Hoje é imprescindível para o sucesso do
emprego do poder naval o pleno domínio técnico e a presteza das suas
tripulações, o que envolve muito treinamento e doutrinas que são fundamentais
no cenário marítimo. Mas há determinados pontos inseridos em toda doutrina e
preparação de nossas tripulações que são pouco conhecidas por nosso público em
geral, sendo o Controle de Avarias (CAv) um fator de grande relevância no
treinamento daqueles homens e mulheres que irão se fazer ao mar em defesa dos
interesses nacionais. Não basta ter os meios, tem que possuir o material humano
bem adestrado para fazer frente a toda e qualquer situação que possa surgir
durante uma faina (trabalho), seja em paz ou principalmente na guerra, o preparo
é fundamental para que qualquer operação seja bem sucedida.
Nosso editor, Angelo Nicolaci, esteve no dia
23 de outubro acompanhando um pouco do treinamento ministrado pela Marinha do
Brasil aos seus tripulantes, sendo o Centro de Adestramento Almirante Marques
de Leão (CAAML) uma referência nesse quesito, onde além de ministrar os cursos
teóricos, o centro conta com diversos simuladores que buscam replicar algumas
das situações de risco que esses tripulantes podem vir a enfrentar no Mar.
“Logo
pela manhã cheguei a unidade que fica localizada em Parada de Lucas no Rio de
Janeiro, o acesso ao centro de adestramento é um pouco difícil devido a sua
localização próxima a uma área de mangue a beira da Avenida Brasil e muito
próximo à uma comunidade. Mas nada que seja um obstáculo para realização de
nosso trabalho.
Lá fui
recebido pelo Capitão-Tenente Luiz Gabriel, que me apresentou um pouco da
história do CAv na Marinha do Brasil e conduziu pela unidade afim de acompanhar
alguns treinamentos previsto para aquele dia.”
Na ocasião fora respondida algumas questões
para que nosso público possa compreender melhor a história e a importância do
CAv na Marinha do Brasil:
Quando
o CAv surgiu na Marinha do Brasil? E qual sua relevância em nossa doutrina de
emprego naval?
O surgimento do Controle de Avarias (CAv) na
Marinha do Brasil se confunde com a criação da instituição. Devido à sua
importância vital para qualquer Navio de Guerra, o CAv não pode ser dissociado
da vida de bordo e o conhecimento da doutrina vigente é obrigatório para todos
da tripulação.
O CAv possui as relevantes tarefas de manter
o poder combatente do Navio, fazendo frente às avarias e preservando a
integridade física dos componentes da tripulação.
A doutrina e o adestramento de CAv teve um impulso
com a criação da Escola de Controle de Avarias em 1949, tendo como seu primeiro
Encarregado e Instrutor o Capitão-Tenente Carlos Borba, mentor da mesma. O
Capitão-Tenente Borba utilizou inicialmente os conhecimentos adquiridos nos
cursos de Controle de Avarias (CAv) e de Combate à Incêndio (CBINC) realizados
na Filadélfia, nos Estados Unidos em 1947.
Quais
os princípios do CAv?
Os princípios mais relevantes do CAv são a
rapidez de resposta (prontidão), e o emprego adequado dos sistemas,
equipamentos e técnicas de combate ao sinistro. Esses atributos são alcançados
por meio da tríade “Instrução –
Adestramento – Exercício contínuo”, aliada à manutenção do material
utilizado pelo Controle de Avarias.
Como
são ministrados os cursos de CAv e os demais cursos ligados a essa doutrina?
Os cursos de CAv na Marinha do Brasil são
ministrados pelo Centro de Adestramento “Almirante Marques de Leão” (CAAML), no
Grupo de Controle de Avarias, localizado no bairro de Parada de Lucas, no Rio
de Janeiro. Os cursos são estruturados de forma a atender às múltiplas
necessidades da instituição, que vão desde o Combate à Incêndio e Alagamentos
em Navios, à evacuação de militares e civis nas Organizações Militares de
Terra.
A duração do curso varia de 5 à 45 dias,
incluindo a parte prática, de acordo com a finalidade a que se destina.
Quais
doutrinas compõe a formação em CAv?
A doutrina de CAv da Marinha Brasil
incorporou parte dos conhecimentos adquiridos nos contatos com as Marinhas
amigas, principalmente a norte americana e inglesa, somada as experiências
vividas por nossos Navios, que se traduzem em manuais específicos de Controle
de Avarias Estruturais, Combate à Incêndio, Estabilidade e Controle de Avarias
Elétricas e Eletrônicas.
Quais
requisitos exigidos do tripulante para que esse seja considerado proficiente em
CAv?
Os integrantes das tripulações dos Navios da
Marinha do Brasil devem possuir conhecimentos suficientes para responderem
rapidamente a qualquer tipo de avaria que possa ocorrer a bordo. Além disso,
devem desenvolver qualidades importantes para o Marinheiro, tais como:
Presteza, coragem, tenacidade, iniciativa e trabalho em equipe.
Os conhecimentos básicos são ministrados nos
Cursos de Formação de Oficiais e Praças, e os ensinamentos mais aprofundados
são adquiridos nos demais cursos ministrados pelo CAAML ao longo da carreira
dos militares, atendendo as especificidades das funções desempenhadas pelos
mesmos a bordo.
A Marinha do Brasil aufere a eficiência dos
seus tripulantes por meio de um vasto e rigoroso programa de adestramentos,
tanto individuais como em equipe, além da avaliação de exercícios realizados a
bordo dos Navios, seja no porto ou no mar, assim como o emprego de simuladores
de avarias.
Como é
a rotina de treinamento?
A rotina de treinamento a bordo obedece a um
rigoroso planejamento que envolve também os Comandos Superiores e as
Organizações Militares (OM), responsáveis pelas inspeções e assessorias ao
adestramento, como é o caso do CAAML.
Os diversos programas de treinamento
abrangem: Instruções, adestramentos, exercícios e avaliações que ocorrem
durante todo o período de serviço ativo do Navio. Tais programas são executados
diariamente, como forma de se manter a prontidão das tripulações para a reação
imediata a quaisquer avarias que ocorram a bordo. Como exemplo, podemos citar o
exercício diário de CAv realizado pelo Grupo de CAv de Serviço dos Navios.
Quais
meios e simuladores a Marinha dispõe hoje para treinamento de seus homens?
A
Marinha do Brasil por intermédio do CAAML, disponibiliza dois simuladores para
adestramentos e exercícios de controle de avarias estruturais e alagamentos,
além de oito simuladores para combate à incêndios. Os simuladores reproduzem os
diversos compartimentos de bordo com maior probabilidade de ocorrência de
sinistros, tais como praças de maquinas, alojamentos, cozinhas, paióis e
compartimentos situados abaixo da linha d’ água. Entre os oito simuladores de
CBINC, temos um helicóptero e uma aeronave de asa fixa destinado à pratica de combate
a incêndio em aeronaves.
Nos Distritos Navais existem simuladores para
treinamento básico das equipes dos Navios subordinados.
A Marinha do Brasil conta ainda, com
simuladores específicos para adestramento de CAV em submarinos na Base
Almirante Castro e Silva, localizada em Niterói, além de simuladores para
adestramento de CBINC em aeronaves (CBINC-Av) na Base Aeronaval de São Pedro da
Aldeia.
Tendo
em vista nossa vocação para o mar, como a Marinha lida com a formação dos
futuros Oficiais e Praças da Esquadra e de nossa Marinha Mercante?
A Marinha do Brasil tem como missão e visão
de futuro “Preparar e emprega o Poder Naval, a fim de contribuir para Defesa da
Pátria; para garantia dos poderes constitucionais, e por iniciativa de qualquer
destes, da Lei e da Ordem; para o cumprimento das atribuições subsidiárias
previstas em Lei; e para o apoio à Politica Externa.”
Desta forma, a Marinha considera a formação
dos seus integrantes e os da Marinha Mercante como uma de suas prioridades.
Assim, visando o cumprimento de sua missão, a
Marinha do Brasil investe uma parcela considerável de seus recursos financeiros
e de pessoal, no desenvolvimento e aprimoramento da formação e qualificação dos
seus integrantes.
Tendo
em vista que temos hoje muitas empresas que exploram petróleo e recursos em
nossas águas, e com fins de maximizar a segurança no mar, há algum tipo de
formação voltada para iniciativa privada?
Sim, A Marinha do Brasil representada pelas
suas Capitânias dos Portos, que estão distribuídas pelas diversas regiões do
território nacional, disponibiliza o curso PREPOM para o pessoal da Marinha
Mercante e para quem desenvolve atividades correlatas. Neste curso, os
aquaviários tem aulas teóricas e práticas de prevenção e combate à incêndio a
bordo.
Continuando nossa visita
Após uma escala na Praça D’Armas, seguimos
para acompanhar uma série de treinamentos nos simuladores, começando pelo
conjunto de simuladores voltados ao adestramento de Combate à Incêndios
(CBINC), Nesta seção, o CAAML conta com dois simuladores de incêndio
“Maracanã”, um simulador “Árvore de Natal, este destinado a equipes especificas
que operam em refinarias, depósitos de combustível e atividades similares, dois
simuladores de incêndio em aeronaves (CBINC-AV) sendo um de asa fica e outro de
asa rotativa, o simulador de “Praças de Máquinas” e uma área indoor que simula
diferentes focos de incêndio e é utilizado afim de estabelecer a doutrina de
emprego de extintores, onde cada tipo de foco demanda uma adequada categoria de
extintores, além de simular todo o procedimento que precede o combate ao
sinistro e o pós combate, quando o fogo é controlado.
Nesta ocasião estavam recebendo o
adestramento, equipes das fragatas F-40 “Niterói”, F-49 “Rademaker” e da
corveta V-32 “Júlio de Noronha”. A Faina teve início com uma “corrida seca”,
onde as equipes realizam uma familiarização com os procedimentos a serem
realizados, isso ocorrendo sem que os simuladores estejam “acesos”. Após a
realização de três corridas e a verificação de todos os procedimentos que serão
executados, os simuladores são “acesos” e as equipes tomam posição de combate
ao sinistro. É notória a sincronia e a grande importância do trabalho em
equipe, bem como o papel da liderança nessas fainas, simulando de forma bem
realista o que deverá ser feito no caso de uma ocorrência dessas a bordo, há
toda uma série de verificações que são feitas pelas equipes antes de
literalmente combater o fogo, o que demonstra a grande preocupação com a
segurança de cada membro da equipe.
Na área Indoor, o instrutor primeiro faz uma
apresentação dos tipos de extintores, leva as equipes para dentro do simulador
e ensina os procedimentos que devem ser realizados em cada um dos casos
simulados ali, sendo capaz de reproduzir incêndio em quadro elétrico, painel de
sistemas, cozinha, paiol, escritório, alojamento e equipamentos. Após essa fase
de familiarização, os simuladores indoor são “acesos” e um a um vai recebendo a
indicação de qual foco deverá combater, onde o tripulante adentra a área, se
dirige ao comunicador simulando o procedimento que deve ser executado,
informando o nome do navio, patente e identifica o sinistro informando a
localização do foco de incêndio, após esse procedimento o tripulante pega o
extintor correspondente a categoria de incêndio, testa o equipamento e então dá
combate ao foco. Após a extinção do foco, o tripulante retorna ao comunicador,
mais uma vez se dirige ao comunicador e reporta o nome do navio, patente, o
local do sinistro e o status do combate como controlado.
A experiência é muito boa, e nos mostrou o
quão desafiador é uma faina de combate a incêndio, pois ali num ambiente
controlado, já é possível replicar o calor e parte do stress que enfrentará a
equipe numa situação real, pois a sincronia e precisão de cada membro é
fundamental para o sucesso e principalmente a segurança de cada membro.
Após ser apresentado aos simuladores de
CBINC, conhecemos o “Labirinto”, outro treinamento de grande importância aos
tripulantes. Neste o militar e inserido em uma sala escura, cheia de
obstáculos, um verdadeiro labirinto sem um mínimo de luz, e para aumentar a
fidelidade do que seria abandonar um compartimento do navio em pane elétrica e
sinistrado, ainda é adicionada fumaça a sala, elevando o fator de stress e
elevando o grau de dificuldade para que o tripulante tenha noção de como
proceder em uma situação real de abandono de compartimento tomado pela fumaça e
sem iluminação.
Continuando nosso mergulho em busca de mais
conhecimento sobre CAv, fomos conduzidos pelo nosso anfitrião, o
Capitão-Tenente Luiz Gabriel, até os simuladores de Controle de Avarias
Estruturais e de Alagamento, onde encontramos equipes da corveta V-32 Júlio de
Noronha e do G-28 Mattoso Maia, o NDCC (Navio de Desembarque de Carros de
Combate) que está passando por um período previsto de manutenções e
atualizações.
No primeiro simulador, onde estava sendo
adestrada a equipe do “Julio de Noronha”, havia uma sala de alagamento, onde se
reproduz uma situação de alagamento em um compartimento do Navio, e no mesmo
simulador, na outra sala era possível ver outra parte da equipe realizando uma
faina de reforço estrutural, onde com uso de madeira foi montado um escoramento
em “K” na escotilha de acesso ao compartimento alagado, além de um escoramento
em “T” no teto do compartimento. O mais interessante nesse simulador é que ele
conta com sistema que joga água em todas as partes do compartimento, literalmente
dando um banho nos membros da equipe, reproduzindo a situação de stress e as
dificuldades de trabalhar com jatos d’ água de todas as direções, o que leva a
algo muito próximo do que pode ocorrer a bordo. No outro lado, a sala
rapidamente foi alagada, cabendo a equipe realizar um escoramento em “K” na
antepara, lembrando que diferente do que ocorre na sala ao lado, o
compartimento está quase que completamente submerso, o que exige muito mais
perícia no manuseio das ferramentas e no trabalho em equipe.
O simulador onde estava sendo adestrada a
equipe do “Mattoso Maia”, reproduz avarias no costado do Navio, onde há vários “rombos”,
por onde entram jatos de água e leva a necessidade de as equipes estancarem os “vazamentos”
no casco com uso de variadas técnicas, além de exigir a montagem de vários
tipos de escoramento, como o escoramento de antepara em “Triplo K”, de
escotilha em “K”, Escoramento em “T” e o mais complexo que é o “H”.
O treinamento exige muito das tripulações, o
que eleva consideravelmente a capacitação desses homens frente aos sinistros
que podem ocorrer durante uma comissão ou mesmo com navio atracado, sendo um
fator que pode ser decisivo não só entre o sucesso ou fracasso de determinada
operação, mas crucial em situações que colocam esses profissionais entre a vida
e a morte.
O GBN News pode através desta visita trazer
ao conhecimento de todos um pouco mais sobre a formação de nossos “homens do
mar”, demonstrando que a vida na Marinha do Brasil não é moleza como muitos por
ai pensam. A vida militar exige muita ralação, é uma rotina severa de muito
treinamento e avaliações que garante a presteza de nossa Marinha, lembrando que
a melhor forma de lidar com um sinistro é estando preparado para lidar com ele,
e essa é a missão do Centro de Adestramento Almirante Marques de Leão, que ao
longo de sua existência vem contribuindo para o sucesso do emprego de nossos
meios navais, constituindo uma ferramenta fundamental para o poder naval
brasileiro.
Agradecemos a toda equipe do CAAML por ter
recebido nosso editor e compartilhado conosco um pouco do conhecimento sobre o
Controle de Avarias (CAv) na Marinha do Brasil.
Em breve pretendemos trazer mais sobre a
formação de nossos militares, dando origem a uma nova e espetacular série que
fará que você veja nossos militares de outra forma. Não esqueçam de conferir a cobertura
dessa visita em vídeo no Canal Arte da Guerra, onde o Comte Robinson Farinazzo
preparou um vídeo que irá complementará essa matéria em duas partes, a primeira
sobre CBINC já esta no ar, e você confere clicando no link: “As reportagens militaresdo Nicolaci (CAAML)”
Por Angelo Nicolaci - Jornalista, editor do GBN News, graduando em Relações Internacionais pela UCAM, especialista em geopolítica do oriente médio e leste europeu, especialista em assuntos de defesa e segurança
GBN News – A informação começa aqui
0 comentários:
Postar um comentário