sábado, 4 de julho de 2020

Pequenas e letais - a revolução das 'mini PGM'


As primeiras PGM (munições guiadas de precisão, 'armas inteligentes') surgiram na Segunda Guerra Mundial, mas dificuldades técnicas impediram seu uso generalizado até a Guerra do Vietnã.

Entretanto, foi na Guerra do Golfo de 1991 que as PGM tiveram impacto realmente decisivo. Armas como a monstruosa Paveway GBU-28 de 5 mil libras (cerca de 2.260 kg) foram essenciais na destruição das forças iraquianas.
 A monstruosa GBU-28 é uma bomba de mais de 2 toneladas e 5,7 metros de comprimento; mesmo o grande F-111 só podia carregar duas dessas armas
As PGM cresceram tanto de importância, especialmente nas guerras modernas onde reduzir o dano colateral é cada vez mais importante, que em operações recentes as PGM foram usadas em quase 100% das missões. [1]

O IMPACTO DOS DRONES


Os 'drones' (VANT - Veículos Aéreos Não-Tripulados, ARP, RPA, UAV) surgiram mais ou menos na mesma época que as PGM, e foi também na Guerra do Vietnã que começaram a ter maior impacto, sendo que, atualmente, o uso maciço de drones é feito até por players como o Houthis.

No começo do Século 21, os EUA estudavam formas de usar os drones mais extensivamente, e um dos primeiros obstáculos encontrados foi justamente armar as pequenas aeronaves - de modo geral, os drones são menores e mais leves que as aeronaves táticas, o que impõe sérias restrições às cargas que podem levar.

A USAF se deparou com este problema ao fazer testes com o drone RQ-1 Predator - a menor PGM no seu inventário era a GBU-12, uma LGB (bomba guiada a laser) de 500 libras (cerca de 227 kg) da família Paveway (feitas pela Raytheon), que ainda assim era mais que o Predator podia carregar.

Uma rápida busca nos inventários dos demais ramos das FFAA (Forças Armadas) americanas apontou para o AGM-114 Hellfire, um ATGM (míssil guiado antitanque) já em uso pelo US Army (Exército dos EUA) e USMC (Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA).
 Soldados do US Army carregando um Lockheed Martin AGM-114 Hellfire num AH-64 Apache; o AH-64 pode levar até 16 dos pequenos mísseis. Observe-se o pequeno tamanho (1,8 m de comprimento e 18 cm de diâmetro) e pequeno peso (cerca de 45 kg) do míssil
O Hellfire usa guiagem SAL (laser semi-ativo), como as Paveway, mas pesa apenas 100 libras (cerca de 45 kg), permitindo que o MQ-1 Predator (RQ-1 modificado para carregar armas) leve um Hellfire sob cada asa. O Hellfire tem um alcance de cerca de 8 km.
 General Atomics RQ-1 Predator com um míssil AGM-114 Hellfire sob cada asa. Esta combinação se provou bastante eficiente em lugares como Afeganistão e Iraque
A combinação Predator + Hellfire chegou bem a tempo de ser amplamente utilizada na GWOT (Guerra Mundial Contra o Terror) que se seguiu ao 11 de setembro (ataques terroristas de 2001). 

Mas isso era apenas o começo.


OUTRAS MINI PGM

Embora o Hellfire ainda seja importante como arma de drones, outras mini-PGM vem ganhando espaço, inclusive em aeronaves 'tradicionais'.
 Uma das vantagens das mini PGM é o aumento do poder de fogo - um Boeing F-15E, limitado a 5 GBU-31 de 2 mil libras (alto), pode levar pode levar 20 SDB + 2 drop tanks (baixo) permitindo que mais alvos sejam atacados na mesma missão
Algumas PGM muito avançadas foram introduzidas nas últimas décadas, e outras seguem em desenvolvimento.

Uma dessas é a Boeing GBU-39 SDB (bomba de pequeno diâmetro), uma pequena bomba de 1,8 m de comprimento, 18 cm de diâmetro (tal como o Hellfire) e peso de 250 libras (cerca de 113 kg), mas ainda tem um alcance superior a 70 km, graças a suas asas integradas. A SDB foi desenvolvida especificamente para uso a partir do pequeno paiol interno de armas do F-22, junto com um suporte quádruplo ('quad pack') BRU-61. A SDB foi desenvolvida para igualar a capacidade perfurante da BLU-109 de 2 mil libras (cerca de 907 kg) dos anos 1980.
Apesar de pequena, a SDB tem excelente capacidade perfurante
Um BRU-61 carregado com 4 SDB pesa 1460 libras (cerca de 670 kg), comparável às 1013 libras (cerca de 460 kg) da Boeing GBU-32, uma JDAM (munição conjunta de ataque direto) que usa o mesmo sistema de guiagem EGI (INS / sistema de navegação inercial combinado com GNSS / sistema de navegação global com satélites). A GBU-32 é a maior arma que pode ser levada no paiol de armas do F-22.
 GBU-39 SDB e o quad pack no suporte BRU-61
A 'irmã' da SDB é a Raytheon GBU-53 SDB2 Stormbreaker. Ela emprega uma configuração diferente da SDB - corpo e ogiva sem as mesmas capacidades perfurantes, mas ainda eficientes, e um sistema de guiagem que combina EGI com um sensor triplo - SAL, IIR (imagens infra vermelhas) e MMW (radar de onda milimétrica). É compatível com o BRU-61.
 Raytheon GBU-53 Stormbreaker
O Hellfire está sendo substituído pelo Lockheed Martin AGM-179 JAGM (míssil ar-solo conjunto), de dimensões e pesos semelhantes, mas que usa um sensor triplo como o do SDB2. O JAGM pode alcançar alvos a mais de 20 km.
 Maquete do Lockheed Martin AGM-179 JAGM
Não são só os EUA que desenvolvem mini PGM. O Reino Unido desenvolve o MBDA Brimstone, parecido com o JAGM, mas com guiagem apenas SAL e MMW.

A MBDA também desenvolve o SPEAR 3 (efeitos selecionados de precisão a longo alcance), combinando o sensor do Brimstone com um motor turbojato, permitindo-lhe atingir alvos a mais de 100 km. Uma versão EW (guerra eletrônica) está em desenvolvimento.
 O míssil de cruzeiro MBDA SPEAR 3 (alto) é parecido, externamente, com a GBU-53; uma variante de EW (baixo) está nos planos da MBDA
Mas mesmo armas como JAGM, Brimstone, Stormbreaker e SPEAR 3 são relativamente grandes para vários drones, o que levou ao desenvolvimento de PGM ainda menores.


PGM CADA VEZ MENORES

Quando a USAF procurou por armas ainda menores, tanto para armar drones como para aumentar o poder de fogo das plataformas atuais, voltou-se a programas como o Raytheon AGM-176 Griffin. O Griffin é um míssil bastante pequeno e compacto, pesando 15 kg e 1,10 m de comprimento. O Griffin é lançado a partir de um CLT (tubo comum de lançamento), que também pode ser usado para disparar outras armas. Seu alcance é comparável ao do JAGM [15]
 O Griffin é tão compacto que 4 deles podem ser facilmente lançados a partir de um Humvee
O CLT é compatível não apenas com o Griffin, mas com diversas outras armas. Uma delas, que está ganhando admiração pelas Forças Especiais dos EUA, é a Dynetics GBU-69 SGM (munição planadora compacta). Apesar de pesar cerca de metade do Hellfire, facilitando assim seu uso a partir de drones, a SGM tem alcance superior e ogiva maior, respectivamente 16 kg e 40 km.
 Dynetics GBU-69 SGM
Outra arma em desenvolvimento na Europa, e cuja foto já apareceu na abertura deste artigo, é a LMM (munição leve multifunção), que é desenvolvida pela Thales e Leonardo, e que conta com apoio americano da Textron. A versão com motor foguete é a Martlet, com dimensões semelhantes aos foguetes Hydra.
 O LMM é tão pequeno que até um drone leve como o Schiebel Camcopter S-100 pode levar um de cada lado
Uma versão do Martlet sem propulsão é oferecido pela Textron, o Fury, que é uma bomba planadora. 3 Fury podem ser instaladas num suporte para 1 Hellfire.
 Três bombas Textron Fury podem ser levadas num sporte triplo, ocupando o mesmo espaço e peso que um Hellfire
Mas a mini PGM que parece ter maior potencial é a Northrop Grumman Hatchet, ainda em desenvolvimento. Ela é tão pequena que é possível levar 3 Hatchet em um único CLT, ou 12 mesmo espaço de um Hellfire, ou 54 no mesmo espaço de uma GBU-12!

Northrop Grumman Hatchet

Maquetes da Northrop Grumman, mostrando como é possível carregar 54 Hatchet num pod rotativo com dimensões e pesos equivalentes a uma GBU-12 (esquerda) ou 12 num pod fixo com dimensões e pesos equivalentes a um Hellfire (direita)
Outra mini PGM já em uso é o BAE Systems APKWS (sistema letal avançado e preciso), que modifica os foguetes Hydra, os quais os EUA e aliados dispõem em grandes quantidades, com guiagem SAL, a um custo relativamente baixo. Um pod com 19 APKWS tem dimensões e pesos semelhantes a 4 Hellfire. [20]
 APKWS. 1) kit de guiagem com aletas estendidas; 2) ogiva; 3) detonador; 4) motor foguete com aletas estendidas; 5) conjunto completo com aletas dobradas
Outros países, além de EUA e Reino Unido também desenvolvem armas compactas. Um destes é Israel, do qual já destacamos algumas de suas PGM em outro artigo. 

Israel já opera, sabidamente, duas armas similares à APKWS, ambas da Elbit (GATR e STAR), uma semelhante à Stormbreaker (IMI SPICE 250), e outra semelhante às Paveway (Elbit Lizard).

Mas duas das armas israelenses, ambas feitas pela IMI, merecem destaque especial - a Delilah e a Fastlight
 A Fastlight tem um peso aproximado de 50 kg (quase o mesmo que o Hellfire), mas carrega uma ogiva de 35 kg!
 O Delilah é um míssil da mesma categoria do SPEAR 3; peso de 187 kg, ogiva de 30 kg e alcance de 250 km
A MBDA SmartGlider está sendo desenvolvida pela França. É uma arma da mesma categoria da Stormbreaker, e um suporte para 6 bombas, o Hexabomb Smart Launcher (HSL), também está sendo desenvolvido. O conjunto completo terá aproximadamente o mesmo peso e tamanho de uma bomba de 2 mil libras (cerca de 1 tonelada)
 Conjunto de 6 MBDA SmartGlider num HSL
A Turquia também fabrica diversas PGM, como os Cirit (foguetes guiados similares aos APKWS), UMTAS (similares aos Hellfire), e o MAM-L, um míssil equivalente ao Hellfire em alcance mas à SGM em dimensões e pesos.
 Concepção artística de um drone TAI Anka-S com 4 Rocketsan MAM-L
A Turquia, inclusive, tem usado seus drones e PGM com grande eficiência na Síria e na Líbia.

China, Rússia e Paquistão estão entre os países que também desenvolvem mini PGM e drones, muitos com características semelhantes às dos sistemas apresentados até o momento. Estes drones tem sido usados com grande eficiência na Líbia, Síria e outros lugares.


CONCLUSÃO

A 'revolução das mini PGM' está apenas no seu começo, e sem dúvidas ainda tem muito para crescer.

Conforme apontamos no artigo 'Qual será o substituto do A-10', drones e outras aeronaves leves com essas mini PGM terão aplicação crescente no campo de batalha.
Super Tucano lançando uma GBU-12 durante testes. A GBU-12 foi bastante eficiente contra diversos tipos de alvos na Guerra do Golfo e outras operações militares


Por: Renato Henrique Marçal de Oliveira - Químico e trabalha na Embrapa com pesquisas sobre gases de efeito estufa. Entusiasta e estudioso de assuntos militares desde os 10 anos de idade, escreve principalmente sobre armas leves, aviação militar e as IDF (Forças de Defesa de Israel).

REFERÊNCIAS



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