quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Independência do Brasil - Até onde somos realmente independentes?

Dando prosseguimento a nossa série de matérias especiais sobre a “Independência do Brasil”, vamos falar sobre a questão tecnológica a qual em grande parte ainda somos uma nação extremamente dependente, principalmente no que diz respeito a alta tecnologia e defesa.

Hoje vivemos em um mundo dito globalizado, onde o conhecimento “flui” sem fronteiras, mas a verdade como bem sabemos não é essa, principalmente no que diz respeito a vanguarda tecnológica, pois quem investe em pesquisa e desenvolvimento jamais irá ceder o “pulo do gato” a um possível futuro concorrente, mesmo embora muitos possam afirmar que o mercado esta cada vez mais estreito e as grandes industrias e centros de pesquisa buscando partir para o desenvolvimento compartilhado para diluir os custos, ainda há e muito a proteção feroz da propriedade intelectual e tecnológica.

O Brasil por décadas manteve-se ao largo das pesquisas tecnológicas, investindo muito menos de um terço do que se investe a exemplo na Europa e EUA, tornando-se um país por demais atrasado no que diz respeito a capacidade tecnológica. Bom exemplo disso esta em sua casa agora, nós não dominamos a tecnologia de microprocessadores e muitos itens que são comuns em eletro-eletrônicos que você possui em sua casa. Coisas que podem parecer simples, mas pelas quais pagamos um alto preço por não possuirmos nossa independência tecnológica, um dos efeitos colaterais que citei no artigo "
Independência do Brasil - Voltando ao inicio para entendermos nossa história", sendo um dos males de nosso processo de independência que se restringiu apenas á sua esfera política, mantendo por tempo demasiado uma postura colonial enquanto efervescia no mundo a primeira revolução industrial, nos atendo a investir na matriz agricultora e deixando de lado o investimento em pesquisa e desenvolvimento industrial e tecnológico.

Hoje a maior parte de tudo que produzimos, ou melhor, montamos, pois a nacionalização dos meios tecnológicos é sempre muito baixa e compreensível do ponto de vista estratégico e de mercado por parte dos detentores de tal tecnologia, restringe por demais o crescimento da industria nacional. Você pode estar achando que estou equivocado, pois os números indicam o crescimento de nossa matriz industrial, mas eu faço algumas perguntas: Quem são os seus fornecedores de tecnologia? De onde vem os meios? Qual seu custo? Em que acrescenta a nossa independência tecnológica?

Possuimos hoje a terceira maior fabricante de aviões do mundo, a Embraer. Mas mesmo estando entre os maiores do mercado a mesma possui uma enorme dependência externa, pois toda tecnologia eletrônica, de motores e principalmente de materiais vem de fornecedores externos, sendo apenas integrados e alguns montados aqui no Brasil, onde temos hoje como expoente desse "calcanhar de Áquiles", se assim podemos nomear, o grande número de itens importados ou montados sob licença afim de equipar o moderno e inovador transporte KC-390. 


No campo de Defesa essa dependência pode impactar em nossas exportações, onde podemos citar o caso ocorrido em um passado próximo com o embargo americano á venda de nossas aeronaves “Super Tucanos” à Venezuela, devido ao fato dos mesmo possuírem sistemas e motorização de origem americana. Alguns criticam a postura americana e ficam até indignado com tal fato, mas vamos olhar por outra ótica, digamos que você desenvolveu um motor super eficiente e de alto desempenho para carros de corrida, e uma fabrica de carros comprou de você para equipar seus veículos, mas o mesmo resolveu vender os veículos com o motor que você desenvolveu a uma equipe de corridas que compete com a sua, o que você faria? Logicamente iria proibir seu cliente de vender a seu adversário correto? Mas se seu cliente desenvolveu um motor próprio, ele poderá vender a quem quiser sem consultar ninguém, pois a tecnologia é dele. Essa é a grande importância de se possuir independência tecnológica.

O Brasil tem perfil para se tornar um grande desenvolvedor de novas tecnologias e ser independente neste quesito, mas os principais passos neste sentido são deixados de lado. Devido a este fato pagamos as vezes mais que o dobro por determinados produtos em seus países de origem, na prática, significa que temos um custo tecnológico vinte vezes superior.

Quando se combina esse fator com a degradação da universidade pública, que é responsável pela maior parte das pesquisas no país, e a maior participação do ensino superior privado na formação, a situação se agrava, pois não haverá esperança de produção científica e tecnológica, uma vez que, de modo geral, as universidades particulares não investem em pesquisa. Deste modo, além de aumentar a sucatização tecnológica do país, elimina-se o caminho para a emancipação científica e tecnológica em que pode constituir-se a pesquisa.

É oportuno mencionar os pesados investimentos feitos em pesquisa nos países detentores da independência tecnológica à insignificância de recursos aplicados pelos países meramente consumidores de tecnologia. Está nesta diferença a principal raiz da supremacia tecnológica que determina a dominação econômica.

Não tendo tecnologia própria, e impedidos de produzi-la pela atrofia da pesquisa, ou a falta de poder para adquirir tecnologia importada, devido a seu alto custo estaremos assim ilhados, perpetuando nossa condição colonial de fornecedor de matéria primaria e consumidor de bens de alto valor agregado, ainda permanecendo submissos as regras e vontades dos detentores da tecnologia.

Um dos setores de grande importância para nossa sociedade e que exibe uma dependência quase que completa é o farmacêutico, o Brasil está em situação deficitária no que se refere ao desenvolvimento de inovações que contemplem a área de saúde. “Como o Brasil não detém tecnologia, precisa importar os produtos. Dessa forma, a balança comercial do setor é extremamente deficitária”, afirma. Dados do Ministério da Saúde mostram que o déficit comercial brasileiro no setor de fármacos e medicamentos é de aproximadamente US$ 3,5 bilhões. Falta ao país a adoção de políticas públicas consistentes e de longo prazo que possam alavancar o número de inovações na área. Como o país investe pouco, a dependência tecnológica cresce à medida que as inovações são mundialmente geradas.

O Brasil tem capacidade instalada para realização de trabalhos importantes na área de saúde. Atualmente as maiores responsáveis por essas pesquisas no país são as instituições públicas, apoiadas com recursos governamentais. Mesmo assim, o número de pesquisas é pequeno, além disto, existe uma desconexão entre as pesquisas realizadas e a utilização desses conhecimentos. Ainda há a falta de investimento na produção nacional de produtos quimicos necessários a esse setor, sendo mais de 90% importado, o que aumenta vertiginosamente o custo dos nossos medicamentos.

Em média: 1kg de soja custa US$ 0,10, 1kg de automóvel custa US$ 10 , 1kg de aparelho eletrônico custa US$ 100, 1kg de avião custa US$1.000 (10.000 quilos de soja) e 1kg de satélite custa US$ 50.000.Vejam, quanto mais tecnologia agregada tem um produto, maior é o seu preço, mais empregos foram gerados na sua fabricação.

Os países ricos sabem disso muito bem. Eles investem na pesquisa científica e tecnológica, mantedo sempre sua independência tecnológica, pois como todos sabem, conhecimento é poder, e conhecimento assim como independência não se compra se conquistam.

O Brasil é muito dependente da tecnologia externa. Quando fabricamos bens com alta tecnologia, fazemos apenas a parte final da produção.Por exemplo: o Brasil produz 5 milhões de televisores por ano e nenhum brasileiro projeta televisor. O miolo da TV, do telefone celular e de todos os aparelhos eletrônicos, é todo importado. Somos meros montadores de kits eletrônicos. Casos semelhantes também acontecem na indústria mecânica, de remédios e, incrível, até na de alimentos.O Brasil entra com a mão-de-obra barata e os recursos naturais. Os projetos, a tecnologia, o chamado pulo do gato, ficam no estrangeiro, com os verdadeiros donos do negócio.

É importante compreendermos que os donos dos projetos tecnológicos são os donos das decisões econômicas, são os donos do dinheiro, são os donos das riquezas do mundo.Assim como as águas dos rios correm para o mar, as riquezas do mundo correm em direção aos países detentores das tecnologias avançadas.A dependência científica e tecnológica acarretou para nós brasileiros a dependência econômica, política e cultural.

Hoje nos deparamos com uma fase importante e ao mesmo tempo delicada dentro de nossas Forças Armadas,que passam por um importante programa de reaparelhamento, o qual esta sendo desenhado sobre tecnologias as quais não dominamos, o que nos traz um custo altíssimo e sérias limitações, uma vez que o pouco que se possuía de nossa outrora vasta industria de defesa hoje é pouco expressiva em termos de pesquisa,desenvolvimento e domínio tecnológico, porém, esse cenário vem mudando aos poucos, com alguns setores investindo e desenvolvendo por sua própria conta soluções e produtos inovadores com tecnologia 100% brasileira.

Só para citar um simples exemplo desta dependência que neste setor tão vital a soberania nacional torna-se preocupante, basta olhar para o nosso míssil ar-ar Mectron MAA-1 “piranha”, durante seu desenvolvimento, foi necessário comprar junto aos EUA componentes da cabeça de guiagem, o sensor foi escolhido e a cabeça do míssil projetada para receber tal componente, mas no momento da entrega recebemos dos americanos um produto totalmente fora das especificações as quais solicitamos, e até inferior, mas os mesmos alegaram que só forneceriam aquele componente que foi enviado, causando um aumento no custo de desenvolvimento de nosso míssil, uma vez que tivemos de reprojetar a cabeça de guiagem. Uma experiência que deixou mais do que clara a nossa dependência tecnológica e seu alto custo.

Estamos em um ponto no qual devemos decidir se seremos indenpendentes ou só mais uma “colônia”, pois temos de limitar as barreiras aos recursos e meios para se alcançar essa independência, e isso não será feito do dia para noite, como muitos acreditam que será com a aquisição de importantes meios como os submarinos e helis que compramos junto á França ou ao novo caça suéco-brasileiro Gripen NG. Tecnologia não se vende, se desenvolve, a tal transferência de tecnologia que é tão propagada no âmbito de compras determinados no END (Estratégia Nacional de Defesa), não resultará em uma solução para nossa dependência tecnológica, mas pode ser um pequeno passo de centenas a serem dados por nosso governo em conjunto com a comunidade científica e a iniciativa privada, que devem
Juntos arcar com os custos de tal independência. Pois nenhum dos fornecedores destes programas de Defesa irão dar de mão beijada toda a tecnologia que necessitamos, algo que lhes custou bilhões em pesquisa e anos de desenvolvimento. Precisamos de um governo realmente comprometido com essa meta, pois nos últimos anos do governo petista, vimos a euforia de discursos que davam como garantidos os recursos para esses importantes programas de desenvolvimento e reaparelhamento de nossas forças armadas, dar lugar ao corte de recursos e investimentos no setor não apenas de defesa, mas de pesquisa e desenvolvimento como um todo, sendo um grave atentado ao futuro de nossos programas militares e tecnológicos. Agora as vésperas de se comemorar o 194º aniversário da "Independencia do Brasil", o novo presidente Michel Temer fez um importante anúncio, no qual faz a "promessa" de tirar o setor de defesa do segundo plano em seu govern, o que nos resta aguardar por uma postura séria e o cumprimento de sua palavra.

Mas para tranquilizar um pouco nossos compatriotas, temos ilhas de independência tecnológica e domínio pleno, como são o caso de nossas centrífugas para enriquecimento de Urânio ou a capacidade de explorar petróleo em águas profundas pela Petrobrás.

Cabe a cada um de nós decidir até quando vamos continuar sendo uma nação dependente, e comemorar mais uma vez neste ano a nossa dependente “Independência”.



Por: Angelo Nicolaci - Editor do GBN, Jornalista e graduando de Relações Internacionais pela UCAM


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