é fácil responder a essa pergunta. Entre os exemplos que vêm à mente estão os EUA na Guerra do Vietnã e Israel na Segunda Guerra do Líbano de 2006.

Aliás, foi justamente o desempenho, digamos, questionável dos EUA no Vietnã que inspirou o Gen Powell - Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA durante a Guerra do Golfo (1990-1991) - a pensar num conjunto de doutrinas que foi apelidado por jornalistas como “Doutrina Powell”.




O TRAUMA PÓS VIETNÃ

Até hoje a pergunta “Os EUA venceram a Guerra do Vietnã?” suscita grandes debates. E as razões são várias.

A primeira delas é que a segurança imediata dos EUA não estava ameaçada pelo avanço do comunismo no Vietnã. Muitos vão invocar a famosa observação que “é fácil ser engenheiro de obra pronta”, e de fato o pensamento de hoje é diferente do que era na época, mas o fato é que a segurança direta dos EUA nunca esteve sob perigo por ação vietnamita.

Talvez por esse motivo, o apoio da população americana à guerra nunca foi grande, especialmente em relação às convocações. O clima anti-guerra teve no Vietnã o seu auge, justamente porque muitos não entendiam, ou não aceitavam, as justificativas dadas pelos governantes para enviar os jovens para lutar “do outro lado do mundo” sem que a segurança nacional estivesse ameaçada.

Outro ponto importante naquela guerra foi a enorme ingerência política sobre as decisões militares, sendo frequentes os casos em que até mesmo situações táticas, por exemplo fornecer apoio de fogo a tropas em contato, exigiam aprovações por instâncias superiores e até mesmo de políticos, com várias missões dependendo de aprovação pessoal do Presidente. Com o processo decisório demorando tanto, e com a decisão muitas vezes tomada por pessoas com pouco ou nenhum conhecimento militar, a eficiência das FA (Forças Armadas) americanas era consideravelmente reduzida, a despeito dos meios disponíveis. O receio de que a China ou a URSS entrassem diretamente no conflito foi um dos principais motivos por trás desse nível de ingerência.

Uma “irmã gêmea” da ingerência política foi a relutância em comprometer os recursos humanos e materiais necessários. Não foram raras as ocasiões em que foram utilizadas forças insuficientes para atingir determinados objetivos, ou que planos que envolvessem grandes forças fossem adiados, rejeitados ou tivessem seu poder diminuído em face de considerações políticas.

Vários países viam a guerra como ilegítima ou desnecessária. Essa falta de consenso internacional era outro motivo que levou à ingerência política, e o receio de evitar cenas como a devastação das cidades causadas pela Segunda Guerra Mundial, eram grandes motivadores da ingerência política e da relutância em comprometer os recursos necessários.

A junção de todos estes fatores levou os EUA a adotarem, por longo tempo, ações de guerra limitada: alguns políticos acreditavam que ações pontuais, sem recorrer a uma grande invasão (como o Dia D) ou ações de destruição das principais cidades norte-vietnaminas (como aconteceu nas “tempestades de fogo” sobre Dresden e Tóquio), ou pelo menos a destruição de alvos estratégicos em Hanói e Haiphong, seriam suficientes para conter o Viet Cong.

Todos sabem a história - a “guerra limitada” levou a um imenso número de baixas entre civis e militares vietnamitas, e também entre militares americanos, além da devastação do país. Ou seja, os efeitos limitados pretendidos não foram alcançados. Ademais, e apesar do tratado de paz assinado por Ho Chi Minh em 1973 (o que é visto como vitória americana, dependendo do ponto de vista), o Vietnã do Sul acabou por ser conquistado pelo Vietnã do Norte em 1975 (o que é visto como derrota americana, dependendo do ponto de vista).

O grande número de baixas americanas, a oposição da população americana à guerra, os grandes custos financeiros do conflito não conseguiram impedir o avanço do comunismo na região - que era, ostensivamente, o que os EUA quiseram evitar com a guerra.




A “DOUTRINA WEINBERGER”

Nos anos 1980, algumas ações militares dos EUA foram duramente criticadas pela população e por especialistas, como a presença dos Marines no Líbano (que terminou com o trágico atentado contra os quartéis americanos em Beirute, em 1983, com a morte de mais de 200 fuzileiros) e a invasão de Granada (um pequeno país no Caribe).

O então Secretário de Defesa, Casper Weinberger, proferiu, durante uma palestra na renomada Academia Militar de West Point em 1984 (ou seja, cerca de 10 anos depois do Vietnã), alguns princípios que deveriam nortear as ações militares americanas. Estes princípios foram depois chamados de “Doutrina Weinberger”, e nortearam as ações militares americanas na segunda metade dos anos 1980.

Resumidamente, a “Doutrina Weinberger” postula:

1. Os EUA não devem enviar tropas, a menos que interesses vitais dos EUA ou de um aliado estejam diretamente ameaçados.

2. Caso se decida por enviar tropas, o apoio deve ser total, ou seja, devem ser garantidos os recursos materiais e humanos para cumprir a missão.

3. Caso se decida por enviar tropas, os objetivos políticos e militares devem ser claramente definidos, e os recursos alocados devem ser grandes o bastante para se atingir estes objetivos.

4. O comprometimento e a capacidade das tropas americanas devem ser avaliadas continuamente, e eventuais ajustes devem ser implementados sempre que necessário.

5. Antes de comprometer as tropas americanas, o povo americano e seus representantes eleitos devem ser assegurados da necessidade e da solidez de tal comprometimento.

6. Este comprometimento deve ser o último recurso, a ser utilizado apenas quando alternativas diplomáticas forem esgotadas.

Com estes princípios em mente, a invasão americana ao Panamá, entre dezembro/1989 e janeiro/1990, foi bastante rápida e com poucas baixas entre os militares americanos. Da mesma forma, os EUA não enviaram tropas ao Afeganistão na sua guerra contra a URSS, mas enviaram dinheiro e armas, emulando o que os soviéticos fizeram contra os EUA nas décadas anteriores.

Mas o maior teste à Doutrina Weinberger viria na década de 1990.




DOUTRINA POWELL

O Gen Powell, Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA durante o governo “Bush Pai”, aprofundou ainda mais os princípios estabelecidos por Weinberger, e os princípios da “Doutrina Powell” ou “Doutrina Weinberger-Powell” nortearam a esmagadora vitória sobre o Iraque na Guerra do Golfo (1990-1991).

Nas palavras do próprio Powell, constantes no documento “Estratégia Militar Nacional dos EUA”, publicado cerca de 1 ano depois da Guerra do Golfo:

Uma vez tomada a decisão pela ação militar, meias medidas e objetivos confusos cobram um preço elevado na forma de um conflito prolongado que pode causar desperdício desnecessário de vidas humanas e recursos materiais, uma nação dividida em casa e derrota. Portanto, um dos elementos essenciais de nossa estratégia militar nacional é a capacidade de reunir rapidamente as forças necessárias para vencer - o conceito de aplicar força decisiva para subjugar nossos adversários e, assim, encerrar conflitos rapidamente com perda mínima de vidas.

Powell dizia que o alto comando civil e militar deveria responder a 8 perguntas antes de se comprometer com o envio de tropas:

1 Algum interesse vital está ameaçado?

2 Há um objetivo claro e alcançável?

3 Os riscos e custos foram analisados com franqueza?

4 Os meios não violentos já foram totalmente esgotados?

5 Há uma estratégia de saída plausível para evitar que a guerra se arraste indefinidamente?

6 As consequências de nossas ações foram cuidadosamente avaliadas?

7 A guerra é apoiada pelo povo americano?

8 Há um apoio internacional amplo e genuíno?

Comparando-se a Doutrina Powell com a Doutrina Weinberger, além das grandes semelhanças, observa-se também um cuidado essencial - não entrar em conflitos que se arrastem indefinidamente. A Guerra do Vietnã tinha sido, até aquele momento, o conflito mais prolongado em que os EUA estiveram envolvidos com o envio de tropas, e esses estrategistas queriam, a todo custo, evitar um “novo Vietnã”.

Outro exemplo claro da aplicação destes princípios foi a Guerra dos Bálcãs , mais especificamente a Guerra de Kosovo de 1999, em que a OTAN se limitou a praticamente usar o poder aéreo, com pouco envolvimento de tropas em terra.




ABANDONO DA DOUTRINA POWELL

O Século 21 trouxe consigo o 911 (ataques terroristas do 9 de setembro de 2001) e a GWOT (guerra mundial contra o terrorismo), que levariam a um abandono dos princípios delineados por Powell. O resultado foram guerras bastante prolongadas no Afeganistão (2001) e no Iraque (2003), que se arrastam até hoje; cada uma delas ultrapassou o Vietnã, e a Guerra do Afeganistão já é a mais prolongada da história americana.

Um dos principais fatores que levaram à derrota dos EUA na GWOT - o terrorismo não foi erradicado, afinal - é justamente o fato de o objetivo ser vago e inatingível. Como o terrorismo é causado por diversos fatores, não é uma guerra, ou várias, que vai eliminar o problema. Junte-se a isso o fato que  nem o Presidente “Bush Filho” nem o Presidente Obama deram aos militares todos os recursos que foram pedidos, complicando ainda mais a situação.

Aliás, cabe aqui um parêntese interessante - da mesma forma que a URSS na década de 1980, os EUA se prepararam mal contra o Afeganistão, fazendo valer, outra vez, o apelido “Cemitério de Impérios”.

Obama complicou ainda mais a situação ao anunciar unilateralmente a saída do Iraque, sem alcançar com isso nenhum resultado tangível dos insurgentes, e ao enviar tropas, ainda que em quantidades reduzidas, para a Síria - e isso depois de não cumprir a promessa de atacar a Síria caso o país usasse armas químicas.




RETORNO À DOUTRINA POWELL

O Presidente Trump, por sua vez, parece determinado a voltar à Doutrina Powell. Além de retirar as tropas da Síria e anunciar o fim da Guerra do Afeganistão (depois de costurar um acordo com os Taleban), já prepara a saída do Iraque, condicionando-a a obter vantagens financeiras do país.

É digno de nota que o Presidente Trump também não começou nenhuma guerra, mas não deixou de atacar o Irã depois de um ataque à embaixada americana em Bagdá, um total contraste com o Presidente Obama, que nada fez em relação a 4 americanos mortos na embaixada da Líbia.

O Presidente Trump também realizou alguns ataques contra a Síria e o Irã, mas tem sido cauteloso o bastante para não começar uma guerra aberta com estes países.

Duas ferramentas tem sido essenciais para esses 3 últimos Presidentes dos EUA - ataques com mísseis de cruzeiro (como o BGM-109 Tomahawk) e com drones (como o MQ-9 Reaper). Apesar das críticas pelo uso destes meios, ficou evidente que nenhum país está disposto a começar uma guerra aberta contra os EUA devido a tais ataques de escopo limitado, o que está de acordo com a Doutrina Powell - usar os meios necessários para atingir os objetivos em mente. É provável que, se tais meios não estivessem disponíveis, os EUA teriam que recorrer a ataques mais expressivos, como os da Operação El Dorado Canyon de 1986 contra a Líbia.

Outra ferramenta bastante utilizada, desde a Segunda Guerra Mundial, são as operações de forças especiais, seja em ataques diretos, seja através de insurgentes.




ISRAEL E A DOUTRINA POWELL

Não é segredo pra ninguém que Israel se inspira militarmente nos EUA. Tanto é assim que as IDF (Forças Israelenses de Defesa) tentaram imitar a postura americana na Guerra de Kosovo de 1999, com o objetivo de derrotar o Hizballah sem enviar tropas ao Líbano em 2006. O assunto é tratado com mais detalhes no artigo Segunda Guerra do Líbano (2006).

Embora o Hizballah fosse, e continue sendo, uma grande ameaça aos interesses vitais de Israel e não seja muito aberto a negociações diplomáticas, dando poucas alternativas à intervenção militar, o Primeiro Ministro Ehud Olmert não foi capaz de articular objetivos claros e alcançáveis (o objetivo de erradicar o Hizballah era, e é, inatingível por meios puramente militares) e nem se propôs a dar às IDF os meios necessários para atingir os objetivos - o envio de tropas terrestres foi postergado várias vezes, um sinal claro de que o governo israelense não estava comprometido com a guerra que começou.

Entretanto, o Hizballah seguiu atacando o norte de Israel a um ritmo de mais de 100 foguetes por dia, levando a um colapso econômico na região, e vários protestos populares contra o governo e às IDF. O fato que as próprias IDF relutavam em enviar tropas, apesar de a situação claramente exigir tal atitude, complicou ainda mais a situação, e a guerra se arrastou por 33 dias, terminando após ambos os lados aceitarem a intermediação da ONU.

A vitória israelense no Líbano, assim como a vitória americana no Vietnã, não foi inquestionável. A destruição no Líbano foi muito grande e o Hizballah praticamente parou os ataques contra Israel, situação que se mantém até hoje, 14 anos depois, e isso claramente conta a favor de Israel. Entretanto, o alto comando do Hizballah permaneceu praticamente intocado, e seu poder, tanto militar quanto na política interna do Líbano, são maiores do que em 2006, o que conta como derrota para Israel.

Após a guerra, e como é de costume em Israel, foi estabelecido um Comitê para fazer uma investigação, que em vários aspectos se assemelha a uma CPI, liderada pelo Ministro da Suprema Corte Israelense (aposentado) Eliyahu Winograd. O relatório deste Comitê, geralmente chamado Relatório Winograd, foi bastante duro com o alto comando militar e político do país, e suas conclusões e recomendações lembram vários pontos da Doutrina Powell.

As IDF aprenderam as lições do Relatório Winograd. Já no final de 2008, pouco mais de 2 anos após a performance questionável no Líbano, Israel atacou o Hamas em Gaza, a chamada Operação Chumbo Fundido, uma das várias campanhas contra o regime no poder na Faixa de Gaza. Desta vez, os objetivos israelenses foram muito bem definidos (principalmente reduzir a escala dos lançamentos de foguetes e morteiros contra a região sul de Israel) e as tropas em terra foram enviadas tão logo os ataques aéreos “amaciaram” as defesas do Hamas.

O resultado foi uma guerra muito mais rápida, durando apenas 21 dias, e durante esse tempo o Hamas causou poucos danos a Israel. A guerra terminou através de uma decisão unilateral do Alto Comando israelense, e os graves danos ao alto comando do Hamas, e à infraestrutura da Faixa de Gaza, impediram que o Hamas pudesse clamar alguma vitória.

Depois da Chumbo Fundido, porém, Israel teve que enfrentar o Hamas outras vezes, em 2012 (Operação Pilar de Defesa) e 2014 (Operação Margem Protetora), mas da mesma forma que em 2008-2009, a vitória israelense foi incontestável.

Depois de 2014, apesar das tensões com o Hamas e principalmente o Irã, Israel não se envolveu em conflitos maiores. Até mesmo ataques vindos da Síria, provavelmente “balas perdidas” da sangrenta guerra civil que assola o país desde 2011, não levaram a uma guerra aberta contra o país, com Israel se limitando a fazer ataques pontuais.

Aliás, novamente “imitando” os EUA, as IDF também usam bastante dos mísseis de cruzeiro (como o Delilah) e drones (como o Eitan) para realizar boa parte dos ataques limitados. Israel também é grande usuário das forças especiais, e através delas realizam ataques diretos ou com apoio de insurgentes.




CONCLUSÃO

A Doutrina Powell, de certa forma, não é mais que usar o bom senso antes de uma operação militar, seja ela grande ou pequena.

Objetivos claramente definidos, estratégia de saída claramente definida, comprometimento dos recursos humanos e materiais necessários, apoio interno e externo assegurado - pode parecer óbvio que tudo isso é essencial, mas qualquer um que estude a história dos conflitos da humanidade ficará chocado ao ver quantas vezes algum, ou até mesmo todos estes pontos foram tratados com desdém.

Parece que os EUA estão lembrando a lição que aplicaram tão bem em 1991, e Israel claramente aplica a Doutrina ao pé da letra, não sem antes sofrer por ignorar seus preceitos.

Felizmente, o Brasil raramente se envolve em conflitos, mas as lições da Doutrina Powell ainda devem ser incorporadas, especialmente para ações como as GLO (Garantia da Lei e da Ordem), que em vários aspectos é uma guerra: definir objetivos, alocar recursos, comprometer-se com o comando da operação quando houver atrito com a opinião pública - são tão importantes aos envolvidos na execução de uma operação GLO como nos campos de batalha ao redor do mundo.


Por Renato Marçal



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O articulista cedeu gratuitamente o artigo como colaboração na divulgação do conhecimento e arte militar...


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sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Invisibilidade & Furtividade: A gênese da tecnologia stealth

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A ideia original de prover invisibilidade aos ativos militares, – particularmente belonaves -, no campo de batalha, nasceu com o chamado Projeto Philadelphia, durante a Segunda Guerra Mundial. De modo diverso de seu congênere, o Projeto Manhattan (que logrou desenvolver e construir a bomba atômica), o Projeto Philadelphia, após consumir muitos milhões de dólares (alguns bilhões de dólares em moeda de 2018), não obteve qualquer êxito operacional, tendo sido definitivamente abandonado logo após o término do conflito mundial para, somente em tempos mais recentes, ter sido retomado, ainda assim a partir de premissas científicas completamente diferentes daquelas originalmente formuladas.

Em seu lugar, entretanto, logo no início da década de 1950, – com ênfase não mais em navios de guerra, mas em aeronaves militares, em decorrência da negativa soviética de aceitar a proposta estadunidense de “política de céus abertos” -, nasceu a ideia (original) da furtividade, uma concepção diametralmente diversa, uma vez que associada não propriamente à questão da proteção contra a visibilidade ótica, mas sim relativa à defesa contra a detecção eletrônica, notadamente realizada por equipamentos de radar, o que se convencionou chamar de “invisibilidade relativa”.
O ineditismo dessa nova (e revolucionária) tecnologia acabou por lhe assegurar não somente uma denominação especial, mas, mais do que isto, um conceito próprio e específico na Polemologia (Ciência da Guerra), com a denominação genérica de “tecnologia stealth”.
USS Eldridge utilizado nos experimentos do "Projeto Philadelphia" 
A necessidade de se conceber uma tecnologia inovadora de invisibilidade relativa das aeronaves, em relação aos radares e aos demais meios de detecção, nasceu originariamente no final da década de 1950 (em relação, sobretudo, aos aviões de reconhecimento estratégico), acentuando-se, particularmente, durante os anos 1960, quando ficou claro, para as autoridades militares norte-americanas, que o contínuo avanço no desenvolvimento da tecnologia de mísseis antiaéreos (SAM- Surface Air Missile) acabaria por suplantar todas as contra-tentativas estadunidenses de projetar e construir aeronaves que voassem, cada vez com melhor desempenho, em altitudes extremamente elevadas (superiores a 25.000 metros) e em velocidades cada vez maiores (acima de Mach 3.0), e mesmo de desenvolver toda sorte de técnicas de interferências eletrônicas nos radares adversários.
O U-2 enfrentou seu algoz soviético, o SA-2 Guideline
A destruição de uma sofisticada aeronave de reconhecimento estratégico U-2, em 1960 , por um míssil soviético SA-2 Guideline, nos céus da União Soviética, – ainda que não tenha convencido completamente parte da elite militar norte-americana sobre a necessidade de tornar suas aeronaves relativamente invisíveis aos radares -, acendeu a luz amarela quanto aos limites do desenvolvimento de aeronaves de altíssima performance (seja no que concerne ao teto operacional, seja ao que alude a elevadíssimas velocidades).
Ainda assim, projetou-se e construiu-se protótipos do caça interceptador YF-12 (dotado de mísseis ar-ar de extrema sofisticação que, mais tarde, viabilizaram a construção e o desdobramento do AIM-54 Phoenix para o caça F-14 Tomcat); fabricou-se o lendário avião de reconhecimento estratégico SR-71 Blackbird (dotado de capacidade de voar, em situações extremas, a até 36.000 m de altitude e a Mach 3.2; não obstante o seu teto operacional fosse de 25.000 m e sua velocidade se situasse em torno de Mach 3), que se tornou operacional entre 1966 e 1999; e concebeu-se o incrível bombardeiro estratégico B-70 Valkyrie, uma aeronave projetada para voar em elevadíssimas altitudes (entre 25 e 30.000 metros) e a uma velocidade superior a Mach 3 (supostamente invulnerável aos mais sofisticados mísseis de defesa aérea e a caças interceptadores soviéticos de última geração, ainda em fase de projeto), mas que, entretanto, jamais entrou em operação, tendo sido substituído pelo projeto do bombardeiro B-1A, dotado, – em uma verdadeira reviravolta de toda a concepção estratégica que perdurou até o final da década de 1960 -, de uma capacidade (inversa) de penetração com reduzida imagem de radar (Radar Cross Section – RCS) e em baixíssimas altitudes (voando, como se costumava afirmar à época, “sobre a copa das árvores”), combinada com altas velocidades relativas, próximas a Mach 1.2, considerando a reconhecida incapacidade, naquele momento histórico, de se detectar (e, particularmente, “travar” no alvo) aviões voando a baixas altitudes, próximas ao solo ou ao mar.
 B-1 Lancer: era duvidosa sua sobrevivência em céus soviéticos.
Com o rápido desenvolvimento de radares cada vez mais sofisticados, – inclusive com a surpreendente capacidade soviética de copiar, já no final dos anos 1960, um radar semelhante ao utilizado, pela primeira vez, no F-4 Phantom II (do tipo lock down shot down), em seu interceptador de altíssima velocidade Mig 25 Foxbat (Mach 2.8) -, toda a concepção, tanto a apresentada pelo B-70 Valkyrie como pelo B-1A (e mesmo pela sua versão aprimorada B-1B Lancer, provida de menor velocidade, – Mach 1.2 em comparação com a Mach 2 da versão original -, mas com maior carga bélica, – 60 ton versus 51 ton da versão primitiva -, e melhor habilidade de penetração a baixa altitude) tornou-se obsoleta, criando, finalmente, uma unanimidade, dentre os principais líderes militares norte-americanos, quanto à necessidade de meios que anulassem (em definitivo) a capacidade de detecção das aeronaves militares norte-americanas; ou seja, a tecnologia stealth.
Posteriormente, e em necessária adição, uma ampla reflexão sobre as elevadas perdas de meios aéreos na Guerra do Vietnã apenas reforçou o convencimento das autoridades estadunidenses, disparando um verdadeiro “alerta vermelho” no Pentágono quanto à imprescindibilidade do desenvolvimento e aprimoramento da tecnologia stealth (e a correspondente criação de aeronaves de 5ª geração), posto que, de uma certa forma, a eficiência operacional dos sistemas defensivos soviéticos “jogava por terra” toda a estratégia militar de contenção (através do estabelecimento de uma nítida superioridade aérea) em uma eventual (e hipotética) guerra na Europa contra as forças do Pacto de Varsóvia (expressivamente superiores em efetivos e blindados) e que, agora, dotadas de múltiplos sistemas SAM, simplesmente poderiam (potencialmente) anular a capacidade ocidental de implantar o imperioso “domínio dos céus” no campo de batalha.

Por: Reis Friede é Desembargador Federal, Professor Emérito da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) e Professor Honoris Causa da Escola de Comando e Estado-Maior da Aeronáutica (ECEMAR).
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