No ano passado, completaram-se 20 anos desde a primeira vez que as Forças Armadas do Brasil adotaram um armamento de produção russa, o míssil portátil antiaeronave 9K38 Igla. Anos depois dessa compra, em 2010 foi a vez de um sistema de armas russo muito mais complexo chegar ao país: o helicóptero de ataque Mil Mi-35M.
Enquanto os Igla são utilizados pelo Exército Brasileiro e pelas tropas de terra da FAB (Força Aérea Brasileira), os 12 Mi-35M integram um esquadrão desta última baseado em Porto Velho (RO).
Junto a tais equipamentos, surgiu a “missão” de alterar, na sociedade brasileira e nas próprias Forças Armadas, a visão da tecnologia militar russa, ainda firmemente calcada na ideologia e na propaganda ocidental dos tempos da Guerra Fria.
Curiosamente, porém, os dois sistemas foram divisores de águas na capacidade militar nacional. Antes dos Igla e Mi-35M, as Forças Armadas brasileiras jamais tiveram um míssil portátil individual antiaéreo, nem um genuíno helicóptero de ataque. Mesmo durante a Guerra Fria, com o alinhamento pró-EUA de Brasília, Washington sempre vetou o fornecimento de tais equipamentos ao Brasil.
Mas seria absolutamente simplista considerar que os obstáculos a maiores parcerias militares entre Brasil e Rússia se concentram apenas nas esferas da ideologia, propaganda e geopolítica.
Existem sim, diversas questões técnicas e de doutrina militar que precisam ser enfrentadas antes que se possam efetivar trocas mais amplas entre os dois países no campo das armas.
Um exemplo recente disso vem da área de helicópteros. Com os Mi-35M sendo operados pela FAB, a Aviação do Exército Brasileiro (AvEx) possui seu próprio requerimento para, futuramente, adquirir e operar de modo próprio um helicóptero de ataque.
Nesse sentido, delegações da AvEx têm visitado e buscado conhecer os vários modelos existentes no mercado internacional, de fabricantes dos EUA, da Europa e da Rússia.
Para a AvEx, é fundamental que o modelo possa operar à noite, e em quaisquer condições atmosféricas (“all weather”), o que significa, pelos padrões ocidentais (e seguidos nas Forças Armadas do Brasil), que a aeronave deve possuir alguns sistemas de navegação e orientação, destacando-se os chamados VOR e ILS, que são requisitos para que a aeronave seja considerada apta às operações “por instrumento” (IFR).
Na doutrina militar russa, entretanto, o conceito de voo IFR (ou seja, sem condições de voo visual) é diferente, não se norteando pela exigência de equipamentos VOR e ILS. Em lugar destes, as aeronaves russas possuem sistemas de base tecnológica diferente, como os NDB e RSDN, mas de função similar.
O que parece “um detalhe”, entretanto, significa que um helicóptero como o moderno Mil Mi-28NE pode ser considerado absolutamente capaz de efetuar operações noturnas e IFR pelos russos – mas não pelos brasileiros. E isso é só um exemplo.
Por outro lado, vêm surgindo algumas parcerias entre empresas brasileiras e russas que têm provocado uma mudança (favorável) no tocante aos serviços pós-venda, fornecimento de peças sobressalentes e componentes, além de serviços de manutenção e revisão, no Brasil, de equipamentos de origem russa.
A empresa fluminense Atlas Táxi Aéreo, por exemplo, opera há já vários anos na Região Amazônica, em contrato com a Petrobras, uma frota de helicópteros civis Mi-171A1, fabricados na Rússia, com excelentes resultados.
A atuação dessas aeronaves resultaram, inclusive, na instalação no Brasil de uma estrutura técnica de apoio, manutenção e revisões, que, em um futuro próximo, incluirá até as revitalizações completas dos motores – serviços estes que deverão atender também aos próprios Mi-35M militares da FAB.
Por outro lado, remetendo ao pioneirismo dos 9K38 Igla, uma área que certamente possui um gigantesco potencial de cooperação entre a Rússia e o Brasil é o desenvolvimento de mísseis.
Trata-se de tecnologia na qual a Rússia possui notório expertise, produzindo sistemas reconhecidos entre os melhores do mundo, como os mísseis ar-ar Vympel e os antiaéreos S-300/-400.
Além disso, já há a experiência muito bem-sucedida de uma joint-venture nesse campo: o trabalho com a Índia no avançado míssil BrahMos. O Brasil, por sua vez, vem completando seu primeiro programa internacional de desenvolvimento de um míssil, o A-Darter, fruto de um trabalho conjunto da brasileira Mectron com a sul-africana Denel.
Fonte: Gazeta Russa
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