quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Mundo omisso á Honduras

Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou seu colega francês Nicolas Sarkozy, faz uns dois meses, perguntei a ambos se não havia uma falha na governança global quando todos os países democráticos e relevantes condenavam o golpe em Honduras e a repressão no Irã sem que houvesse qualquer consequência para ambos os regimes.

Sarkozy pulou Honduras e respondeu só sobre o Irã, mas não vem ao caso agora recuperar a sua resposta.

Lula, por sua vez, disse que a comunidade internacional não podia ser intervencionista, o que não deixa de ser sentido comum. Muito bem. Dois meses depois, pouco mais ou pouco menos, a pergunta a Lula cabe de novo, com maior ênfase agora que o governo golpista hondurenho atacou a embaixada brasileira em Tegucigalpa, por meio do corte de luz (depois restabelecida), telefone e água, para não mencionar bombas de gás lacrimogêneo, originalmente destinadas aos manifestantes pró-Zelaya mas que caíram em território brasileiro, como a embaixada é tecnicamente considerada.

Lula provavelmente repetiria a resposta, não necessariamente por gosto ou bom senso mas por falta de alternativa. Não cabe imaginar o desembarque de fuzileiros navais brasileiros em Tegucigalpa até porque seus colegas norte-americanos sempre que o fizeram em países do sub-continente provocaram banho de sangue.

Para ser franco, é difícil, talvez impossível, imaginar algum mecanismo internacional que funcionasse como uma espécie de Julgado das Grandes Causas, com a rapidez de decisões que se associa ao de Pequenas Causas. Seria necessário um grau de civilização que o planeta ainda não atingiu.

Por isso, o presidente "de facto" Roberto Micheletti pode dizer que Manuel Zelaya pode ficar lá "cinco ou dez anos", que para ele tanto faz, e por isso não invadirá a embaixada do Brasil.

Há pouco tempo, vi sucessivamente dois filmes sobre o genocídio em Ruanda praticado nas barbas das tropas das Nações Unidas, aliás com a omissão especialmente da França. São filmes que impactam justamente pela impotência da comunidade internacional ante a violência.

Claro que não estou comparando um genocídio com corte de luz/água/telefone, mas a impotência é a mesma, no varejo e no atacado.


Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna diária na página 2 da Folha e é autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo e "O Que é Jornalismo".

Fonte: Folha
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