sexta-feira, 15 de julho de 2011

China exorta EUA a agirem com responsabilidade em relação à dívida


A China, uma das maiores credoras dos Estados Unidos, exortou na segunda-feira os estrategistas econômicos americanos a agirem no sentido de proteger os interesses dos investidores, destacando os temores crescentes em todo o planeta diante das discussões prolongadas sobre o orçamento que estão tendo lugar em Washington.

As autoridades em Washington estão envoltas em negociações tensas sobre o limite da dívida governamental, que a administração Obama diz que precisa ser elevada em relação a seu nível atual, US$14,29 trilhões, para permitir ao governo pagar suas contas diárias e pagar os juros de quaisquer dívidas que vençam em breve.

Qualquer falha em saldar dívidas que irão vencer equivaleria, na prática, a um calote, que, por breve que fosse, poderia abalar a confiança na economia americana e causar instabilidade séria nos mercados financeiros globais.

Na noite de quarta-feira o Serviço Moody's para Investidores intensificou as atenções para tal desenlace ao avisar que pode reduzir sua classificação de crédito de primeiro nível dada aos EUA. O Moody's citou uma "possibilidade crescente" de que não se chegue a nenhum acordo antes de a autoridade de empréstimos do governo americano alcançar seu limite, em 2 de agosto.

Na quinta-feira o presidente do Federal Reserve (o banco central americano), Ben S. Bernanke, reiterou o aviso de que uma "calamidade financeira enorme" ocorrerá se o presidente Barack Obama e os republicanos não conseguirem acordar um pacto orçamentário que permita a elevação do teto da dívida.

Em depoimento perante um comitê do Senado, Bernanke disse que os parlamentares precisam levar o estado frágil da economia em conta em suas negociações.
"Deixar de aprovar não elevar o teto da dívida e permitir permitir com certeza um calote da dívida teria consequências muito reais para os americanos médios", disse Bernanke, observando que as taxas de juros e de hipotecas descreveriam um salto.

"Isso também elevaria o déficit federal, porque precisamos pagar os juros da dívida como parte de nossos gastos", disse ele.

Na quinta-feira as autoridades de Pequim se somaram às vozes a expressar preocupação, embora o tenham feito em termos mais moderados.

"Esperamos que o governo americano adote políticas e medidas responsáveis para garantir os interesses dos investidores", disse Hong Lei, porta-voz do Ministério do Exterior, respondendo a perguntas sobre o relatório do Moody's.

As declarações ecoaram outras dadas por autoridades em Pequim em abril, quando a agência Standard & Poor's reduziu sua previsão sobre os EUA de estável para negativa, em função do alto déficit orçamentário do país e da crescente dívida governamental.

A China tem mais de US$1 trilhão em títulos do Tesouro americano, razão pela qual é altamente sensível a fatos que possam reduzir a valor desses títulos.

Em seu depoimento perante o Congresso, Bernanke disse aos parlamentares que, se os EUA não elevarem o limite de sua dívida, o governo terá que priorizar suas obrigações financeiras, pagando seus credores primeiro e sustando benefícios como os pagamentos da Previdência Social.

"A premissa é que, enquanto fosse possível, o Tesouro procuraria pagar o principal e os juros da dívida governamental, porque deixar de fazê-lo certamente mergulharia o sistema financeiro em um caos enorme e exercia grande impacto sobre a economia global", ele disse aos parlamentares.

Robin Marshall, gerente de investimentos da Smith & Williamson, em Londres, disse que, depois de não terem previsto a crise das hipotecas de alto risco nos Estados Unidos, que precedeu a explosão atual de dívida, as agências de classificação estão agindo agressivamente em relação a países com dívida soberana.

A situação atual, disse ele, está criando dores de cabeça para governos preocupados ou com onde investir ou com a possibilidade de eles próprios serem rebaixados de classificação e enfrentarem custos financeiros mais altos, assim como para investidores. "Isso levanta a pergunta de qual é o padrão de referência relevante?", disse Marshall. "Se os EUA tiverem sua classificação rebaixada, como ficará a Alemanha, com suas obrigações crescentes? Se foram analisados unicamente as razões entre dívida e PIB, é possível que apenas países como Noruega, Suíça e Cingapura continuem a ter classificação AAA."

A reação à ameaça às classificações foi moderada na Europa na quinta-feira, enquanto as autoridades europeias lutavam para conter sua própria crise da dívida, que esta semana ameaçou se espalhar para fora da Grécia, Irlanda e Portugal e submergir as economias maiores da Itália e Espanha.

As autoridades europeias têm reagindo aos rebaixamentos sucessivos na zona do euro esta semana a Irlanda, por exemplo, foi rebaixada para status "junk", ou especulativo, pela agência Moody's criticando o poder que as agências de classificação exercem sobre os investidores.

E ressurgiram planos traçados há muito tempo para criar uma agência europeia de classificação. O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, disse recentemente que as agências podem estar mostrando um "viés" contra a Europa.

Alguns europeus sentem que as agências se valem de dois pesos e duas medidas. Um participante no fórum na internet da revista noticiosa alemã "Der Spiegel" disse na quinta-feira: "Me surpreende que os EUA ainda tenham uma classificação AAA, para começo de conversa".

Por trás da retórica, contudo, os governos europeus se uniram em apoio à ideia de que suas posições de dívida são insustentáveis e precisam ser retificadas com cortes nas despesas e a adoção de medidas para elevar as receitas. Isso não deixa espaço para a espécie de jogo político perigoso que está sendo visto em Washington com relação a tetos de dívida e calotes, embora autoridades europeias ainda relutem em admitir o que investidores vêm afirmando há meses: que a Grécia vai dar um calote.

Marshall, o gerente de investimentos em Londres, disse que um apanhado geral das opiniões ainda sugere que as agências deveriam desistir de rebaixar a classificação dos Estados Unidos. "No fim das contas, o tamanho e o status da reserva de divisas ainda é importante", disse ele, acrescentando que é provável que as agências "recuem da beira do penhasco".

Na China, a Dagong Global Credit Rating, uma agência de classificação chinesa que rebaixou sua classificação dos EUA em novembro passado, disse na quinta-feira que colocou essa classificação numa lista de atenção negativa, citando a solvência declinante do governo americano, o crescimento econômico lento do país e os altos déficits fiscais.

A Dagong é pouco conhecida fora da China, e o efeito de suas classificações sobre os mercados financeiros não se aproxima, nem de longe, do efeito das avaliações da Moody's ou Standard & Poor's. Um rebaixamento real feito por qualquer uma dessas duas agências principais encareceria muito a emissão de dívidas novas pelos EUA e poderia reverberar por todo o sistema financeiro global.

O simples aviso emitido pela Moody's sobre a possibilidade de um rebaixamento já bastou para levar investidores a uma corrida para comprar ativos vistos como seguros. O ouro para entrega em agosto subiu para até US$1.594,90 no pregão da quinta-feira, um recorde, sem levar em conta a inflação.

Os problemas econômicos dos EUA poderiam ter repercussões mais amplas na Ásia. A Indonésia, por exemplo, avisou na quinta-feira que um dólar mais fraco pode levar a um fluxo de capital entrando em sua economia, na medida em que os investidores buscam retornos mais altos. Isso, por sua vez, pode provocar uma bolha imobiliária ou das bolsas de valores nesse país.

"Estimamos que a situação econômica dos EUA não será tão boa quanto o previsto", disse Hartadi A. Sarwono, vice-presidente do banco central indonésio, segundo a Reuters. "O impacto disso sobre os mercados financeiros acrescentará fluxos entrantes, em função de um dólar americano enfraquecido. Mas isso será algo que nossa economia poderá administrar."

Ao mesmo tempo, o aviso dado pelo Moody's sobre os Estados Unidos destacou a preocupação recente de que os níveis de dívida acumulados por muitos países em desenvolvimento não sejam sustentáveis, em última análise.

Fonte: The New York Times
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