Uma cena envolvendo atletas brasileiros se tornou comum nos Jogos Pan-Americanos de Toronto, que começaram no último dia 10. Esportistas estão prestando continência, um gesto militar, ao receber medalhas no pódio.
Foi assim, por exemplo, em cerimônias de premiação no judô, na natação e no remo. Muitos prestam continência à bandeira do Brasil durante a execução do Hino Nacional.
A explicação é simples: são atletas com patente militar. Dos 600 integrantes da delegação brasileira no Canadá, 123 são militares.
A BBC Brasil ouviu psicólogos do esporte sobre o comportamento dos atletas brasileiros e encontrou opiniões diferentes. Há quem considere o gesto apenas um ato de respeito, mas também houve críticas.
Nas redes sociais, o assunto também motivou controvérsia. Enquanto alguns usuários manifestaram naturalidade em relação ao ato e minimizaram a polêmica, outros notaram que atletas também militares não fizeram o gesto em torneios anteriores.
Nos últimos anos, o COB (Comitê Olímpico Brasileiro) fechou parceria com as Forças Armadas, que passaram a incorporar atletas de alto rendimento. Os esportistas têm direito a benefícios como salários, 13º, locais de treinamento e plano de saúde. Também são beneficiados por bolsas do Ministério do Esporte.
"Somos ensinados que, sempre que o hino toca, o militar, por respeito, tem de prestar continência e ficar em posição de sentido. É uma forma de respeito pela minha bandeira e meu país", disse o nadador Léo de Deus, campeão dos 200m borboleta, em declaração divulgada pelo Ministério da Defesa.
Prata no judô e sargento da Marinha, Mayra Aguiar disse que "prestar continência para a bandeira é o que eles [militares] recomendam, é o que a gente sempre tem orgulho de fazer".
Continência no pódio: duas visões
O tema divide opiniões principalmente porque o COI (Comitê Olímpico Internacional) veta qualquer tipo de manifestação dos atletas, como ações políticas ou comerciais, durante entregas de medalhas.
Para João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte, trata-se de um gesto natural de atletas do Exército, Marinha e Aeronáutica que recebem apoio.
"Por isso o respeito ao bater continência na vitória. Não há nada de psicológico ou 'a mais' que isso. O fato é simples como o gesto", afirmou, por e-mail.
Em nota, o COB foi na mesma linha, ao citar regulamento militar que define a continência como a "saudação do militar".
"O COB entende que a continência, além de regulamentar, quando prestada de forma espontânea e não obrigatória, é uma demonstração de patriotismo, sem qualquer conotação política, perfeitamente compatível com a emoção do atleta ao subir no pódio e se saber vencedor", disse o órgão.
O psicólogo do esporte Rodrigo Falcão, mestre em Esportes para Resolução de Conflitos pela Universidade Aberta da Catalunha, criticou o comportamento dos atletas militares brasileiros.
"Acho desnecessário, e acaba sendo um ato político. É fácil identificar atletas envolvidos nas Forças Armadas, não precisavam apelar para esses gestos. Nos EUA, por exemplo, há atletas militares também, e não me lembro de ações desse tipo em competições oficiais", disse à BBC Brasil.
Falcão também mencionou o episódio recente envolvendo a nadadora Joanna Maranhão, que usou o Facebook no começo do mês para criticar políticos brasileiros e a proposta de redução da maioridade penal. “Estou a caminho do meu quarto campeonato Pan-Americano mas não representarei esse Brasil que segrega e que não se compadece”, escreveu a atleta na ocasião.
Na mesma semana, o COB orientou os atletas a não revelar opiniões políticas. Para Rodrigo Falcão, o COB aplicou "dois pesos e duas medidas" em relação aos casos.
"Parece que os atletas militares podem se manifestar, mesmo que em atos simbólicos, e os outros, não", afirmou.
O Ministério da Defesa afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não houve ordem direta para que os atletas batessem continência durante cerimônia de entrega de medalhas.
Os atletas teriam tomado a atitude por serem militares e porque, na hora das premiações, estaria sendo hasteada a bandeira brasileira. A pasta lembrou que o decreto 2.243, de 1997, determina que a bandeira nacional tem direito à saudação.
Fonte: BBC Brasil
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