terça-feira, 28 de junho de 2011

O capitalismo precisa de férias


O crescimento mede ao menos uma coisa: a saúde do capitalismo. Desse ponto de vista, o futuro parece sombrio. Nos Estados Unidos, o esgotamento dos efeitos da política monetária da administração Obama e a evolução da dívida pública marcam os limites de uma política de alavancagem que não toca nas alucinantes desigualdades na distribuição de renda. O sobressalto japonês reduziu-se a nada, pelas consequências da catástrofe nuclear. Quanto à Europa, ela bate no muro com alegria.

Os velhos países capitalistas não vão bem. É o que mostram as últimas previsões da ONU: “Uma desaceleração do crescimento mundial é esperada em 2011 e em 2012”. Para os países desenvolvidos, o informe prevê um crescimento de 1,9% em 2011 e depois de 2,3% em 2012. A União Europeia (1,5 e 1,9%) e o Japão (1,1% e 1,4%) fariam ainda bem menos e os Estados Unidos (2,2 e 2,8%) um pouco melhor. O crescimento mundial será puxado pelos países em desenvolvimento, com 6% em 2011 e 6,1 em 2012. “A retomada do crescimento mundial foi freada pelas economias desenvolvidas”, diz o informe. Pode-se mesmo se perguntar se haveria uma retomada nos países desenvolvidos sem o dinamismo dos países emergentes.

O crescimento mede ao menos uma coisa: a saúde do capitalismo. Desse ponto de vista, o futuro parece sombrio. Nos Estados Unidos, o esgotamento dos efeitos da política monetária de Quantitative Easing e a evolução da dívida pública marcam os limites de uma política de alavancagem que não toca nas alucinantes desigualdades na distribuição de renda. O sobressalto japonês reduziu-se a nada, pelas consequências da catástrofe nuclear. Quanto à Europa, ela bate no muro com alegria.

O informe da ONU assinala com razão que “a austeridade orçamentária corre o risco de desacelerar mais do que a retomada do crescimento, que o aumento da instabilidade nas taxas de câmbio permanece um risco tanto como um reequilíbrio coordenado da econômica mundial”. Vistas de perto, as proposições avançadas são de uma vacuidade quase cômica: seria preciso “coordenar os programas de relançamentos; a política orçamentária deve ser revista, a fim de se reforçar seu impacto sobre o emprego”. A ONU chama de suas metas “uma política monetária mais eficaz, um acesso mais previsível para financiar o desenvolvimento, objetivos mais concretos e executivos para a coordenação das políticas internacionais”.

Num contexto como esse, o projeto de “desglobalização” carece ao menos de simetria. Sua proposição central é a de um protecionismo (europeu no melhor dos casos, ou limitado "ao hexágono" [A forma geográfica da França lembra um hexágono, razão pela qual o país é chamado de "L'hexagone"] em relação às importações provenientes dos países emergentes que não respeitam as normas sociais e ambientais. Mas nem [Arnaud] Montebourg, nem [Emmanuel] Todd, nem [Jacques] Sapir falam de exportações. Ora, são os países emergentes hoje puxam e financiam a retomada do crescimento econômico: “as transferências financeiras líquidas dos países pobres para os países ricos ainda estão em crescimento”, sublinha a ONU. Querer reduzir unilateralmente as importações não pode conduzir a uma configuração estável.

A desmundialização assim concebida deve ser distinguida do altermundialismo em vários aspectos recentemente sintetizados por Jean-Marie Harribey. Em primeiro lugar, a mundialização não é a única fonte de degradação social. A ONU prevê assim “a presistência do desemprego nos países desenvolvidos”. Com a crise, as taxas de desemprego passaram de 6 para 9% e deve permanecer superior a 8% em 2012. Essa retomada [da economia] sem emprego [jobless recovery] que está no horizonte dos velhos países capitalistas não resulta da mundialização que os mercados visam a explorar, mas de uma vontade convicta de restabelecer as taxas de lucro e a sacrossanta competitividade.

O tema da desmundialização remete a um encadeamento que não funciona mais: competividade, logo crescimento, logo emprego. Mas se tudo o crescimento serve a uma pequena parte dos ricos, para quê procurar um crescimento mais elevado? O que está em jogo de verdade é uma outra maneira de distribuir a riqueza, mas também aí é a mundialização que força os acionistas a se esbaldarem, quando todos os outros devem apertar os cintos? Esse projeto visa no fundo a retomar o capitalismo aos “Gloriosos Anos Trinta”, por meio de um protecionismo que permita uma reindustrialização fundada sobre um crescimento produtivista. Significa dar as costas à alternativa real: a grande bifurcação em direção a um outro modelo, que combine a satisfação das necessidades sociais com a luta contra o aquecimento global.

Por Michel Husson - economista, membro do Conselho Científico da ATTAC/França.

Fonte: Carta Maior
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