Em texto recente,
veiculado na última edição da revista Política Externa, o brasilianista
Sean Burges – professor da Australian National University – pergunta de forma
provocativa, sem fazer rodeios: o Itamaraty tornou-se um problema para a
política externa brasileira? Dependendo do que se pretenda para o país, talvez
sim, ele afirma.
A argumentação apoia-se
na ideia de que, em tempos de crise econômica e emergência de novos temas e
atores políticos, o conservadorismo do Itamaraty – com o seu culto a tradições e
hierarquias profissionais – privaria o Brasil de explorar boas oportunidades
(sobretudo comerciais) da globalização dos mercados e poria em risco a própria
relevância futura do país. Segundo o pesquisador, há carência de especialistas
em temas técnicos e de uma liderança com mais sensibilidade política entre os
nossos diplomatas. A recuperação da criatividade necessária à formulação da
política exterior na atualidade passaria, dentre outras medidas, pela abertura
do Itamaraty a outras fontes de inovação, bem como pelo resgate do “dinamismo”
do barão do Rio Branco.
O artigo de Burges ganhou inesperado respaldo com a publicação, em 16 de fevereiro, de matéria intitulada “Brasil fecha só três acordos de comércio em 20 anos” em O Estado de S.Paulo. Fundamentalmente, alegava-se no texto que as escolhas da política externa econômica do Brasil tinham acarretado estagnação nos negócios, ao passo que nossos vizinhos latino-americanos avançavam vigorosamente na direção de entendimentos comerciais bilaterais, principalmente com os Estados Unidos e países asiáticos.
Liberar
geral?
Como entusiasta da
abertura democrática e da eficiência na administração pública federal, reconheço
um arsenal de críticas possíveis ao serviço exterior brasileiro, mas jamais
derivaria daí que o caminho a seguir é a “desitamaratização” da política
externa.
Isso significaria
renunciar a um tipo de know-how em que o Brasil tem vantagens
comparativas e competitivas. Afinal, desenvolvemos um sofisticado aparato
institucional para a carreira diplomática, além de uma academia – o Instituto
Rio Branco – para treinamento e qualificação de pessoal. Nas fileiras do
Itamaraty encontram-se intelectuais e estrategistas de primeira linha.
Sintomaticamente, mais de uma dezena de secretários-gerais e juízes de grandes
instituições internacionais foram cedidos pelo corpo diplomático brasileiro no
decorrer da história.
Não se
desinstitucionaliza o aparelho de Estado impunemente. É abrir a caixa de Pandora
e invocar os males da gestão pública – de usurpação funcional e insegurança
jurídica a amadorismo e malversação de recursos. Parece-me infeliz a proposta de
privatizar o interesse público, tornando o Estado (e o corpo diplomático, em
particular) refém dos grupos de interesse e pressão. Trata-se, em suma, de
pensar o Brasil à maneira dos liberais anglo-saxões e incorporar uma visão de
democracia como “mercado político autorregulável”.
O elogio feito à
criatividade na gestão da política externa também soa curioso, pois não fica
evidenciada a sua serventia para a inserção do país no mundo. Dá para inverter a
lógica e mostrar (com palavras e números) que foi justamente a insistência
secular em certos princípios – soberania territorial, igualdade entre as nações,
pacifismo etc. – que, a despeito das limitações brasileiras, nos tem assegurado
um lugar na primeira divisão global. Desde os tempos do barão até
hoje.
Comércio e
política
No que toca ao comércio
internacional, a postulação de que o Itamaraty deve ser esvaziado de funções não
vem de hoje. Na última eleição presidencial brasileira, aventou-se a criação de
um ministério voltado exclusivamente para o comércio exterior, com missão de
alavancar a participação do país em importações e exportações, de mercadorias e
serviços. A suposta vantagem de tal medida estaria na “despolitização” do tema.
Chega a ser irônico, já que, mesmo com a inexpressiva contribuição do Brasil
para os fluxos comerciais globais, temos um histórico de força negocial e
representatividade política na Organização Mundial do Comércio (vide a atuação
do país junto ao G20 durante a crise financeira corrente). A candidatura do
embaixador Roberto Azevedo à direção do órgão dá conta desse fenômeno. A
despolitização da discussão comercial pode ser um tiro no próprio
pé.
É preciso ter em mente
que o Ministério das Relações Exteriores é uma agência governamental
constitucionalmente limitada em suas ações, pois está subordinada à Presidência
da República – cuja incumbente, a chefe de Estado Dilma Rousseff, recebeu
mandato popular para conduzir os assuntos internacionais do Brasil. O Itamaraty
não é a guilda dos comerciantes nem um bureau empresarial. Sempre foi
publicamente orientado e é bom que continue sendo, pelo bem da nossa política
externa.
Fonte: Observatório da Imprensa
A diplomacia brasileira pode ser refinada, cheia de balangandãns, inhenhenhés e fidalguias, contudo decorridos 190 anos de nossa independência não fez deste um país de 1º Mundo, pelo contrário, continuamos um gigante atrasado e sempre correndo atrás das verdadeiras Potências. Eternamente patinando na lama do subdesenvolvimento.
ResponderExcluirAcredito que em time que está perdendo tem que se fazer trocas sim e grandes alterações.
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"Por que será que na época da VARIG os brasileiros no exterior recorriam com frequência a seus escritórios no estrangeiro do quê a nossas representações diplomáticas? Onde estava o Itamarati para ajudar mesmo nas coisas mais básicas? Ou será que os problemas, de simples brasileiros, eram banais e indignos para seus diplomatas?" "Ou seja, a VARIG, empresa privada, era mais eficiente que o tal Itamarati."
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Claro, que o furo de nosso atraso é mais embaixo, mas bem que o Itamarati está precisando de uma grande sacudida, em seus princípios e procedimentos... As distâncias estão cada vez mais curtas, as comunicações instantâneas, mas o nosso corpo diplomático anda em primeira marcha ou, só às vezes, em segunda. E não se acordou para a dinâmica comercial moderna, onde vale muito mais ação do que belas palavras.
Não sei não, mas é bem possível q este australiano esteja carregado de 99,99% de razão... de que nosso Itamarati está precisando de forte pragmatismo comercial e bem menos vaselina diplomática que não enche barriga de ninguém, apenas egos inflados de seus funcionários, enquanto que o Brasil que se dane no passar das oportunidades históricas. Aff!
ViventtBR
Ah! Só um detalhe... estamos no Brasil, e esse país fala português, Itamarati é a grafia correta, e não Itamaraty.
ResponderExcluirViventtBR
Grande amigo, tens razão em suas palavras, precisamos de menos palavras e mais atitudes, mais presença e força nas negociações, uma postura mais arrojada e dinâmica, pois estamos em um momento chave que pode determinar o salto do Brasil.
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