Um documento secreto assinado em fevereiro de 2009 pela secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, e divulgado ontem pelo WikiLeaks, mostra que alguns recursos naturais brasileiros estão em uma lista de interesses estratégicos de Washington e são considerados "vitais" para a segurança nacional americana.
O documento traz uma relação de cerca de 300 locais espalhados pelo mundo cuja perda "pode ter um impacto crítico na segurança econômica, saúde pública ou na segurança nacional dos EUA". A recomendação de Hillary era para que todas as embaixadas produzissem uma lista onde há pontos "críticos de infraestrutura" e "recursos-chave" em cada país.
No Brasil, os locais relacionados foram: dois cabos submarinos de telecomunicação em Fortaleza (CE) e um no Rio de Janeiro, as minas de minério de ferro e manganês da multinacional Rio Tinto - que hoje pertencem à Vale -, e as minas de nióbio de Araxá (MG) e Catalão (GO).
Não constam da lista as reservas do pré-sal e nem os recursos biológicos da Amazônia, alardeados pelo governo brasileiro como locais que precisam ser protegidos da ameaça externa.
Nióbio. O Brasil tem 98% das reservas mundiais exploráveis de nióbio, metal usado em ligas de grande resistência, matéria-prima para cápsulas espaciais, mísseis, foguetes, reatores nucleares e semicondutores. O produto é tido como fundamental para a indústria bélica e espacial dos EUA, que importa do Brasil até 87% do nióbio de que necessita.
Segundo a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, somente as reservas de nióbio da mina de São Gabriel da Cachoeira (AM) valeriam cerca de US$ 1 trilhão. A mina de Araxá seria responsável por 75% de todas as reservas mundiais do metal.
Os diplomatas americanos listaram também pontos de eventuais estrangulamentos no fornecimento de suprimentos usando como base três critérios: ligações físicas diretas (gasodutos, oleodutos, cabos de telecomunicações e pontes perto da fronteira americana), produtos e serviços controlados por outros países (matérias-primas essenciais para a indústria dos EUA) e locais de passagem fundamentais para comércio mundial (como o Canal do Panamá e os Estreitos de Ormuz. Gibraltar e Malaca).
Também fazem parte da lista usinas hidrelétricas próximas do território americano, localizadas no México e no Canadá, que são importantes para o fornecimento de energia do país. Outros recursos naturais relacionados são a exploração de zinco no Peru, a de cobre no Chile, a de cobalto no Congo e de bauxita em Guiné, assim como a usina de Abqaiq, na Arábia Saudita, maior centro de processamento de petróleo do planeta, e o entroncamento de gasodutos em Nadym, no oeste da Sibéria, que é descrito como o mais "crucial do mundo".
O objetivo do documento secreto seria também manter um inventário, atualizado anualmente, dos locais fora dos EUA cuja perda poderia afetar a "saúde pública do país", principalmente diante do temor de epidemias e ataques de bioterrorismo.
Por isso, a lista inclui desde uma fábrica de soro antiofídico na Austrália até uma indústria de insulina na Dinamarca. Há ainda laboratórios farmacêuticos na Espanha, França e na Suíça - a Roche, que produz o Tamiflu, usado para combater a gripe suína, também foi incluída na relação.
Reação.
O Departamento de Estado dos EUA e o governo britânico criticaram a divulgação dos locais estratégicos.
O argumento é o de que o documento é um presente para grupos terroristas, como a Al-Qaeda, que teria uma vasta lista de alvos em potencial. "Existe uma razão forte para manter confidenciais algumas informações vitais, incluindo a identificação de pontos de infraestrutura que são fundamentais para a economia dos EUA", disse Philip Crowley, porta-voz do Departamento de Estado (mais informações na página A11).
Segundo o premiê britânico, David Cameron, a divulgação do documento "é prejudicial à segurança nacional dos EUA e da Grã-Bretanha".
Alguns analistas, no entanto, afirmam que a lista de locais estratégicos não apresenta nenhuma novidade. Muitos locais já teriam sido alvo de terroristas, como a usina saudita de Abqaiq, que foi atacada pela Al-Qaeda em fevereiro de 2006.
ATENÇÃO GLOBAL
Todos os locais são citados em um único documento, assinado por Hillary Clinton, em fevereiro de 2009
Entre os principais pontos de passagem de mercadorias estão os Canais do Panamá e de Suez e os Estreitos de Ormuz, Málaca e Gibraltar
No Brasil, foram listados cabos de telecomunicações no Ceará e no Rio, e minas de ferro, manganês e nióbio em MG, MS e GO
Os EUA consideram estratégicas hidrelétricas no México e no Canadá
A perda ou o ataque a algum desses locais afetaria a economia ou a segurança dos EUA.
Dependência de nióbio é causa de preocupação de Washington
A grande dependência do nióbio brasileiro deve explicar, segundo especialistas, a preocupação do governo dos Estados Unidos com relação à segurança das minas do País. O Brasil detém 98% das reservas e 91% da produção mundial do minério, usado para a fabricação de aços especiais.
Os Estados Unidos não produzem o minério.
Relatório anual do Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS, na sigla em inglês) aponta que o Brasil tem reservas de 2,9 milhões de toneladas de nióbio, com uma produção acumulada de 57 mil toneladas em 2009. O País foi responsável, no ano passado, por 87% das importações americanas do mineral.
O documento indica que a maior economia do mundo continuará dependente do nióbio brasileiro. "As reservas domésticas (dos Estados Unidos) de nióbio têm baixa qualidade, algumas complexas do ponto de vista geológico, e muitas não são comercialmente recuperáveis", diz o texto, publicado em janeiro. Segunda maior reserva, o Canadá é responsável por apenas 7% da produção mundial.
Procuradas pelo Estado, as empresas responsáveis pelas minas citadas no documento divulgado pela WikiLeaks não se pronunciaram sobre o assunto. A CBMM, do grupo Moreira Salles, e a Anglo American são as duas grandes produtoras de nióbio no País, operadoras das minas de Araxá e de Goiás, respectivamente.
O Brasil é também um grande produtor de manganês, o que explica a inclusão do produto na lista dos ativos brasileiros importantes. Segundo documento da USGS referente a esse mineral, o Brasil teve a quarta maior produção em 2009, ano em que foi responsável por 5% das importações americanas da commodity. Os Estados Unidos não produzem manganês desde a década de 70, também por causa da baixa qualidade das jazidas domésticas.
A lista divulgada pela WikiLeaks inclui a produção de minério de ferro pela "mina Rio Tinto", que não tem mais ativos brasileiros nesse segmento. A companhia operava uma mina em Corumbá, no Mato Grosso do Sul, que foi vendida à Vale do Rio Doce do ano passado. Nenhuma das empresas comentou a inclusão do projeto na lista.
PARA ENTENDER
O nióbio, um metal nobre descoberto em 1801, é usado para a fabricação de peças inoxidáveis e em outras ligas de metais não-ferrosos, como as utilizadas em oleodutos e gasodutos. Por suas propriedades, também é largamente utilizado em indústrias nucleares. Grande quantidade de nióbio é utilizada em superligas para a fabricação de motores de jatos e subconjuntos de foguetes - equipamentos que necessitam de alta resistência à combustão. Pesquisas avançadas com este metal foram utilizados no programa Gemini, da Nasa.
Cabos submarinos estão entre pontos de atenção
Além das minas de nióbio, ferro e manganês, a lista secreta de locais estratégicos para os Estados Unidos divulgada ontem pelo site WikiLeaks inclui cabos submarinos de telecomunicações.
Um dos cabos mencionados no documento interliga o Brasil aos Estados Unidos e entrou em operação em setembro de 2000. Conhecido como Américas II, o cabo tem 9 mil quilômetros de extensão e passa pela Guiana Francesa, Trinidad e Tobago, Venezuela, Curaçau, Martinica, Porto Rico, até chegar aos Estados Unidos.
O cabo tem capacidade de transmitir 151.200 ligações simultâneas e opera com uma tecnologia que permite a sincronização simultânea na transmissão de dados.
Além do Américas II, outros cabos de telecomunicações partem de Fortaleza e são fundamentais para a interligação do continente. Um dos exemplos é o Emergia, inaugurado em 2001, responsável pela ligação da América do Sul, Central e do Norte. O Emergia tem 25 mil quilômetros de extensão.
Um eventual ataque ao sistema de cabos submarinos poderia causar falhas críticas de transmissão de dados e prejuízos incalculáveis à economia mundial, segundo especialistas. Do sistema dependem, por exemplo, a transferência de dados financeiros e grande parte da comunicação militar.
Fonte: Estadão
Nossa...
ResponderExcluirEu não sei nem o que comentar sobre este texto.
Eu acho um absurdo essas idéias dos Estados Unidos sobre o Brasil e o mundo. Tudo parece ser de interesse deles, e somente deles.
Tudo em função deles, nada para o mundo, sem falar que esses 'locais estratégicos' também são de interesse da Grã-Bretanha.
Parabéns pelo post.
Atém.