sábado, 28 de maio de 2016

Religião não é o que mais atrai sírios para grupos terroristas, diz estudo

O que leva uma pessoa a se alistar no Estado Islâmico ou em outras organizações terroristas que cometem atentados a bomba, cortam cabeças e dominam cidades inteiras na base do medo? Um estudo feito com jovens sírios traz conclusões que desafiam o senso comum.
A crença em ideologias extremistas parece ser secundária na decisão de se juntar a um grupo violento. A religião serve mais como uma justificativa moral"
International Alert
De acordo com a pesquisa, realizada pela organização International Alert, a radicalização religiosa não é a principal motivação. Necessidade financeira, desejo de vingança por causa de traumas pessoais de guerra e falta de acesso à educação são fatores que explicam melhor o que o que tem levado tantos jovens a aderirem à causa jihadista.
“A crença em ideologias extremistas parece ser um fator secundário na decisão de se juntar a um grupo violento. A religião serve mais como uma justificativa moral para a adesão à luta”, afirmam os pesquisadores.
O levantamento entrevistou 311 jovens sírios que vivem em seu país, no Líbano e na Turquia. Alguns são ex-membros dos grupos terroristas, outros estão considerando a possibilidade de se juntar a eles e um terceiro grupo é de amigos ou parentes de combatentes de grupos armados.
O objetivo era avaliar quais fatores tornam os jovens sírios vulneráveis ao recrutamento por grupos extremistas e também o contrário, ou seja, o que os torna resilientes e dificulta que decidam seguir esse caminho. Os grupos jihadistas estudados foram o Estado Islâmico e a Frente al-Nusra, que tem ligação com a Al Qaeda.
90% de desemprego
Jihadistas do Estado Islâmico exibem suas armas e bandeiras do grupo em comboio em uma estrada de Raqqa, na Síria, em maio de 2015  (Foto: Militant website via AP)Jihadistas do Estado Islâmico exibem suas armas e bandeiras do grupo em comboio em uma estrada de Raqqa, na Síria (Foto: Militant website via AP)
A primeira motivação detectada nas pesquisas é bem pragmática: necessidade de sobrevivência. Após mais de cinco anos de guerra e com a economia do país destruída, a taxa de desemprego em algumas áreas da Síria chega a 90%. A restrição à movimentação interna também dificulta e encarece o comércio.
A situação econômica para homens jovens, dentro da Síria, é ruim. Eles só conseguem sobreviver se unindo a uma facção militar"
Jovem sírio entrevistado na pesquisa
Sem oportunidade de emprego, muitos sírios enxergam nos grupos terroristas a possibilidade de atender às necessidades básicas suas e de suas famílias. “A situação econômica para homens jovens, dentro da Síria, é ruim. Eles só conseguem sobreviver se unindo a uma facção militar”, afirmou um dos entrevistados pela pesquisa.
Além de tudo, lutar para um grupo extremista costuma ser mais lucrativo do que para um grupo moderado. Segundo a International Alert, a Frente al-Nusra paga de US$ 300 a US$ 400 por mês a seus combatentes. Já no Free Syrian Army, grupo mais moderado, o salário é de cerca de U$ 100 e ainda é pago com atraso frequentemente.
O estudo pontua, inclusive, que muitos membros de grupos terrorista seguem a lógica de mercado e trocam de organização com base no salário e nos benefícios que recebem ou pela insatisfação com nepotismo ou corrupção em determinada facção, por exemplo.
Desejo de vingança
Ahmed chora a morte do pai Abdulaziz Abu Ahmed Khrer, que foi morto por um franco-atirador do Exército sírio em Idlib, ao norte da Síria. (Foto: Rodrigo Abd/AP)Sírio chora a morte do pai por um franco-atirador do Exército do regime em Idlib (Foto: Rodrigo Abd/AP)
O segundo fator analisado pela pesquisa é o impacto da violência, dos deslocamentos forçados, do trauma e das perdas sobre os jovens que decidem se unir aos grupos terroristas.
Segundo o estudo, a perda de pessoas queridas estimula fortes desejos de vingança nos jovens, desperta o senso de honra e a necessidade de proteger e defender sua casa ou família.
A vontade de derrubar o regime de Bashar Al-Asad é, especialmente, um forte motivador. “Muitos sírios querem se vingar do regime por destruir suas famílias, suas casas, suas vidas e todo o restante. A Frente al-Nusra combate de fato o regime e oferece a melhor oportunidade de obter essa vingança”, disse um dos jovens entrevistados.
“Antes da guerra, eu queria construir um avião. Agora eu quero construir algo que destrói o avião que está bombardeando o lugar onde vivem meus pais”, afirmou outro.
Os pesquisadores assinalam que os grupos jihadistas foram rápidos em explorar o luto e a raiva desses jovens na hora de recrutá-los.
Antes da guerra, eu queria construir um avião. Agora eu quero construir algo que destrói o avião que está bombardeando o lugar onde vivem meus pais
Jovem entrevistado na pesquisa
Outro fator psicológico que torna os jovens sírios vulneráveis ao recrutamento jihadista é a falta de autonomia e propósito decorrente da situação de guerra. “Para muitos sírios, a guerra tirou o senso de controle sobre suas vidas e seus destinos”, afirma o documento.
Isso vale especialmente para os que vivem em campos de refugiados nos países vizinhos. Sem poder trabalhar, se deslocar ou escolher onde morar e enfrentando situações de humilhação e preconceito, eles veem nos grupos armados a chance de recuperar algum controle da situação.
Um homem jovem que vivia como refugiado no Líbano contou aos pesquisadores que queria se unir ao Estado Islâmico porque havia sido bem tratado por membros da organização quando os encontrou na Síria. “Foi a primeira vez que me senti um ser humano com dignidade”, disse.
Escolas destruídas
Crianças recolhem pedaços de madeira dentre os destroços de uma escola para surdos-mudos em Raqqa, no leste da Síria. Ativistas afirmam que o local foi destruído por um dos ataques aéreos liderados pelos EUA no combate a terroristas do Estado Islâmico (Foto: Nour Fourat/Reuters)Crianças recolhem pedaços de madeira dentre os destroços de uma escola para surdos-mudos em Raqqa, no leste da Síria (Foto: Nour Fourat/Reuters)
O último fator de vulnerabilidade elencado pelos pesquisadores foi a degradação de infraestrutura educacional.
Na Síria, uma em cada quatro escolas não funciona mais por ter sido destruída por bombas ou servir de abrigo para refugiados internos.
Na Síria, uma em cada quatro escolas não funciona mais. Dois milhões de crianças estão fora da escola e 52.500 professores perderam a vida no conflito.
Mais de dois milhões de crianças estão fora da escola e 52.500 professores perderam a vida no conflito. Nos campos de refugiados em países vizinhos, muitos sírios também não têm aulas.
A falta de um ambiente estruturado e de oportunidades de aprendizado gera frustração, raiva e marginalização, tornando os jovens mais propensos a serem recrutados pelos grupos.
Fatores protetores

A pesquisa também avaliou o que protege os jovens de serem recrutados por grupos violentos. Aqueles com redes estáveis de familiares e amigos, capazes de guiá-los por caminhos positivos e de dar-lhes apoio psicossocial, se mostram mais resilientes.

Os sírios que têm acesso a oportunidades de sobrevivência e condições justas de trabalho também se mostraram mais protegidos, assim como os que se engajaram em movimentos ativistas não violentos e os que conseguem ter acesso à educação e a oportunidades de aprendizado.
Algumas recomendações dos pesquisadores para ajudar a reduzir são investir em programas de educação, acompanhamento e subsistência voltados para jovens, levar em conta os fatores de vulnerabilidade ao se criar projetos humanitários e engajar pais e comunidades diretamente nos programas.

Fonte: G1 Notícias
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