sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Reequipamento militar no Brasil: Imperativo Geopolitico


O Brasil é um país guiado por um sentimento de paz. Não abriga nenhuma ambição territorial, não possui litígios em suas fronteiras e, tampouco, inimigos declarados. Toda ação por ele empreendida nas esferas diplomática e militar, busca, sistematicamente, a manutenção da paz.


Porém, tem interesses a defender, responsabilidades a assumir e um papel a desempenhar, no tocante à Segurança e Defesa, em níveis hemisférico e mundial, em face de sua estatura político-estratégica no concerto das nações.


O primeiro objetivo de nossa Política de Defesa, portanto, deve ser a de assegurar a defesa dos interesses vitais da Nação contra qualquer ameaça forânea. Não se pode precisar, a priori, a fronteira entre os interesses vitais e os interesses estratégicos. Os dois devem ser defendidos com ênfase e determinação.


Essencialmente, os interesses estratégicos residem na manutenção da paz no continente sul-americano e nas regiões que o conformam e o rodeiam, bem como os espaços essenciais para a atividade econômica e para o livre comércio (Setentrião Oriental, Costão Andino, Cone Sul e Atlântico Sul).


Fora deste âmbito, o Brasil tem interesses que correspondem às responsabilidades assumidas nos fóruns internacionais e organismos multilaterais e ao seu status na ordem mundial. Este é conformado por uma combinação de fatores históricos, políticos, estratégicos, militares, econômicos, científicos, tecnológicos e culturais.


Sem uma Defesa adequada, a Segurança Nacional e a perenidade desses interesses estarão seriamente comprometidos e, consequentemente, não poderão ser assegurados. Daí, ressalta-se a imperiosa necessidade de contarmos com Forças Armadas preparadas, suficientemente poderosas e aptas ao emprego imediato, capazes de desencorajar qualquer intenção de agressão militar ao país, pela capacidade de revide que representam.


Esta estratégia é enfatizada para evitar a guerra e exige, como corolário, o fortalecimento da Expressão Militar do Poder Nacional, além de impor um excelente grau de aprestamento e prontificação das Forças Armadas, desde o tempo de paz, através da realização de treinamentos, exercícios operacionais dentro de cada Força Singular, não sendo excluída a necessidade de planejamento e do treinamento de operações conjuntas e combinadas no âmbito das FFAA.


O estudo da História, particularmente da História Militar de uma nação, conduz a conclusões e realça aspectos capazes de influir na Expressão Militar de seu Poder Nacional. O estudo das campanhas militares, com seus erros e acertos, o respeito às tradições, o culto aos heróis etc. trazem reflexos à formulação da doutrina, ao moral e à estrutura militares.


As tradições históricas e militares constituem, ainda, fatores de influência sobre a Expressão Militar. Essas tradições, que cumpre cultuar e manter, não devem, por outro lado, apresentar obstáculos intransponíveis à evolução, ao desenvolvimento e à tecnologia militares.


No equilíbrio entre essas idéias, às vezes opostas, está o acerto que revigora a Expressão Militar. Assumem, também, papel de destaque, os aspectos qualitativos dos recursos humanos; o apoio em maior ou menor grau da opinião pública nacional e mesmo internacional; a coesão interna e a vontade nacional.


E, nesse contexto, ressalta a fundamental importância do povo - expressão máxima das forças vivas da Nação - como verdadeiro esteio das Forças Armadas, quando a elas se une, nelas se apóia e com elas se confunde. A população traduz sua indispensável solidariedade à Expressão Militar, através da opinião pública, que deve constituir, sem dúvida, preocupação constante quando se pretende manter em alto nível aquela Expressão do Poder Nacional.


Nesse sentido, é imperioso o esforço para conservar integrados o homem militar e o homem civil, sem discriminações de qualquer natureza, sem privilégios, embora respeitadas suas diversas, mas naturais destinações.


O papel que caberá às Forças Armadas brasileiras, nas próximas décadas, é multifacetado e deve estar calcado em amplo debate, cujo resultado deverá ser tão satisfatório quanto maior for o desenvolvimento da sociedade. O esboço de qualquer arranjo de Defesa, em um Estado democrático, para que possa contar com recursos, deve estar respaldado por uma base de legitimidade.


Entendemos que, para a consecução desses objetivos, devem ser consultadas personalidades representativas de diferentes espectros de opinião: ministros de estado, acadêmicos, analistas políticos, economistas, diplomatas, militares, jornalistas, todos com reconhecida competência na área de Defesa e alguns críticos do atual sistema de Defesa Nacional.


Evidentemente que não se trata de deixar em mãos destes pensadores a formulação de políticas e estratégias militares. Trata-se, tão-somente, de ouvi-los e de reunir novos conceitos e idéias, que permitam oxigenar antigos preceitos e identificar referenciais para a defesa do país, os quais estejam mais em sintonia com os desafios dos novos tempos e consentâneos com a realidade nacional. Tais contribuições, depois de avaliadas, por setores competentes do Ministério da Defesa, poderão ou não ser incorporadas no planejamento estratégico.


Indubitavelmente, para a consecução dessa tarefa, mister se faz uma conjunção de esforços. Nesse sentido, somam-se, num processo sinérgico, o imprescindível apoio do presidente da República, a compreensão do Congresso Nacional, a efetiva colaboração do Ministério da Defesa e de outras áreas do governo, a confiança e o respaldo dos comandantes de Forças e a ativa participação de todas as forças vivas da Nação.


Temos plena consciência de que não se pode justificar a hipertrofia das Forças Armadas em prejuízo do processo de desenvolvimento da Nação, mas não se pode admitir, por ilógico e temerário, que a Expressão Militar do Poder Nacional seja colocada em plano inferior - vivenciando um processo gradual de sucateamento e de desmantelamento, devido à crônica insuficiência de recursos financeiros - na falsa concepção de que a prioridade absoluta deve ser dada ao desenvolvimento.


Não existem nações desarmadas, porque nenhuma delas seria capaz de desfazer-se de sua Expressão Militar para merecer, por esse ato ingênuo, o respeito e a simpatia de todos os países. Não há fórmula miraculosa capaz de manter a paz sem ameaças de conflitos internos ou de guerra entre os povos.


Torna-se imperativo conferir maior prestígio às Forças Armadas. Portanto, vejo com muito bons olhos o acordo militar firmado recentemente com a França no sentido de modernizar e fortalecer o aparato defensivo brasileiro.


Lembremo-nos das sábias palavras do insigne Barão do Rio Branco - o Chanceler da Paz -, que, de modo contumaz, enfatizava a imperiosa necessidade de possuirmos um bom sistema de armas para respaldar as nossas proposições no concerto das nações.




Manuel Cambeses Júnior
Coronel-aviador reformado, é conferencista especial da Escola Superior de Guerra e vice-diretor do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica.

Fonte: Monitor Mercantil
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