terça-feira, 27 de outubro de 2009
Quanto custa a boa educação?
"Não há mais tempo a perder. Amargamos anos de atrasos educacionais e não podemos mais submeter as futuras gerações de brasileiros a esta situação"
César Callegari é presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e do Conselho Nacional do Fundeb. Mozart Neves Ramos, vice-presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, é presidente executivo do Todos Pela Educação e professor da UFPE. Artigo publicado em "O Estado de SP":
Os sucessivos relatórios dos indicadores educacionais da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) revelam que o Brasil investe na educação básica metade do que investem os países vizinhos - Chile, México e Argentina - e seis vezes menos que a média dos países da própria OCDE.
Considerando que o Brasil tem hoje cerca de 50 milhões de alunos matriculados nesse nível de educação, se quiser chegar ao patamar de investimento realizado pelos nossos vizinhos, isto é, algo em torno de R$ 4 mil por aluno/ano, o país precisaria destinar cerca de R$ 200 bilhões por ano para a educação básica.
Os últimos dados oficiais do investimento público direto em manutenção e desenvolvimento do ensino divulgados pelo Ministério da Educação (MEC), relativos ao ano de 2007, mostram que o país aplica no setor cerca de R$ 100 bilhões de reais por ano, somatório das destinações realizadas pelo conjunto dos Estados, Distrito Federal, municípios e governo federal.
Assim, para se aproximar dos países vizinhos, o Brasil deveria dobrar os seus investimentos em educação básica, ou seja, adicionar mais R$ 100 bilhões, atingindo o equivalente a 7,5% do PIB. Para os que podem considerar muito, vale lembrar a advertência feita por Derek Bok, reitor da Universidade Harvard: "Se você acha a educação cara, experimente a ignorância."
Um dos reflexos do baixo investimento na educação são as vergonhosas posições ocupadas pelo Brasil nas avaliações internacionais em leitura, matemática e ciências, como no caso do Programa Internacional de Avaliação de Desempenho. Esse fraco resultado também se revela nas avaliações nacionais, como na Prova Brasil e no Sistema de Avaliação da Educação Básica, tendo como referência a meta de aprendizagem do Todos Pela Educação.
Por exemplo, dados de 2007 mostram que somente 23% dos alunos que concluem a 4ª série do Ensino Fundamental I alcançaram o nível adequado de aprendizagem em matemática. Sobre isso, em recente artigo de opinião, o professor José Pastore chama a atenção para a baixa qualidade da educação brasileira como o principal entrave para que o país ocupe uma posição de destaque no ranking mundial da competitividade global.
O enfrentamento da questão educacional brasileira passa por uma mudança na concepção vigente do financiamento do ensino público: investe-se pouco e esse pouco algumas vezes é mal administrado. Essa mudança pode ser iniciada a partir da operacionalização do conceito de custo aluno qualidade inicial (CAQi).
Trata-se de uma importante contribuição advinda da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e que, no momento, se encontra em discussão no Conselho Nacional de Educação e nos debates que antecedem a Conferência Nacional de Educação. O CAQi pretende estabelecer padrões mínimos para uma educação de qualidade, procurando relacionar os fatores fundamentais dos quais ela depende e quanto custa fazê-la bem-feita.
O CAQi, na sua concepção, estabelece valores nacionais de referência para o salário dos professores, número adequado de alunos por classe de acordo com cada etapa da educação básica, custo do m2 de construção de escolas e creches, bem como a quantidade e o custo dos demais insumos básicos para a garantia inicial de uma educação de qualidade.
Com isso, espera-se uma educação mais equânime para todos, primeiro passo para um país mais justo, democrático e desenvolvido. Sem professores valorizados será difícil vencer esse desafio. Os países que estão no topo da educação mundial, como Finlândia e Coreia do Sul, só conseguiram esse avanço porque oferecem salários iniciais expressivos e uma carreira atraente para os seus educadores, atraindo, dessa forma, os alunos mais bem preparados do ensino médio.
Não há mais tempo a perder. Amargamos anos de atrasos educacionais e não podemos mais submeter as futuras gerações de brasileiros a esta situação. Por isso mesmo, a ideia do CAQi alinhada a um importante instrumento de gestão, como o Plano de Ações Articuladas implantado há dois anos pelo MEC, pode representar o início da realização do sonho de fazer um Brasil mais justo e desenvolvido, mediante a oferta de uma educação de boa qualidade para todos.
Fonte: O Estado de SP
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Um dado que pode ajudar a entender o nosso GAP:
ResponderExcluirSe somarmos o orçamento anual das 20 maiores universidades do mundo (composta por universidades basicamente dos EUA, Inglaterra, França e Alemanha) ele será maior que o investimento que TODA a América Latina faz em educação, do pré-primário até a Universidade.
No caso do Brasil, especificamente, tem dois problemas crônicos pra se resolver.
a) Entender que democratização da educação é totalmente diferente de massificação da educação. Desde o acordo MEC-USAID (em 1969) que a educação no Brasil passou a ser tratada como forma de lucro e não como direito de cidadania. Logo, massificou-se a educação mas não se democratizou a educação. O pobre continua tendo educação mediocre (quando a tem), seja nas escolas secundárias públicas ou seja nas universidades privadas (no Brasil existe essa "pérola", a escola pública em geral é uma porcaria e a universidade privada, em 99% dos casos, não serve pra nada, é um lixo total. Enquanto isso permanecer, é difícil mudar alguma coisa no país. É preciso em primeiro lugar o Estado recuperar a qualidade da escola pública e punir severamente os açougues da educação - as faculdades e universidades privadas -, no sentido de exigir qualidade. Uma universidade particular, para funcionar, deveria, no mínimo, estar no mesmo nível de uma Universidade Federal média, caso contrário deveria ser fechada);
b)Entender que educação formal (que se aprende na escola e universidade) é conhecimento crítico. Nada que ver com "pedagogia do amor" (coisa do abestalhado do Chalita, ex-secretário de educação do PSDB de SP), nada que ver com lucro (coisa dos vampiros da educação) e nada que ver com treinamento (pra quem acha que educação é treinamento profissionalizante, seja nas escolas ou universidades). Educação formal é conhecimento crítico. Ou é isso, ou não é nada. Quem treina profissional são as escolas técnicas. Mas essas não podem ser confundidas com as escolas regulares. Cada coisa no seu lugar. Nem todo mundo precisa saber como funciona uma máquina qualquer de fábrica, mas todo mundo precisa ler Machado de Assis e saber quem foi Isaac Newton. Isso é sinal de civilidade.
O Brasil, depois da catástrofe do governo FHC (que foi um dos piores da história para a educação), comandado pelo vampiro do MEC chamado Paulo Renato (atual secretário de educação de SP), dá sinal que pode sair do lodo. Mas ainda tem lodo até o pescoço.
abraços a todos