De um lado, 36 caças modernos e uma conta que não sai por menos de R$ 10 bilhões. Do outro, oito carcaças estocadas no deserto do Arizona de um avião dos anos 1960, arrematadas por R$ 390 mil. Incomparáveis, os dois negócios ajudam a resumir problemas da modernização militar do Brasil.
Desde que começou a buscar espaço internacional comparável à sua crescente estatura econômica, e principalmente após descobrir um mar de petróleo sob a camada do pré-sal em 2007, o Brasil colocou em sua agenda a necessidade de ter Forças Armadas compatíveis às suas pretensões.
Hoje, o país não enfrenta ameaças, mas é vulnerável -e modernização militar é um processo de vários anos.
Aí entra o primeiro negócio, a concorrência para a compra dos novos aviões de combate da FAB, que já se arrastava havia dez anos, afetada por pressões políticas e falta de verba.
Depois de idas e vindas e de ter fechado com franceses e seu caro Rafale, contra a preferência da Aeronáutica pelo sueco Gripen, o governo Lula deixou a questão para Dilma Rousseff. Pesou na decisão a contrariedade com a falta de apoio francês à posição brasileira sobre o programa nuclear do Irã.
Os EUA reforçaram então o lobby de seu F-18. Mas nada será gasto este ano, já que o governo está decidindo o corte de R$ 50 bilhões do Orçamento. Mesmo sendo uma conta a ser paga em vários anos, não há clima para um anúncio desses -estão na geladeira caças, novas fragatas e controle de fronteiras.
"POLITIZAÇÃO"
"É o maior exemplo de politização de um contrato de compra militar no Brasil. Isso causa preocupação para as empresas internacionais de defesa que buscam explorar oportunidades no país. E, claro, isso causa impacto nas capacidades militares brasileiras", resumiu à Folha Guy Anderson, analista-chefe da Jane"s Defence Industry, unidade da principal consultoria de defesa do mundo. Ele assina um detalhado estudo sobre o Brasil, publicado no dia 27 passado, no qual prevê um aumento de 35% nas encomendas militares do país até 2015.
O relatório aponta questões como corrupção e burocracia, e um ponto central: "A modernização só será bem-sucedida se houver uma mudança nos processos de compra. Hoje elas são feitas pelas três Forças, em vez de um órgão central no Ministério da Defesa".
Aí entram os aviões estocados desde 1985 no deserto do Arizona. A Marinha decidiu que tinha de colocar um aparelho de apoio em seu porta-aviões, o São Paulo, para adquirir capacidade de operação. O navio acaba de passar cinco anos parado para reparos, e seus caças A-4 servem só para treino.
Assim, a Força comprou em agosto as carcaças do americano C-1A Trader. Quer colocar quatro deles voando até 2014, e canibalizar o resto. Segundo estimativas, a modernização pode custar até R$ 6,5 milhões a unidade.
"A Marinha terá o status orgulhoso de possuir o mais antigo porta-aviões e os mais velhos aviões em atividade nele", ironizou a publicação russa "Periskop".
Na Marinha, argumenta-se que ou é isso ou é esperar o governo dispor de dezenas de bilhões para um porta-aviões que use os caças que serão comprados pela FAB.
O jeitinho parece funcionar para os almirantes, que modernizaram navios antigos com recheio eletrônico novo. "A Marinha é a mais equipada das Forças", diz Felipe Salles, editor da "Base Militar Web Magazine".
A Defesa, que não respondeu à Folha sobre o tema, criou em 2010 um órgão centralizado de compras. Mas só este ano ele será implantado.
Nem tudo é má notícia. A compra em 2009 de 50 helicópteros franceses para Aeronáutica, Marinha e Exército é um divisor de águas. Na rigorosa Copac, órgão da FAB que seleciona aeronaves, as três Forças discutem juntas pontos do programa.
A compra não impediu a FAB de ter adquirido, a conta-gotas, modelos de transporte Black Hawk americanos, com logística diversa. Mas é um começo.
A falta de dinheiro é outra questão. O orçamento militar brasileiro vem crescendo na década, saindo do patamar regional de 1,5% do PIB para 2,3% para 2011. Só que os números enganam: dos R$ 60,2 bilhões previstos para defesa neste ano, 73% são para pagamento de pessoal, 45% só para pensões. Para comprar equipamento, apenas R$ 2,5 bilhões. Isso se não caírem nos cortes.
Fonte: Folha
Desde que começou a buscar espaço internacional comparável à sua crescente estatura econômica, e principalmente após descobrir um mar de petróleo sob a camada do pré-sal em 2007, o Brasil colocou em sua agenda a necessidade de ter Forças Armadas compatíveis às suas pretensões.
Hoje, o país não enfrenta ameaças, mas é vulnerável -e modernização militar é um processo de vários anos.
Aí entra o primeiro negócio, a concorrência para a compra dos novos aviões de combate da FAB, que já se arrastava havia dez anos, afetada por pressões políticas e falta de verba.
Depois de idas e vindas e de ter fechado com franceses e seu caro Rafale, contra a preferência da Aeronáutica pelo sueco Gripen, o governo Lula deixou a questão para Dilma Rousseff. Pesou na decisão a contrariedade com a falta de apoio francês à posição brasileira sobre o programa nuclear do Irã.
Os EUA reforçaram então o lobby de seu F-18. Mas nada será gasto este ano, já que o governo está decidindo o corte de R$ 50 bilhões do Orçamento. Mesmo sendo uma conta a ser paga em vários anos, não há clima para um anúncio desses -estão na geladeira caças, novas fragatas e controle de fronteiras.
"POLITIZAÇÃO"
"É o maior exemplo de politização de um contrato de compra militar no Brasil. Isso causa preocupação para as empresas internacionais de defesa que buscam explorar oportunidades no país. E, claro, isso causa impacto nas capacidades militares brasileiras", resumiu à Folha Guy Anderson, analista-chefe da Jane"s Defence Industry, unidade da principal consultoria de defesa do mundo. Ele assina um detalhado estudo sobre o Brasil, publicado no dia 27 passado, no qual prevê um aumento de 35% nas encomendas militares do país até 2015.
O relatório aponta questões como corrupção e burocracia, e um ponto central: "A modernização só será bem-sucedida se houver uma mudança nos processos de compra. Hoje elas são feitas pelas três Forças, em vez de um órgão central no Ministério da Defesa".
Aí entram os aviões estocados desde 1985 no deserto do Arizona. A Marinha decidiu que tinha de colocar um aparelho de apoio em seu porta-aviões, o São Paulo, para adquirir capacidade de operação. O navio acaba de passar cinco anos parado para reparos, e seus caças A-4 servem só para treino.
Assim, a Força comprou em agosto as carcaças do americano C-1A Trader. Quer colocar quatro deles voando até 2014, e canibalizar o resto. Segundo estimativas, a modernização pode custar até R$ 6,5 milhões a unidade.
"A Marinha terá o status orgulhoso de possuir o mais antigo porta-aviões e os mais velhos aviões em atividade nele", ironizou a publicação russa "Periskop".
Na Marinha, argumenta-se que ou é isso ou é esperar o governo dispor de dezenas de bilhões para um porta-aviões que use os caças que serão comprados pela FAB.
O jeitinho parece funcionar para os almirantes, que modernizaram navios antigos com recheio eletrônico novo. "A Marinha é a mais equipada das Forças", diz Felipe Salles, editor da "Base Militar Web Magazine".
A Defesa, que não respondeu à Folha sobre o tema, criou em 2010 um órgão centralizado de compras. Mas só este ano ele será implantado.
Nem tudo é má notícia. A compra em 2009 de 50 helicópteros franceses para Aeronáutica, Marinha e Exército é um divisor de águas. Na rigorosa Copac, órgão da FAB que seleciona aeronaves, as três Forças discutem juntas pontos do programa.
A compra não impediu a FAB de ter adquirido, a conta-gotas, modelos de transporte Black Hawk americanos, com logística diversa. Mas é um começo.
A falta de dinheiro é outra questão. O orçamento militar brasileiro vem crescendo na década, saindo do patamar regional de 1,5% do PIB para 2,3% para 2011. Só que os números enganam: dos R$ 60,2 bilhões previstos para defesa neste ano, 73% são para pagamento de pessoal, 45% só para pensões. Para comprar equipamento, apenas R$ 2,5 bilhões. Isso se não caírem nos cortes.
Fonte: Folha
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