Sem uma postura mais rígida em relação a Riad e Islamabad, Washington não vencerá o radicalismo islâmico, afirma o especialista Arif Jamal. Mas, segundo ele, ainda é cedo para avaliar a estratégia de Trump.
O decreto do presidente Donald Trump que proíbe o ingresso nos Estados Unidos de cidadãos de sete países de maioria muçulmana deixou de lado a Arábia Saudita, o Paquistão e o Afeganistão, apesar de a maioria dos grupos terroristas islâmicos que atacaram os Estados Unidos nos últimos anos terem raízes e forte presença justamente nesses países.
Além disso, nenhum atentado terrorista nos Estados Unidos, desde o 11 de Setembro, foi executado por pessoas com origens nos sete países da lista de banidos por Trump – Iraque, Síria, Sudão, Irã, Líbia, Somália e Iêmen.
Em entrevista à DW, o especialista em segurança e extremismo Arif Jamal afirma que os Estados Unidos não conseguirão vencer a guerra contra os radicais islâmicos enquanto tiverem países como Arábia Saudita e Paquistão como aliados. "Sem uma postura mais rígida em relação à Arábia Saudita, Washington não conseguirá vencer o islã radical e os grupos jihadistas", afirma.
DW: Sauditas estavam entre os terroristas responsáveis pelos ataques do 11 de Setembro. O atentado em San Bernardino foi executado por um casal com origens paquistanesas, e o ataque a uma boate em Orlando, por um cidadão americano com raízes afegãs. Por que Arábia Saudita, Paquistão e Afeganistão não estão na lista de proibição de ingresso do presidente Donald Trump?
Aria Jamal: Ainda é muito cedo para avaliar a estratégia de Trump, e além disso muito difícil. Apesar de a imprensa americana ter levantado a hipótese de que Trump excluiu esses países por ter laços econômicos com eles, isso só se aplicaria ao caso da Arábia Saudita. Trump não tem qualquer relação de negócios com o Afeganistão ou o Paquistão. Eu acho que ele deixou o Afeganistão de lado porque o contrário traria um monte de problemas para os soldados americanos estacionados no país e também para outros americanos que trabalham por lá. É evidente que, num caso como esse, o governo afegão encerraria a cooperação com Washington. No caso do Paquistão, a situação é outra: acho que Trump ainda está formulando uma linha política geral para o país. Uma coisa, porém, é certa: os Estados Unidos não têm como vencer a guerra contra o radicalismo islâmico enquanto Arábia Saudita e Paquistão forem seus [dos Estados Unidos] aliados.
Fica a impressão de que as alianças geopolíticas do novo presidente no Oriente Médio e no sul da Ásia não se diferenciam muito das dos seus antecessores Obama e Bush.
Repito: é muito cedo para fazer essa avaliação. Trump com certeza está revisando a postura do governo Obama em relação ao Irã. Se o decreto sobre proibição de entrada for tomado como pedra angular da linha de Trump, essa certamente não se diferencia muito daquelas seguidas por seus antecessores. Há, porém, relatos de que Trump procura a ajuda da Rússia para coordenar a luta contra o "Estado Islâmico". Se isso se confirmar, a situação seria completamente outra. Mas como existe uma forte oposição à Rússia nos Estados Unidos, uma grande proximidade com Moscou traria dificuldades para Trump. Na minha opinião, porém, é impossível vencer o islã radical sem a ajuda da Rússia.
Por que Trump hesita em adotar uma linha mais dura em relação ao Paquistão e à Arábia Saudita? O que torna as relações de Washington com esses países tão especiais?
Acho que, nas próximas semanas, o curso em relação ao Paquistão será endurecido. No caso da Arábia Saudita, a situação é diferente. Mas gostaria de reforçar que, sem uma postura mais rígida em relação à Arábia Saudita, Washington não conseguirá vencer o islã radical e os grupos jihadistas.
O Paquistão e a Arábia Saudita vão se sentir estimulados a prosseguir com seu suposto apoio a radical islâmicos agora que Trump os excluiu da sua lista de países com ingresso proibido?
Nem o Paquistão nem a Arábia Saudita veem um aliado em Trump. Na verdade, nenhum país de maioria muçulmana o vê como aliado. Isso explica por que muçulmanos em todo o mundo participam de manifestações contra Trump. E se trata de muçulmanos que, no seu próprio país, não saem às ruas para participar de protestos contra islamistas ou contra o governo.
Como a clara postura anti-Irã de Trump vai se refletir no conflito entre sunitas e xiitas no Oriente Médio?
Se Washington e Moscou firmarem uma aliança contra o "Estado Islâmico", Trump será obrigado a rever sua postura em relação ao Irã. Essa aliança também ajudaria a diminuir as tensões entre os diversos grupos étnicos e religiosos. Mas a proibição de ingresso para sete países de maioria muçulmana não deve ser vista como uma linha política geral em relação ao mundo muçulmano. Até agora, Trump agiu para unir seus apoiadores, os fundamentalistas cristãos e os racistas brancos. Mais do que isso não deve ser entendido.
Fonte: Deutsche Welle
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