sexta-feira, 25 de março de 2011

''Intervenção humanitária? Desta vez é um erro''


"O ataque à Líbia é um erro, de nenhum modo justificado pelas regras da intervenção humanitária". Há anos, Michael Walzer, filósofo da polítiao com base no Institute for Advanced Study, de Princeton, estuda os fios complexos que ligam o uso da violência, poder e moral. Em um célebre livro dos anos 70, Guerra Justa e Injusta, ele explicou por que a intervenção no Vietnã era "injusta", enquanto a Segunda Guerra Mundial era "justa". No caso dos ataques aliados na Líbia, ele acha que existem todas as razões para defini-los como "um erro, político e moral, que irá se concluir com um provável banho de sangue".

Em um célebre livro dos anos 70, Guerra Justa e Injusta, ele explicou por que a intervenção no Vietnã era "injusta", enquanto a Segunda Guerra Mundial era "justa". No caso dos ataques aliados na Líbia, ele acha que existem todas as razões para defini-los como "um erro, político e moral, que irá se concluir com um provável banho de sangue".

Eis a entrevista.

Por que a intervenção na Líbia é um erro?

Por diversas razões. Sobretudo, não estão claros os objetivos do ataque. Quer-se caçar Kadafi? Ou se busca sustentar militarmente a revolta? Ou ainda, mais simplesmente, quer-se aplicar o cessar-fogo? O porte das bombas aliadas descarregadas sobre a Líbia deixa entender que o verdadeiro objetivo é eliminar o tirano. Mas sem uma intervenção de terra, improvável no momento, será muito difícil. E assim os aliados se encontram diante de dois caminhos, ambos perigosos. Ou arriscam reanimar uma revolta já derrotada in loco, o que levaria a uma longa e sanguinária guerra civil; ou conseguem impôr o cessar-fogo. Mas, neste caso, Kadafi continuará sendo o líder de uma grande parte da Líbia. São, justamente, resultados nada desejáveis.

Porém, nesse caso, havia a possibilidade de que Kadafi desencadeasse uma feroz repressão contra a oposição nas cidades reconquistadas.

Sim, exatamente, uma repressão, não um massacre ou um genocídio. Uma repressão da oposição líbia seria um fato dramático, trágico. Mas, infelizmente, não cabe à comunidade internacional intervir todas as vezes que uma revolta democrática não atinge os seus objetivos. Senão, se deveria intervir continuamente, em todo o lugar, e isso não é política nem moralmente oportuno. A primeira guerra do intervencionismo democrático é a de não buscar reanimar um movimento de oposição que não consegue sustentar seus objetivos, autonomamente, in loco.

Quando, então, é necessário e justo intervir militarmente? Quando a guerra é "humanitária"?

É fácil dar alguns exemplos. Era justo intervir diante dos "campos da morte" dos Khmer Vermelhos no Cambodja. Era justo intervir na Ruanda o no Darfur. Nada do que está acontecendo hoje na Líbia é proximamente comparável ao que ocorreu nesses países.

É o porte do massacre que justifica a "guerra humanitária"?

Digamos que sim. A "guerra humanitária" é a que salva centenas de milhares de pessoas da morte segura. A "guerra humanitária" – seria hipócrita negá-lo – também produz danos colaterais e coloca em risco as vidas dos inocentes. Mas uma guerra humanitária detém um massacre e, portanto, salva muito mais vidas do que as que coloca em risco.

Portanto, a "guerra humanitária" está desconectada de motivações políticas?

Não no caso de um movimento que coloque em risco a estabilidade do mundo, como no caso do fascismo na Segunda Guerra Mundial. Mas, no caso da Líbia, Kadafi não atacava ou ameaça ninguém, no exterior. Repito. Só um clamoroso desastre humanitário pode justificar uma intervenção. A "guerra humanitária" não se faz na presença de uma repressão, embora sanguinária. Nem se fez para favorecer uma mudança de regime ou para se desfazer de um tirano.

Nota: A reportagem é de Roberto Festa, publicada no jornal La Repubblica, 24-03-2011

Fonte: Carta Maior
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