A Política Nacional de Defesa, atualmente em aprovação no Congresso Nacional, estabelece o Atlântico Sul e os países da costa ocidental da África como áreas de interesse prioritário para o Brasil. Nesse entorno estratégico existem riscos e ameaças que demandam o incremento da segurança e da defesa, além do fortalecimento de ações voltadas para a manutenção da estabilidade regional e a construção de um ambiente internacional de cooperação entre os países.
A atuação da Marinha do Brasil (MB) nesta área representa um instrumento essencial para a prevenção e a resolução pacífica de eventuais conflitos, desenvolvendo um ambiente cooperativo com as marinhas, guardas costeiras e órgãos de segurança dos países africanos.
As relações do Brasil com os Estados da região têm sido fundamentadas no diálogo e no intercâmbio de experiências, mesmo em um contexto geopolítico cada vez mais dinâmico e desafiador. A criação de fóruns, como a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS) são alguns exemplos dessas interações.
Golfo da Guiné
Uma das regiões que compõem o entorno estratégico brasileiro, o Golfo da Guiné é constituído por: Costa do Marfim, Gana, Togo, Benim, Nigéria, Camarões, Guiné Equatorial e Gabão. Também fazem parte desse espaço geográfico as ilhas Bioko e Ano Bom (Guiné Equatorial), além das ilhas de São Tomé e Príncipe. A proximidade com o território nacional e o fato de ser um dos corredores de comércio internacional aumentam a importância dessa área para o Brasil.
A presença da Nigéria nesse contexto confere maior relevância econômica para o Golfo da Guiné, uma vez que o país é detentor da economia mais sólida do continente africano, sendo o maior produtor de petróleo e o que possui a maior densidade populacional da região.
Segundo o relatório do “International Maritime Bureau” da Câmara de Comércio Internacional de 2021, nos últimos anos, o Golfo da Guiné apresenta os maiores índices de pirataria do mundo. Uma das principais ações praticadas é o roubo de petróleo, quando criminosos utilizam navios sequestrados como “navios-mães” para atacar outras embarcações. O posterior pedido de resgate de navios e de membros da tripulação envolve o pagamento de elevadas quantias em dinheiro. Outros ilícitos que ocorrem com frequência são: tráfico de armas, terrorismo, tráfico de drogas e de pessoas, pesca ilegal e crimes ambientais.
A insegurança no mar dificulta, inclusive, ações de fiscalização da pesca e de repressão aos crimes ambientais. A presença da MB nessa área marítima representa, portanto, uma importante contribuição ao fortalecimento da cooperação regional e ao desenvolvimento de políticas mais eficazes.
Adidâncias na África
Atualmente, o Brasil possui oito adidâncias no continente africano (ver quadro). Os adidos militares são agentes públicos que representam o País nas relações internacionais. Dentre as diversas funções que exercem, está o apoio à política externa, por meio do relacionamento internacional de defesa e a colaboração na divulgação dos produtos da Base Industrial de Defesa brasileira. O Brasil também possui acreditações (competências extensivas das adidâncias) em Benim e Togo, São Tomé e Príncipe, Gana e Marrocos.
No Senegal, a adidância representa o Ministério da Defesa e os três Comandos de Força (Marinha, Exército e Aeronáutica). Uma das funções é contribuir para o alcance dos Objetivos Nacionais de Defesa, no que se refere à busca de confiança mútua, à colaboração nos interesses comuns e à cooperação em assuntos de Segurança e Defesa.
O Acordo de Cooperação entre Brasil e Senegal foi assinado em 2010 e, de acordo com o Adido no Senegal, Benim e Togo, um dos principais objetivos da parceria, atualmente, é a promoção de ações conjuntas de treinamento e instrução militar.
Desde 2016, 62 militares senegaleses foram graduados ou estão em formação em organizações militares de ensino da MB. Neste ano, 32 militares estão realizando cursos em escolas de formação brasileiras, sendo sete Aspirantes na Escola Naval, dois Sargentos no Centro de Instrução Almirante Sylvio de Camargo e um Sargento no Centro de Instrução e Adestramento Almirante Áttila Monteiro Aché.
Missões de Assessoria Naval
A MB colabora com os Estados lindeiros da África Ocidental, por meio de cooperação técnica e militar naval concretizada pelas Missões de Assessoria Naval na Namíbia, São Tomé e Príncipe e em Cabo Verde. Também há Grupos de Assessoramento Técnico de Fuzileiros Navais na Namíbia e em São Tomé e Príncipe.
Criada em 2006, a Missão de Assessoria Naval na Namíbia é integrada por 13 militares da MB, que prestam assessoria militar, técnica e administrativa e contribuem para a estruturação e crescimento da Marinha Namibiana.
Ainda na Namíbia, foi criado, em 2009, o Grupo de Assessoramento Técnico de Fuzileiros Navais, que hoje conta com um efetivo de dez militares brasileiros prestando assessoria militar, técnica e administrativa ao Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais namibiano. Os militares também assessoram na condução dos cursos de formação de soldados, na especialização de infantaria, na instrução do curso de operações especiais e na implantação e execução de outros treinamentos de interesse daquele país.
Em Cabo Verde, as missões tiveram início em 2014. Atualmente, há seis militares brasileiros contribuindo para a estruturação e o crescimento da Guarda Costeira Cabo-verdiana.
A atuação dos militares da MB em São Tomé e Príncipe também teve início em 2014. No momento, seis militares cooperam com a formação da Guarda Costeira daquele país. Há ainda um Grupo de Assessoramento Técnico que conduz o curso de especialização em infantaria, supervisiona a formação de soldados Fuzileiros Navais e coopera para a estruturação da unidade de Fuzileiros Navais santomenses. Segundo o Chefe da Missão de Assessoria Naval em São Tomé e Príncipe, a missão fortalece as relações diplomáticas do Brasil, bem como potencializa as relações comerciais brasileiras.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Cooperação e Comunidades, que também acumula a pasta de Ministro da Presidência do Conselho de Ministros e dos Assuntos Parlamentares, Gareth Guadalupe, destaca o crescimento econômico santomense como resultado da parceria entre os dois países. “Para um país que possui uma Zona Econômica Exclusiva 160 vezes maior do que seu território terrestre, torna-se muito importante a permanência da Missão Naval Brasileira, que muito contribui para a formação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais da Guarda Costeira. Queremos contar com o Brasil, igualmente, em outras áreas de formação. Para nós, é muito importante a presença dos navios da Marinha do Brasil no mar territorial santomense, pois isso mostra que São Tomé e Príncipe é um local seguro. Daí, temos um aumento do turismo e do comércio”, afirmou o Ministro durante visita à Fragata “Liberal” em agosto de 2023, por ocasião da “GUINEX III”.
Camarões
Ainda na busca pelo aprimoramento da segurança do tráfego marítimo no Golfo da Guiné e no restante da costa ocidental africana, foi assinado, em 2018, um acordo de cooperação entre a MB e a Marinha Nacional de Camarões, estabelecendo o compartilhamento de informações sobre o tráfego marítimo. Em função desse compromisso, a Força Naval Brasileira mantém um representante permanente no Centro Inter-regional de Coordenação naquele país.
Operações Navais
A cada ano, a MB tem ampliado sua presença na África por meio de operações e parcerias estratégicas, buscando diminuir a insegurança marítima no Atlântico Sul. São oferecidos cursos e treinamentos para militares de países africanos em academias militares brasileiras e a Força atua em exercícios navais com países daquele continente.
Por meio de operações como a “Obangame Express”, “GUINEX”, “Grand African NEMO” e “IBSAMAR”, entre outras, a MB contribui para garantir a segurança e a proteção das fronteiras marítimas brasileiras, atuando de forma proativa na prevenção e no combate a ameaças que podem colocar em risco as atividades relacionadas ao uso do mar. Além disso, as operações proporcionam a troca de experiências entre militares, incrementam a interoperabilidade entre as marinhas e guardas costeiras amigas e estreitam os laços de cooperação e amizade entre os países.
Os exercícios militares realizados capacitam as marinhas e guardas costeiras dos países da Costa Oeste da África a desenvolverem ações que contribuem para a segurança marítima, combatendo a pirataria, o sequestro de pessoas, o contrabando, o tráfico de armas e de drogas, além da pesca ilegal, e em prol de atividades benignas, como as operações de socorro e salvamento.
A terceira edição da Operação “GUINEX”, liderada pela MB, ocorreu de agosto a setembro deste ano, quando a Fragata “Liberal” deixou o porto de Mindelo, em Cabo Verde. Além do navio, participaram da missão um Destacamento de Mergulhadores de Combate e uma aeronave UH-12 Esquilo.
Os militares brasileiros realizaram exercícios conjuntos, no porto e no mar, com as marinhas e guardas costeiras de Cabo Verde, Camarões, Costa do Marfim, Nigéria, São Tomé e Príncipe e Senegal. Também participaram as Marinhas da Espanha, Estados Unidos, Portugal e Reino Unido em treinamentos, como técnicas de abordagem, visita e inspeção a navios, manobras de embarcações rápidas, trânsito sob ameaças assimétricas e técnicas de operações especiais.
Já a Operação “Grand African NEMO” ocorre desde 2019, sob a coordenação da Marinha Nacional da França. Nela, há visitas operativas aos portos de Walvis Bay, na Namíbia; de Luanda, em Angola; de Lomé, no Togo; e de Abidjan, na Costa do Marfim. Os exercícios no mar iniciaram em 9 de outubro, na região litorânea de Angola, da República do Congo e da República Democrática do Congo – nas águas jurisdicionais dos países integrantes da Área Alfa da Arquitetura de Yaoundé, conforme dispõe o Tratado de Yaoundé – e encerrarão com uma demonstração operativa no mar em 19 de outubro, no Togo.
A criação da Arquitetura de Yaoundé é uma iniciativa regional para o enfrentamento da insegurança marítima no Golfo da Guiné. O código prevê mecanismos e protocolos para a atuação das marinhas, guardas costeiras e outras estruturas de segurança no Golfo da Guiné, tanto dos países da região como dos Estados que lá empregam esforços no combate aos crimes ocorridos no mar. A MB participará desta operação com o Navio-Patrulha Oceânico “Amazonas”, que desatracou da Base Naval do Rio de Janeiro em 13 de setembro, rumo ao continente africano.
A “Obangame Express” é outro importante exercício realizado no Golfo da Guiné, e sua última edição ocorreu em janeiro deste ano, contando com a participação de 33 países. Conduzido pelos Estados Unidos desde 2014, o exercício contou com a participação das Marinhas de Angola, Brasil, República do Congo e República Democrática do Congo. O Navio-Patrulha Oceânico “Araguari” participou do exercício realizando atividades de diferentes níveis de complexidade, como simulação de cenários de tráfico de pessoas, imigração ilegal, tráfico de armas e drogas, pesca ilegal, sequestro, pirataria, poluição ambiental e busca e salvamento.
Mais um exemplo do incremento da capacidade de operação conjunta e da consolidação dos laços de amizade entre a MB e as marinhas e guardas costeiras da costa ocidental africana é a “UNITAS”. A última edição da operação ocorreu no Brasil, especialmente para compor as celebrações do Bicentenário da Independência e da Esquadra Brasileira. Na ocasião, as marinhas da República da Namíbia e da República dos Camarões atravessaram, pela primeira vez, o Atlântico Sul em direção ao Rio de Janeiro, para participar da missão.
Para o Capitão de Mar e Guerra Simon Kombada, Comandante do Navio “NS Elephant”, Capitânia da Marinha da Namíbia, participar da “UNITAS” teve uma importância dupla. “Em primeiro lugar, a nossa participação elevou o moral da tripulação e nos garantiu confiança. Em segundo, aprimorou a proficiência tática, capacidades e maior interoperabilidade, bem como mostrou a competência que a Marinha da Namíbia pode ter ao participar de um exercício conjunto com outras marinhas”, explicou.
ZOPACAS
Criada em 1986 por meio da Resolução 41/11 da Organização das Nações Unidas, a ZOPACAS é fruto de uma iniciativa do Brasil, apoiada pela Argentina. O intuito é promover a cooperação regional, além de manter a paz e a segurança no entorno dos 24 países-membros, com litoral no Atlântico Sul.
A atuação da MB no fórum vai além do papel de participante. A Força Naval brasileira promove debates em torno das questões marítimas relacionadas ao Atlântico Sul, a exemplo do “I Seminário ZOPACAS - Segurança e Vigilância do Tráfego Marítimo, Busca e Salvamento”, realizado em 2013.
O mais recente encontro da ZOPACAS ocorreu em abril deste ano, na cidade de Mindelo, em Cabo Verde. Um dos resultados da “VIII Reunião Ministerial da ZOPACAS” foi a definição de parcerias em áreas como ciência e tecnologia, educação, meio ambiente, fortalecimento das instituições nacionais, economia, transporte, diálogo político, entre outras.
Durante o evento, o Chefe do Estado-Maior da Armada da MB destacou a relevância de ações voltadas para o incremento da segurança marítima e do desenvolvimento socioeconômico no entorno estratégico do Brasil. “A recente instabilidade causada pelos atos de pirataria no Golfo da Guiné exige a cooperação, a troca de experiências e ações de presença entre os países amigos da região, pois o Atlântico Sul possui enorme potencial a ser explorado e inúmeras ameaças relacionadas”, afirmou.
Em 25 de outubro deste ano, a MB realizará o 2º Simpósio Marítimo da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, com o tema “ZOPACAS - Fortalecendo a Cooperação Marítima e a Segurança no Atlântico Sul”. O evento será realizado no Brasil e contará com a participação de palestrantes da África do Sul, Angola, Brasil, Cabo Verde e Nigéria. Outras informações podem ser obtidas no site do simpósio.
Fonte: Marinha do Brasil
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