quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Desafio ao Ocidente



O regime dos aiatolás parece longe de se prostrar ante as ameaças do Ocidente. Pelo contrário, Teerã enviou ontem uma mensagem desafiadora, na forma de uma versão aprimorada de um míssil capaz de atingir Israel, bases dos Estados Unidos no Oriente Médio e o sul da Europa. Com capacidade para destruir pontos a 2 mil quilômetros de distância, o Sajjil-2 (1)teria funcionado com a máxima precisão. “O míssil atingiu seu alvo”, anunciou a TV iraniana Press TV. “O lançamento de uma versão otimizada do Sajjil é parte da doutrina de defesa do Irã e de suas atividades-padrões de mísseis”, declarou à emissora o ministro da Defesa do Irã, brigadeiro Ahmad Vahidi. O teste com o míssil de alta velocidade terra-terra ocorreu na manhã de ontem, em um local mantido sob sigilo, e foi o bastante para despertar novas ameaças por parte da comunidade internacional.

Em setembro passado, o general Hossein Salami, comandante da Força Aérea da Guarda Revolucionária Islâmica, chegou a dar pistas sobre os planos de se fabricar uma versão moderna do Sajjil. “O Sajjil tem alcance adequado, uma potência de destruição e uma precisão suficientes e é considerado um dos sistemas balísticos mais desenvolvidos (...) É a melhor arma de que dispõem as Forças Armadas iranianas”, declarou, na época.

O secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, mostrou-se “preocupado” com o teste de ontem. De acordo com a rede de TV Fox News, o Pentágono estaria preparando inclusive uma simulação de defesa contra o Irã. O teste norte-americano ocorreria no fim de janeiro e consistiria na interceptação de um míssil lançado nas Ilhas Marshall. Um míssil interceptador partira da base da Força Aérea de Vandenberg, na Califórnia, para anular o “inimigo”. O teste com o Sajjil-2 não evoca apenas preparativos na área militar. A retórica a favor de sanções pesadas contra Teerã tem ganhado força nos últimos dias. Na noite de terça-feira, a Câmara dos Deputados dos EUA já havia aprovado um projeto de lei que impediria o governo de Barack Obama de fechar negócios com as empresas que abastecem o Irã com produtos refinados de petróleo.

Por sua vez, o premiê britânico, Gordon Brown, considerou o tema motivo de “grave preocupação” e previu novas punições contra Teerã. “Nós trataremos o assunto com a seriedade que merece”, declarou, após se reunir com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, em Copenhague. A França considerou o anúncio do teste “um sinal muito ruim” para a comunidade internacional e a Alemanha reagiu com o termo “alarmante”.


Analistas

Por e-mail, o iraniano Alex Vatanka, editor da revista Jane’s Islamic Affairs Analyst e especialista do Middle East Institute (em Washington), disse ao Correio acreditar que o teste não justificaria qualquer nova sanção. “Não é ilegal que um país realize tais simulações”, explicou. Ele reconhece, porém, que o teste com o Sajjil-2 representa custos políticos para o presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, além de impingir a imagem de um Estado belicoso. Para Vatanka, a ausência de progresso nas negociações nucleares e o novo incidente provavelmente terão efeito contraprodutivo para Teerã, levando mais países a endurecerem suas posições.

Especialista em mísseis pelo site Globalsecurity.org, baseado em Alexandria (Virgínia), o norte-americano Charles P. Vick explicou à reportagem que o Sajjil-2 lançado ontem foi anunciado por Teerã como um armamento dotado de uma ogiva de detonação de impacto de curto alcance e não nuclear. Mas ele tem sérias dúvidas sobre a carga mortífera. “Podemos suspeitar que o Irã testou um mecanismo de disparo de ogiva nuclear sem, no entanto, a presença de materiais nucleares reais”, comentou. De acordo com o analista, o teste com o Sajjil-2 não somente é um desafio às resoluções da ONU, como indica que qualquer país em um raio de 2.510km está sob ameaça. “O Irã possui outro sistema, chamado de No-dong-B Mirim, com alcance de 4 mil quilômetros e em desenvolvimento desde o fim de 2008. E tem fabricado silos (depósitos de mísseis) por todo seu território”, acrescentou.

Também por e-mail, o iraniano Maziar Behrooz, historiador da Universidade Estadual de San Francisco, afirma que não há razões para Teerã usar os mísseis se não for atacado. “O Irã tem disparado e testado seus mísseis até quatro vezes ao ano. O país vem tentando aprimorar sua tecnologia para ter certeza de que ninguém o agredirá”, comentou. “A mensagem do teste com o Sajjil-2 é: se formos atacados, haverá um custo, então, pensem antes de fazê-lo.”


1 - Avançado e perigoso
O Sajjil-2 é o mais moderno míssil terra-terra de dois motores do Irã. Impulsionado apenas por combustível sólido, tem a precisão aumentada. Equipado com um sistema aprimorado de direcionamento, pode ser lançado em questão de minutos. Atinge até 2 mil quilômetros de distância.


INSPIRAÇÃO DIVINA

O nome Sajjil significa barro cozido, referência a uma história do Corão, o livro sagrado do islamismo. Segundo a fábula, pássaros enviados por Deus espantaram um Exército inimigo que atacava a cidade sagrada de Meca, fazendo chover sobre eles pedras de barro.

Eu acho...


“O Irã provalmente vai receber novas sanções da ONU, até o regime militar teocrata ficar totalmente isolado. No fim, a China vai forçar o cancelamento do encontro entre as potências ocidentais, que ocorre na próxima semana, protegendo seu aliado.”

Charles P. Vick, especialista em mísseis do site Globalsecurity.org (em Alexandria, Virgínia)

“O teste com o míssil é uma clara mensagem política dos linhas-duras do Irã para o Ocidente, um aviso de que eles não devem subestimar as capacidades militares iranianas. Principalmente agora, que o Ocidente considera novos métodos para pressionar Teerã, o que pode incluir uma punição militar.”

Alex Vatanka, editor da revista Jane’s Islamic Affairs Analyst e especialista do Middle East Institute (Washington)


Arsenal variado

Outros mísseis que compõem o sistema de defesa iraniano

Shahab-3
Míssil balístico de alcance médio, capaz de atingir alvos em um raio de 1,3 mil quilômetros. Derivado do míssil norte-coreano No-dong, tem baixa precisão. Shahab significa “meteoro”, em farsi.

Shahab-3A
Variante do modelo Shaba-3. Por ser mais leve, pode atingir alvos a 1,8 mil quilômetros.

Shahab-3B
Movido por combustível líquido, tem um alcance de 2,5 mil quilômetros. Israel, Turquia e as forças norte-americanas baseadas no Oriente Médio estão na margem de ataque.

Shahab-2
O míssil de propulsão única e com apenas uma etapa pode voar até 500km. O Irã comprou a arma da Coreia do Norte, na década de 1990. Também conhecido como Scud-C.

Zelzal
Míssil de curto alcance e combustível sólido. Em farsi, a palavra zelzal quer dizer terremoto. Só tem autonomia para percorrer entre 210km e 300km.

Fateh
Míssil de curto alcance, tem alcance de 193km. O nome deriva da palavra conquistador, em farsi e em árabe.

Tondar 69
Fabricado na China, faz parte do arsenal iraniano há vários anos. É um míssil de combustível sólido e alcance de 150km. Tondar significa trovão, em farsi.


Fonte: Correio Braziliense
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