Construídos inicialmente como projetos baratos para estudantes dominarem a tecnologia espacial, os nanossatélites (que medem centímetros de largura) têm conquistado grande importância científica. O Brasil já está dando seus passos nessa área
Eles são pequenos, simples e baratos, mas também eficientes e úteis. São os nanossatélites, pequenos satélites em forma de cubo (por isso, também chamados cubesats), com 10 centímetros de aresta e cerca de 1 kg de peso, que estão abrindo uma nova tendência nas pesquisas espaciais. Trata-se de uma moda à qual o Brasil aderiu, com o lançamento, no ano passado, do primeiro artefato desse tipo totalmente construído no país. Pelo menos outros três estão sendo criados e deverão entrar em órbita nos próximos meses e no ano que vem.
A palavra “nanossatélite” não é lá muito precisa, já que o prefixo nano (“anão”, em grego) é usado normalmente para medir coisas na escala de átomos e moléculas. Um nanômetro equivale à milésima parte de um milímetro, ou seja, um milímetro dividido por mil (para efeito de comparação, um fio de cabelo mede 50 mil nanômetros). Mas o nome pegou de vez.
O conceito e o formato desses pequenos satélites foram criados em 1999, pelos pesquisadores Jordi Puig-Suari e Bob Twiggs, da Universidade Stanford, na Califórnia (EUA). O objetivo inicial dos americanos era desenvolver projetos científicos e educacionais de baixo custo, para que estudantes de graduação e pós-graduação pudessem aprender e dominar a tecnologia aeroespacial. “Logo se percebeu, no entanto, que os cubesats poderiam ser usados para outras aplicações úteis, além do ensino”, diz Otávio Durão, coordenador de engenharia e tecnologia espacial de projetos de nanossatélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). “Com o passar do tempo, esses artefatos se tornaram um padrão tecnológico espacial e abriram caminho para a construção de vários deles com aplicações cientificas.”
A bordo, ele leva uma placa com três cargas úteis. Uma delas é um magnetômetro, que mede a intensidade do campo magnético da Terra. Segundo Durão, esse equipamento estudará a anomalia magnética do Atlântico Sul, fenômeno que se estende da África do Sul à costa do Chile. Nessa faixa, o campo magnético terrestre é menos espesso e, por isso, a proteção contra a radiação ionizante espacial e a do Sol é menor. Ou seja, partículas de alta energia podem afetar as comunicações, os sinais de satélites de posicionamento global (como o GPS), as redes de distribuição de energia, ou causar falhas em equipamentos eletrônicos como computadores de bordo.
Um circuito integrado (um chip de computador) desenvolvido pela Santa Maria Design House da UFSM é outra carga útil. A terceira é mais um circuito integrado, feito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para proteger um hardware a bordo das radiações no espaço. “São os dois primeiros circuitos integrados projetados aqui para uso espacial”, diz Durão. “Depois de testados, eles poderão ser usados para equipar futuros satélites brasileiros.”
Com o NanoSatC-BR1 foram levados ao espaço, no mesmo foguete, outros 36 nanossatélites de vários países. Essas operações no atacado ajudam a baratear o custo de pôr tais artefatos em órbita. Segundo Durão, o desenvolvimento desse objeto, incluindo o pagamento aos russos, custou R$ 800 mil. É menos que 0,3% dos R$ 270 milhões gastos para construir o satélite CBERS-3, em parceria com a China, que foi destruído no lançamento, em dezembro de 2013. Por isso, afirma Durão, sai mais barato fabricar vários pequenos satélites do que um grande. “Se um falhar, pode ser substituído mais facilmente”, diz.
Equipe brasileira
Essa é uma das principais razões pelas quais há muitos projetos de construção desses artefatos, inclusive no Brasil. Em 5 de fevereiro, o cubesat Aesp-14, desenvolvido pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), foi lançado da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), que orbita a Terra a 370 km de altura. Com 700 gramas de peso e custo de R$ 400 mil, ele não chegou a entrar em operação, devido a uma falha na abertura da antena. O Inpe está desenvolvendo outros dois, um para entrar em operação em 2016 e o segundo sem data prevista.
Outro nanossatélite nacional que deverá entrar em ação em breve é o Sistema Espacial para Realização de Pesquisa e Experimentos com Nanossatélites (Serpens), cuja construção, coordenada pela Agência Espacial Brasileira (AEB), envolve a participação de várias universidades, entre elas a de Brasília (UnB). Segundo Chantal Cappelletti, coordenadora do projeto na UnB, o Serpens segue o padrão cubesat em tamanho 3U.
Essa missão foi inspirada no Sistema Brasileiro de Coleta de Dados (SBCD). “Em outras palavras, o satélite ficará passeando ao redor da Terra e poderá receber mensagens e armazená-las, para que em um momento oportuno o pessoal nas universidades possa fazer o download delas”, explica Gabriel Figueiró de Oliveira, da UnB, responsável pelo processo de desenvolvimento e montagem do pequeno satélite. “Mas o principal objetivo do projeto é a qualificação de recursos humanos, um ponto muito importante para o programa espacial brasileiro.” Seja como for, o leque de aplicações para os cubesats ainda não está bem definido. De acordo com Durão, por enquanto se procura saber até onde se pode chegar com tais artefatos.
Além de governos, existem empresas privadas de olho nessa tendência. Uma delas é a Planet Labs, fundada por ex-pesquisadores da Nasa, que lançou recentemente 28 nanossatélites a partir da ISS, com o objetivo de criar uma constelação deles para obter imagens detalhadas do nosso planeta. “Metade dos cubesats lançados até hoje foi colocada em órbita no ano passado”, diz. “Agora, a própria Nasa deverá lançar, em 2016, dois desses satélites para orbitar e estudar não a Terra, mas Marte.” Ao que parece, os pequenos satélites vão longe mesmo.
Trabalho escolar
O nanossatélite brasileiro Tancredo-1 mostra como pode ser simples e barato desenvolver um artefato desses. Ele foi criado por cerca de 150 alunos da 5ª e 6ª séries do ensino fundamental (faixa etária de 10 a 12 anos) da Escola Municipal Tancredo de Almeida Neves, de Ubatuba, no litoral paulista. A ideia partiu do físico e professor de matemática do colégio, Candido Osvaldo de Moura, depois de assistir a um programa no qual se falava da empresa norte-americana Interorbital Systems, que vende kits com os principais componentes para a montagem de satélites.
Moura contatou a empresa, que lhe disse que os alunos de Ubatuba seriam as pessoas mais jovens a se envolver num projeto de pesquisa espacial e precisariam de ajuda técnica. Ele procurou então o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), que na hora aceitou ajudar. O Tancredo-1 tem peso de 750 gramas e formato cilíndrico (daí ser chamado de tubesat), com cerca de 9 centímetros de diâmetro e 12 cm de altura, pouco maior do que uma lata de refrigerante. Sua missão é levar ao espaço uma frase pedindo paz no mundo, que será escolhida por concurso e transmitida para todo o planeta.
O projeto custou cerca de R$ 30 mil, dos quais R$ 16,5 mil foram doados por um empresário da cidade. O lançamento deveria ocorrer em 2013, a partir da Estação Espacial Internacional; depois passou para 2014 e, em seguida, para 2015. “Mas isso não deve ocorrer”, diz Maria de Fátima Souza Barros Santos, diretora da escola. “O satélite está em fase de ajustes no Inpe e o lançamento só deverá ser feito no ano que vem. Mas nossos alunos já estão construindo outro, o Tancredo-2.”
Fonte: Revista Planeta
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