domingo, 13 de junho de 2010

A votação da ONU e a nova realidade internacional


O Conselho de Segurança da ONU aprovou durante essa semana a resolução 1929 anexando novas sanções ao Irã por execução de programas nucleares de enriquecimento de urânio considerados suspeitos pela Agência Internacional de Energia Atômica. Em época de Copa do Mundo, os críticos da política externa do governo Lula vibraram com o placar da votação: 12 votos favoráveis, dois votos contrários – Brasil e Turquia – e uma abstenção do Líbano. Mas é interessante notar que essa avaliação é única e destoa da imprensa internacional e de analistas internacionais renomados que, em sua grande maioria, consideraram o episódio com uma derrota dos EUA. As sanções definidas na Resolução 1929 foram tão modestas que mesmo o porta voz da Casa Branca parecia desconfortável no anúncio de sua “vitória”.

Não poderia ser diferente. Após dezesseis meses de intensos esforços, os EUA obtiveram menos apoio internacional do que a administração Bush que conseguiu passar outras sanções na ONU por unanimidade. Como apontamos aqui na Carta Maior (Os dilemas da aplicação das sanções 21/05/2010) era preciso analisar com cuidado as relações econômicas e políticas que a Rússia e a China possuem como Irã, o que fez com que, nas negociações com os EUA, o alcance das medidas fosse consideravelmente limitado. De acordo com Rolf Mowatt Larssen, que rastreou os programas nucleares em todo o mundo para a CIA e atualmente é pesquisador em Harvard, é provável que, tal como as anteriores, as novas sanções não ofereçam nenhuma indicação que poderão provocar impacto suficiente para mudar o comportamento iraniano. Mas, o mais espantoso disso tudo é que, de acordo com o bem informado colunista do New York Times, David Sanger, nem mesmo a Casa Branca acredita que essa nova rodada de sanções vai forçar Teerã a suspender seu programa nuclear.

E é justamente nesse momento, em que o governo parece não ter nenhuma estratégia, que é fundamental que fiquemos atentos no que pode acontecer. Pois, o efeito insignificante das novas sanções da ONU poderia estimular o poder executivo e o Congresso a “preencher lacunas” da resolução do Conselho de Segurança, aplicando sanções unilaterais sobre as exportações iranianas de petróleo (76% das receitas do regime)

David Sanger informa ainda que, embora o governo não admita publicamente, há rumores sobre a existência de vários planos alternativos que abrangem todo o Golfo Pérsico e que incluem, desde ações de contenção militar até operações da CIA para minar a infra-estrutura do Irã para a produção de armas nucleares. O secretário de Defesa Robert M. Gates enviou um memorando secreto à Casa Branca em janeiro, em que ele colocava perguntas sobre possíveis táticas e estratégias, pressupondo que a quarta rodada de sanções seria insuficiente. Embora Gates tenha explicado que o memorando era um esforço de rotina, alguns membros do governo interpretaram como uma tentativa de forçar um debate sobre “questões mais difíceis” como as opções militares que relatei em artigo anterior (A dupla face de Obama 25/09/2010)

De outro lado, os congressistas norte-americanos concordaram com Obama em dar ao governo mais tempo às negociações na ONU e viram a aprovação da resolução mais como um sinal verde para que eles pudessem avançar com suas próprias sanções que prometem ser muito mais duras e esperam “aprofundar o isolamento do Irã”.

O fato é que diferentemente da explicação da direita norte-americana que insiste em apontar que todos esses problemas decorrem apenas da fraqueza de Obama é preciso constatar que as várias tentativas de isolamento das chamadas “nações párias”, desde o governo de Bill Clinton, passando por Bush, e reiteradas por Obama, não tem surtido efeito e a novidade no momento é que líderes regionais como Brasil e Turquia se despontam como atores globais relevantes. Além disso, indica da forma mais clara possível, o contraste existente entre o eterno discurso norte-americano que coloca uma confiança sem limites nas instituições internacionais de um lado, e realidade de sua vontade nacional de outro. Muito provavelmente, a legitimidade da ONU sairá arranhada mais uma vez.

Fonte: Carta Maior
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