A precária infraestrutura aeroportuária tem transtornado a vida dos viajantes no Brasil de forma diretamente proporcional à expansão da atividade econômica e à recuperação da renda do trabalhador. Quanto mais gente recorre ao transporte aéreo, mais atrasos e cancelamentos de voos e tumultos são registrados nos aeroportos do país. O setor não cresce no ritmo da demanda. Em períodos de feriados prolongados e férias, o apagão se agrava. Agora, às vésperas do Natal, um impasse nas negociações salariais entre os aeronautas, os aeroviários e as companhias ameaça parar de vez os aeroportos. É o caos anunciado.
Falta bom senso às partes. As empresas, apesar do excepcional momento de rentabilidade, negam às categorias que empregam qualquer ganho real. Limitam-se a oferecer a reposição da inflação, de 6,08%, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Os trabalhadores, por sua vez, abusam da situação e pesam a mão nas reivindicações, exigindo reajustes que vão de 13% a 30%. Dispostos a radicalizar, aprovaram paralisação generalizada e por tempo indeterminado a partir da próxima quinta-feira, antevéspera do Natal. Até lá, nenhuma rodada de negociação está prevista. Ou seja, para a sociedade, a angústia quanto à possibilidade de frustração da viagem antecipa as turbulências.
A conjuntura econômica nacional apresenta boas perspectivas, mas a recuperação de perdas passadas pode ser progressiva. E essa tem sido a norma, com a maioria das categorias obtendo ganhos de dois a três pontos percentuais nas respectivas datas-bases. É razoável que seja assim, pois os empresários também têm responsabilidades novas com o aquecimento dos mercados: precisam investir mais, contratar mais. Com maior procura por mão de obra, os salários já tendem a subir naturalmente. O que não pode é as empresas se associarem aos empregados no jogo da radicalização e ambos virarem as costas para o cidadão, impotente no meio da disputa.
Aliás, o passageiro se vê perdido porque outra parte essencial dessa história também está a dever: o Estado. Regras e fiscalização frouxas e planejamento inadequado permitiram o agravamento do quadro ano após ano. Só em agosto a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) decidiu, por exemplo, proibir o overbooking — prática sistemática de emissão de passagens em maior número do que o de assentos. Outra providência foi a determinação às empresas para a reacomodação de passageiros cujo voo tenha sido cancelado. A tentativa de conter o desrespeito ao consumidor inclui ainda a presença de fiscais da entidade nos 11 principais aeroportos do país. É estranho, mas o atendimento apenas se dava por telefone e internet.
As medidas, contudo, não têm se revelado suficientes. Na quinta-feira, 44,5% das decolagens se atrasaram além do limite de tolerância em Guarulhos (SP). Em Brasília, o índice foi de 33,6%; no Galeão, no Rio de Janeiro, de 26,7%. Isso, com o movimento de fim de ano apenas começando a crescer e os trabalhadores a postos. Com eles de braços cruzados, fica fácil prever o tamanho da confusão. Há quatro anos o Brasil assiste à repetição de cenas de caos generalizado nos aeroportos, com filas intermináveis, gente dormindo em poltronas ou pelo chão, desinformação. Passa da hora de uma ação efetiva e conjunta das companhias e do governo (via ministérios da Defesa, da Aeronáutica e do Turismo, Infraero, Anac e órgãos de defesa do consumidor).
Fonte: Correio Braziliense
Foto: Angelo D. Nicolaci
0 comentários:
Postar um comentário